Mandetta surpreende e aparece no Planalto para se despedir
Foto: Marcelo Casal Jr/Agencia Brasil
O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta reconheceu ontem que está prestes a deixar cargo por divergências com o presidente Jair Bolsonaro e fez do Palácio do Planalto o palco de sua despedida do governo, em uma coletiva transmitida ao vivo pela TV.
Nos bastidores, fontes afirmam que o desligamento de Mandetta deve acontecer ainda hoje. A equipe do ministro está ciente de que sua permanência no cargo se alonga no máximo até a sexta-feira.
Com a demissão dada como certa, o ministro surpreendeu repórteres e funcionários do Palácio do Planalto ao aparecer ontem para participar do balanço diário dos casos de covid-19 no país.
A Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) da Presidência havia avisado aos jornalistas que não haveria perguntas no evento. Mas Mandetta transformou o que seria uma divulgação burocrática de dados com perguntas pré-enviadas por e-mail em uma entrevista coletiva dinâmica e com vários pontos polêmicos.
“Eu não estou ministro por obra de nada diferente do que do presidente. E ele claramente externa que quer um outro tipo de posição por parte do Ministério da Saúde, que eu, baseado no que nós recebemos, baseado em ciência, tenho esse caminho para oferecer”, afirmou. “Fora desse caminho, tem que achar alternativas. E tem muita gente muito boa, gente muito experiente.”
Mandetta aproveitou para cutucar o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), que foi flagrado em uma conversa com o ministro Onyx Lorenzoni (Cidadania) defendendo a sua demissão. Na mesma fala, criticou a defesa feita pelo presidente do chamado isolamento vertical – de pessoas idosas ou com doenças crônicas.
“Isso [desentendimento com Bolsonaro] é uma coisa pública. Não é só o presidente. Existem outras pessoas. Eu tenho ex-secretários de Saúde que verbalizam diariamente que acham que o caminho é outro, [como] o deputado Osmar Terra”, disse. “Existem pessoas que criam essas teorias de vertical, horizontal, não sei de onde vêm essas ondulações.”
Em uma espécie de balanço de sua gestão, Mandetta disse ainda que “até aqui, nós fizemos um trabalho muito elogiado por Banco Mundial, Organização Mundial da Saúde, os números [de mortes] que nós conseguimos domar, nós achamos que está bem”.
Ele também anunciou que não aceitava a demissão pedida horas antes pelo secretário nacional de Vigilância, Wanderson de Oliveira, que estava ao seu lado. “Entramos no ministério juntos, estamos no ministério juntos e sairemos do ministério juntos”, disse.
Também à mesa, o secretário-executivo da pasta, João Gabbardo, disse que não aceitaria substituir Mandetta caso fosse convidado por Bolsonaro, como vinha sendo especulado até então.
“Eu conheci o ministro Mandetta em dezembro de 2018. Eu fui convidado na transição […] e eu tenho um compromisso com o ministro Mandetta. “O dia em que ele sair, eu saio com ele”, afirmou. “Eu entrei no Ministério da Saúde em 1981. Ano que vem eu completo 40 anos de Ministério da Saúde. Eu não vou jogar no lixo esse meu patrimônio.”
Gabbardo ponderou que continuaria no posto “durante todo o tempo que for necessário para fazer a transição com toda a tranquilidade” – algo que Wanderson também disse que faria.
Na entrevista, Mandetta também criticou o uso indiscriminado da hidroxicloroquina, defendida por Bolsonaro como uma solução para a covid-19.
“Ou você se baseia na ciência ou fica no ‘eu acho’, ‘na minha experiência’, ‘eu tenho visto muitos casos’, ‘a impressão que eu tenho’”, disse. “Em ciência é a pior evidência, os estudos de relatos de caso são os mais frágeis.”
Horas antes da coletiva, em conversa com deputados da comissão externa que debate ações de combate ao coronavírus, Mandetta, afirmou ontem estar consciente de que será dispensado assim que o presidente Jair Bolsonaro definir seu sucessor. Filiado ao DEM, ele disse que está deixando “tudo organizado” para que seu substituto assuma a pasta sem ter a necessidade de um longo período de adaptação.