Presidente argentino acusa Bolsonaro de falta de seriedade
Foto: Gonzalo Fuentes/Reuters
Depois de anunciar a extensão do isolamento de forma estrita nos grandes centros urbanos e de flexibilizar nas cidades menores, o presidente argentino, Alberto Fernández, revelou estar “muito preocupado com a situação do coronavírus no Brasil” porque considera que “o governo brasileiro não está encarando o problema com seriedade”.
O presidente argentino, Alberto Fernández, anunciou a quarta fase do isolamento social, preventivo e obrigatório contra o coronavírus com flexibilizações para as pessoas saírem, por uma hora, até 500 metros das suas casas e uma diminuição maior das restrições para quem vive em cidades menores.
A nova fase da quarentena total, iniciada em 20 de março e renovada pela terceira vez a partir de segunda-feira (27), inclui uma leve flexibilização a toda a população: poderão sair de casa, por apenas uma hora, para atividades recreativas ao redor do seu domicílio.
“Vamos autorizar que qualquer pessoa possa sair em torno de 500 metros da sua casa para fins recreativos, mas não esportivos. Vão poder andar e tomar ar por uma hora diariamente, mas não correr nem andar de bicicleta”, esclareceu Alberto Fernández.
Para metade da população que vive nos grandes centros urbanos do país com mais de 500 mil habitantes, como Buenos Aires, Córdoba, Rosário, Santa Fé, Mar del Plata e Mendoza, a quarentena vai continuar com restrição total.
Porém, começa uma fase de flexibilização para a outra metade da população que vive nas cidades com menos de 500 mil pessoas, onde não houve registro de casos nos últimos dias. A decisão de como gerir essa flexibilização caberá aos governadores de cada província.
“Agora começa uma nova fase. Deixamos nas mãos dos governadores o controle de quais atividades poderão abrir. Vamos permitir que metade da população se mobilize”, anunciou Fernández.
O presidente, no entanto, ressaltou cinco requisitos que deverão ser cumpridos pelos governadores que flexibilizarem as atividades: o tempo de duplicação do número de casos não poderá ser inferior a 15 dias, o sistema de saúde tem de ser capaz de atender a demanda, deverá ser avaliada a densidade demográfica e a vulnerabilidade social da área, deve haver garantia de que apenas metade da população possa sair de casa a cada dia e as zonas flexibilizadas devem ser livres de transmissão comunitária.
“O governo federal fará um seguimento e, se alguma dessas exigências não for cumprida, voltaremos ao ponto anterior da quarentena”, advertiu Fernández, tirando a esperança daqueles que pensavam na volta do funcionamento de escolas, restaurantes e turismo.
“O que não muda é que vamos continuar sem aulas, sem atividade na administração pública, sem hotéis, sem restaurantes e sem espetáculos”, descartou.
O país também continuará com as fronteiras fechadas aos estrangeiros.
Após o anúncio, em entrevista com a TV argentina, Alberto Fernández disse que “está muito preocupado com a situação do Brasil” porque “pode cruzar a fronteira argentina” e porque “o governo brasileiro não está encarando o problema com seriedade”.
“Preocupa-me muito a situação do Brasil. Tive uma conversa com todos os governadores por videoconferência. O governador de Misiones (fronteira com Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) expôs com toda clareza a sua preocupação porque as províncias de Misiones e Corrientes (fronteira com o Rio Grande do Sul) são caminho de entrada de muitos caminhões de carga que vêm de São Paulo, onde o foco de infecção é altíssimo”, admitiu o presidente argentino.
Alberto Fernández evitou mencionar o presidente Jair Bolsonaro diretamente na hora de criticar e preferiu citar “o povo brasileiro” na hora de se mostrar preocupado.
“Não acho que o governo brasileiro esteja encarando o problema com a seriedade que o caso requer. Digo isso sinceramente”, lamentou. “Eu gosto muito do povo do Brasil, mas isso me preocupa muito porque pode vir para a Argentina”, advertiu.
Ao contrário dos países que sugerem o isolamento, a Argentina impõe uma proibição completa para a circulação, a não ser em cerca de 50 atividades com funções excepcionais. Fora esses grupos, aqueles que são pegos sem autorização são detidos e respondem a processo penal.
O presidente revelou que, depois desta fase até 10 de maio, ainda virão mais duas etapas antes de a quarentena acabar por completo, mas não revelou a data para o fim do isolamento social, obrigatório e preventivo.
Segundo os dados que apresentou, nestes primeiros 35 dias de quarentena, 95% da população respeitou a primeira fase de “isolamento estrito”. Na etapa de “isolamento administrado”, o cumprimento atingiu 75% da população. Isso permitiu que a Argentina, com 45 milhões de habitantes, tivesse 3.780 casos registrados e 186 mortes.
No começo do isolamento, em 20 de março, a taxa de contágio duplicava-se a cada 3,3 dias. No dia 12 de abril, a taxa tinha passado a 10,3 dias. Atualmente, os contágios duplicam-se a cada 17,1 dias, indicando que o país conseguiu achatar a curva e ganhar tempo para se preparar para a covid-19.
Numa Argentina extremamente polarizada em posições políticas, o presidente, que somou popularidade desde o começo das restrições até chegar a 80%, agradeceu pela união raras vezes vista no país.
“A saúde uniu-nos sem marcar diferenças. Foi uma união da Ciência com leigos, das políticas de todas as bandeiras. Vamos cuidar da saúde porque isso é cuidar da Argentina. Continuemos juntos e unidos para sairmos com menos dor deste tempo doloroso”, pediu Alberto Fernández.