Governo tenta explicar por que não #PagaLogo
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Pressionado a pagar logo o auxílio emergencial aos trabalhadores informais, o governo tem pela frente desafios que vão além da localização de 15 milhões a 20 milhões de brasileiros que hoje estão completamente fora do radar dos gestores de políticas sociais. Mesmo para quem já recebe o Bolsa Família, tirar a megaoperação do papel não será simples e vai requerer planejamento e até distribuição de cédulas de dinheiro pelo país.
Nos últimos dias, o governo ficou na linha de tiro com a demora do presidente Jair Bolsonaro em sancionar a lei que cria o auxílio e assinar a medida provisória que libera imediatamente os R$ 98 bilhões para os pagamentos. Especialistas têm dito que o momento é de “jogar dinheiro pela janela o mais rápido possível” e “sem medo de errar”. No entanto, há obstáculos operacionais que, em experiências menos dramáticas e urgentes no passado, levaram mais de um mês para serem vencidos.
O Brasil tem um grande ativo, que é o Cadastro Único, uma ampla base de dados criada em 2001 e que concentra beneficiários de mais de 20 políticas sociais no país. São 74,4 milhões de brasileiros registrados no CadÚnico – o terço mais pobre da população. O banco de informações agora será um apoio estratégico na hora de fazer chegar o dinheiro às famílias mais vulneráveis. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que quase 82% do público do auxílio emergencial está no cadastro. Mesmo assim, há gente de fora.
Os problemas vão além do cadastro. O sociólogo Luis Henrique Paiva, ex-secretário Nacional de Renda de Cidadania e hoje pesquisador do Ipea, explica que 70% dos beneficiários do Bolsa Família não têm conta e sacam o benefício em dinheiro. O valor médio dos repasses do programa não chega a R$ 200 por família – repasse que, durante três meses, será triplicado.
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Com a inclusão de outros trabalhadores elegíveis ao auxílio emergencial, a folha do auxílio deve ser pelo menos cinco vezes maior que a do Bolsa Família. “É preciso reforçar a logística de distribuição de cédulas.”
O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, disse em coletiva na ontem que o banco vai criar poupanças digitais para transferir os recursos aos beneficiários, mas não deu detalhes.
Procurado, o Banco Central informou que “entende que a quantidade de dinheiro em circulação é adequada para fazer frente aos desafios atuais e futuros” e que, desde o início da pandemia da COVID-19, “atua e monitora o processo de fornecimento de cédulas e moedas na rede bancária para que não haja nenhuma interrupção”. A autoridade monetária não respondeu aos questionamentos sobre eventual reforço no envio de papel-moeda às regiões.
Paiva também demonstra preocupação com as cidades que não contem com canal de pagamento – o que obrigaria os cidadãos a se deslocarem para resgatar o auxílio. Em dezembro de 2018, 377 municípios brasileiros não tinham atendimento bancário (nem por meio de caixa eletrônico) no país. A Caixa costuma firmar convênios com estabelecimentos para permitir os saques, mas, segundo o pesquisador, “sempre há um resíduo de 40 ou 50 cidades” que ficam alguns meses sem canal de pagamento.
A Caixa deve anunciar o calendário dos pagamentos na semana que vem. Desde já, Paiva recomenda um escalonamento – do contrário, muita gente sairá de casa num único dia, contrariando as recomendações sanitárias para evitar aglomeração. “Não pode ser no mesmo dia, se não vai ser o dia de maior número de transmissões do coronavírus”, afirma. Ele disse entender que os brasileiros necessitam do dinheiro o quanto antes, mas é preciso agir com cautela. “É preciso combinar senso de urgência com senso de responsabilidade.”