Bolsonaro recebeu youtubers alvos da PF
Foto: ADRIANO MACHADO / REUTERS
O presidente Jair Bolsonaro recebeu no Palácio da Alvorada, no último sábado, um grupo de youtubers aliados, que tem entre seus membros uma investigada por propagar fake news. Em seus canais, esses comunicadores, que costumam ser divulgados pelos filhos do presidente como “fontes de informação”, seguem a mesma cartilha: atacam o Supremo Tribunal Federal (STF), a imprensa e o presidente da Câmara Rodrigo Maia. Em vídeos, boa parte deles também apoia o discurso do presidente contra o isolamento social em meio à pandemia da Covid-19, o que contraria orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Uma das participantes do encontro com o presidente, a mineira Bárbara Zambaldi Destefani, de 33 anos, entrou na mira do inquérito do ministro Alexandre de Moraes que apura a existência de uma suposta rede bolsonarista de fake news. O perfil do Twitter de Bárbara aparece entre os 11 que o ministro apontou em sua decisão como parte de um mecanismo de criação e divulgação de notícias falsas.
Em seu canal, Bárbara, que se autodescreve como uma dona de casa e uma eleitora média de Bolsonaro, tem 581 mil inscritos. No Twitter, são 243 mil seguidores. No último sábado, ela conseguiu uma entrevista exclusiva com o presidente da República com quase uma hora de duração. Em vídeo dias depois, ela disse que a após a entrevista acabou citada na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News, que teria pedido a quebra do seu perfil no Twitter.
Na conversa com Bolsonaro feita quando o Brasil já tinha passado de 20 mil mortos pela Covid-19, a youtuber começou com a seguinte indagação: “qual o dia mais feliz da sua vida?”. Bolsonaro respondeu que foi o dia que ele nasceu. A youtuber seguiu então com perguntas como “qual foi o dia mais triste”, “o que te faz acordar todos os dias para mais um dia” e “qual a situação mais difícil que enfrentou antes de se tornar presidente”.
Em seu périplo em Brasília, Bárbara ainda participou de uma live da deputada Bia Kicis – uma das parlamentares que será ouvida no inquérito das fake news – e foi ao chá de bebê do blogueiro Allan dos Santos – que aparece num diagrama do inquérito como uma espécie de coordenador do mecanismo de notícia falsas. Na quinta, em seu canal, ela falou sobre o inquérito das fake news:
— O processo está falando lá que estamos compartilhando ódio. Nós somos organizados? Isso é verdade? Não. Não é. Não somos uma milícia organizada. Quem sabe um dia, né?! — ironiza Bárbara. — O que estamos vivendo é censura. O meu crime é apoiar o meu presidente – protestou a youtuber, que recentemente fez sua estreia como colunista no portal Brasil Sem Medo, um site ligado ao ideólogo de direita Olavo de Carvalho.
Aos seus seguidores, Bárbara afirma que sua forma de operar conta com apenas um computador e um celular com a tela quebrada. Diz também que foi a Brasília com a ajuda do pai, que comprou sua passagem aérea com milhas. Youtubers experientes e que a conhecem, no entanto, estimam que, com base no número de seguidores e de visualizações em seu canal, Bárbara pode faturar pelo menos R$ 20 mil mensais na plataforma.
Outro comunicador que tomou café com Bolsonaro e tem chamado atenção pela atuação recente e por números crescentes no youtube é Alan Frutuoso, que se apresenta como jornalista e “analista político”. Seu canal, o Vista Pátria, foi criado em 19 de janeiro de 2017 e já conta com 454 mil inscritos e mais de 69 milhões de visualizações. Frutuoso é amigo do vereador Carlos Bolsonaro e de Daniel Lopez. Este último é um dos precursores entre os youtubers de direita. Muito próximo a Carlos e Eduardo Bolsonaro, Lopez é apontado como um dos responsáveis por aproximar o bolsonarismo do olavismo – nome dado ao grupo de seguidores do ideólogo Olavo de Carvalho.
Em seu canal no sábado na praça dos Três Poderes, Frutuoso fez uma série de ataques contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e chegou a usar o termo “canalhas” ao se referir aos ministros. O decano da corte, Celso de Melo – que se aposentará no fim deste ano – foi chamado por ele de “fim de carreira”. Em seguida, afirmou que o ministro quis apreender o celular de Bolsonaro. Na verdade, o que o ministro fez foi encaminhar à Procuradoria Geral da República (PGR) que se manifestasse sobre um pedido de partidos políticos e parlamentares que pediam a apreensão do celular do presidente.
— Hoje vimos o absurdo que foi o Celso de Melo querer apreender o celular do presidente da república, que não vai aceitar mais esse tipo de abuso – afirma Frutuoso. — Quem for de Brasília venha protestar contra esse tipo de manipulação feita pelos canalhas do STF. O que o Celso de Melo, de fim de carreira, está fazendo é tentar jogar para a população como se o presidente estivesse interferindo.
Na sequência do vídeo, Frutuoso é interpelado por um membro do acampamento “300 do Brasil”, que tem liderado uma série de atos antidemocráticos em Brasília. O manifestante afirma que acabara de voltar do Superior Tribunal Militar (STM), onde ele e outras pessoas teriam protocolado pedidos de prisão dos 11 ministros do STF, de 25 governadores e de Rodrigo Maia. Frutuoso não questiona o interlocutor sobre a razão daqueles atos.
A terceira youtuber com mais seguidores que esteve com Bolsonaro é Paula Marisa, com 430 mil inscritos em seu canal. Em seus vídeos também está presente a defesa de Bolsonaro, ataques ao STF e a imprensa. Também não faltam críticas contra a quarentena imposta por governadores e prefeitos. Em vídeo recente, ela tira a máscara para falar e diz “isso não serve para nada”.
Na lista de youtubers que foram ao Alvorada há ainda o advogado baiano Mauro Fagundes e Teff Ferrari, que se diz uma psicóloga conservadora. O primeiro tem 205 mil inscritos em seu canal; a segunda apenas 2, 8 mil. Esses últimos são tidos como novatos, mas suas postagens têm recebido o apoio de Frutuoso e de Barbara e a audiência de seus canais têm crescido.
O GLOBO procurou os youtubers mencionados, mas eles não responderam.