O 7 a 1 de Bolsonaro no STF
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Em uma derrota para o presidente Jair Bolsonaro, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem que prefeitos e governadores podem determinar medidas como isolamento, quarentena e até mesmo o que é ou não serviço essencial em meio à pandemia de coronavírus. Por conta do avanço da nova doença, o julgamento foi realizado por videoconferência.
Na sessão, os ministros referendaram a decisão liminar concedida por Marco Aurélio Mello, em uma ação apresentada pelo PDT contra a Medida Provisória (MP) 926. Editada por Bolsonaro, a norma concentrava nas mãos do governo federal as determinações em meio à crise.
O entendimento do plenário, no entanto, foi o de que a Constituição estabelece competência comum e cooperativa entre todos os entes federativos. Ou seja, a União determina as regras de interesse nacional; os Estados, as de interesse regional; e os municípios, as de interesse local.
A decisão foi unânime. Ao todo, nove ministros votaram. Não participaram do julgamento o decano Celso de Mello, que ainda se recupera de uma cirurgia no quadril, e Luís Roberto Barroso, que se declarou suspeito por motivo de “foro íntimo”.
Sem citar a possível demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o ministro Gilmar Mendes afirmou que Bolsonaro “dispõe de poderes para exonerar o seu ministro da Saúde, mas não para eventualmente exercer política pública de caráter genocida”.
Ele defendeu que seja estabelecido um modelo de cooperação, por meio de um comitê instituído pelo governo, que conte com a participação de representantes de Estados e municípios. “Do contrário, vai acontecer de o presidente decretar, com seu poder discricionário, que essas ou aquelas atividades são ou não essenciais, eventualmente desrespeitando as peculiaridades dos Estados ou municípios”, disse.
Em seu voto, o ministro Alexandre de Moraes também enviou uma série de recados a Bolsonaro, que tem criticado as medidas tomadas por governadores e defendido o afrouxamento do isolamento social. “O passado demonstrou que a excessiva concentração de poder, principalmente nos períodos de ditadura, foram nocivos ao desenvolvimento do Brasil. O tamanho continental do Brasil não permite que um ente central decida sobre todas as matérias, sem observar a peculiaridade de cada local.”
O ministro continuou: “Não é possível que, ao mesmo tempo, a União queira ter o monopólio da condução administrativa da pandemia em mais de 5 mil municípios, o que é absolutamente irrazoável. Assim como não é possível que municípios se tornem repúblicas autônomas dentro do Brasil, fechando seus limites geográficos e impedindo a entrada de serviços essenciais”.
Moraes criticou ainda os confrontos judiciais entre governos federal, estaduais e municipais e o que chamou de “personalismo”. Segundo ele, se houve excessos nas medidas tomadas pelos Estados e municípios, “isso ocorreu porque, até agora, não há uma regulamentação geral da União sobre a questão do isolamento ou o necessário tratamento técnico-científico desta pandemia gravíssima”.
O ministro Edson Fachin, por sua vez, também afirmou que “o pior erro na formulação das políticas públicas é a omissão”. “É grave que, sob o manto da competência exclusiva ou privativa, premiem-se as inações do governo federal, impedindo que Estados e Municípios, no âmbito de suas respectivas competências, implementem as políticas públicas essenciais.”
Ao se pronunciar em plenário, o procurador-geral da República, Augusto Aras, que costuma se manter alinhado ao presidente, mas vem sendo pressionado por integrantes da categoria a se posicionar em meio à pandemia, defendeu que a MP não afasta a competência dos Estados e municípios de atuarem.
Já o advogado-geral da União, André Mendonça, argumentou que poderia haver “caos social” se o governo federal não centralizasse as decisões.