Bolsonaristas tentam ocultar falta de apoio em atos

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Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

Militantes bolsonaristas têm mudado a estratégia para os atos de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em Brasília. Em vez de grandes manifestações, os organizadores agora optam por eventos menores e mais frequentes.

Eles reconhecem que houve uma mudança de tática, mas negam que seja para mascarar uma perda de base para aglomerações de maior porte.

Fato é que, em termos de números, os protestos perderam força na capital federal. Há, de todo modo, receio de que a pandemia de Covid-19 e a perda de apoio a Bolsonaro resultem em atos esvaziados.

“A gente está considerando que os ataques ao nosso presidente estão sendo feitos de maneira muito sistemática. E a gente percebe a importância de o povo estar nas ruas e mostrar que está com nosso presidente”, afirma Winston Lima, do Movimento Brasil.

“Se a gente espaçar muito, em um mês vai acontecer muita coisa contra o nosso presidente, muitas vezes até de maneira arbitrária.”

Comandante Winston Lima, como é chamado o militar reformado, acrescenta que os protestos mais frequentes, mesmo que menores, apresentam impacto maior. Isso porque seria possível manter na mídia e nas redes sociais o clima de mobilização.

O militante reconhece que o número de pessoas nos atos pode ser menor, mas defende que isso também ocorre porque muitos não descem dos carros, por causa do coronavírus. Ele defende que de 15 mil a 20 mil veículos participam das carreatas —número que não pode ser confrontado pois não há medição oficial.

Este fim de semana será o quinto seguido com manifestações em Brasília. O roteiro será o mesmo: começa com uma carreata e depois segue-se um ato na região da Esplanada dos Ministérios.

Os protestos agora semanais também em geral terminam com algumas centenas de pessoas em frente ao Palácio do Planalto, na esperança de que Bolsonaro apareça para cumprimentá-los. No dia 3, na última participação do presidente, ato com faixas pedindo intervenção militar terminou com jornalistas agredidos.

A Polícia Militar do Distrito Federal informou que não divulga mais estimativas de público em eventos. Imagens aéreas das aglomerações, no entanto, sugerem redução no número de participantes.

Além disso, uma análise dos protestos deixa claro que muitas caravanas presentes nos atos se repetem. Nas últimas semanas, grupos passaram a se estabelecer permanentemente em Brasília. O exemplo mais notório é o 300 do Brasil, que chegou a ter um acampamento em frente ao estádio Mané Garrincha e vem participando de todos os atos.

Um militante também relatou à Folha que bolsonaristas de diversas partes do país viajaram por conta própria para a capital federal, onde foi criada uma rede de apoio. Dezenas deles são hospedados por moradores de Brasília, a fim de manterem sua militância por período prolongado.

Esses grupos também passaram a figurar no dia a dia do presidente: parte segue até o Alvorada para cantar gritos de guerra por ele e uns poucos ficam a postos para quando Bolsonaro aparece de surpresa na rampa do Planalto.

Especialistas afirmam que Jair Bolsonaro ainda mantém uma base considerável, mas que a fase de adesão ao bolsonarismo ficou para trás.

“Em 2018, nós tínhamos um encontro do bolsonarismo raiz com a classe média, presente no lavajatismo, que resultava numa grande massa de eleitores e nas ruas”, diz o cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco Antonio Lavareda.

Ele explica que essa massa sofreu duas defecções. A primeira resultante do desgaste natural de um governante. A outra, mais expressiva, envolve admiradores da Operação Lava Jato, desiludidos com a saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça.

Três dias após a demissão do ex-juiz do governo, pesquisa Datafolha mostrou que Bolsonaro era aprovado por um terço dos brasileiros.

Além da queda de popularidade, o surto de coronavírus também desestimula a participação em atos públicos.

“Mesmo entre bolsonaristas, a maioria é cautelosa em relação ao tratamento dado ao vírus. No nível pessoal, o medo se sobrepõe”, diz Lavareda.

Por outro lado, apoiadores do presidente acreditam que o governo se encontra sob intenso ataque, sobretudo por parte do Congresso e do Supremo Tribunal Federal.

“Manter manifestações e carreatas constantes é uma espécie de aviso contra qualquer iniciativa de impeachment”, afirma o cientista político Ricardo Ismael, da PUC-Rio.

Ismael avalia ainda que Bolsonaro perdeu força com as demissões de ministros populares —ele cita também o ex-titular da Saúde Luiz Henrique Mandetta. No entanto, afirma, uma das formas para compensar a situação seria a politização do enfrentamento ao coronavírus.

“Ele tem um jogo político que consegue manter apoio.”

A também organizadora de protestos Meire Cruvinel, por sua vez, diz que os atos mais frequentes se devem à luta para reverter as políticas de isolamento social para evitar prejuízos para a economia.

“Os empresários não estão mais conseguindo ficar com o comércio fechado e está indo todo mundo pra rua, em carreata, solicitando que o comércio seja aberto e que volte, segundo o protocolo de saúde, o mercado econômico”, diz.

Questionada se uma eventual convocação para grandes protestos atingiria o mesmo número de participantes no passado, Cruvinel responde: “Seria muito maior”.

“Os governadores [responsáveis pelas políticas de isolamento social] estão despertando no povo um patriotismo. A fome dói.”

Folha