Centrão e Bolsonaro fingem nas redes que não existe pandemia
Foto: Reprodução
Os partidos aliados do presidente Jair Bolsonaro e as siglas do bloco informal conhecido como Centrão têm evitado se posicionar a respeito de propostas de combate ao coronavírus em suas redes sociais e priorizam o foco na agenda econômica. Enquanto isso, as legendas de oposição têm usado a pandemia para, de forma coordenada, defender o impeachment de Bolsonaro.
Essas são algumas das conclusões de estudo da Transparência Partidária e da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) sobre como os 33 partidos políticos e o Aliança pelo Brasil, que Bolsonaro pretende criar estão se posicionando na internet com relação à pandemia de covid-19.
Foram coletadas 3.234 publicações das siglas no Facebook até o último domingo, 17, atualização mais recente do estudo, em que foram identificados 179 temas sobre os quais as siglas se posicionaram, como adiamento das eleições municipais e do ENEM, renda básica emergencial, até as demissões dos ex-ministros da Saúde Henrique Mandetta e Nelson Teich. O estudo leva em conta posicionamentos e propostas das siglas, sem considerar postagens como reproduções de notícias sem juízo de valor, enquetes e divulgação de medidas adotadas por filiados que exercem mandatos como em governos estaduais ou municipais.
O Centrão, de quem o presidente Bolsonaro se aproximou nas últimas semanas, oferecendo cargos no governo em troca de apoio no Congresso, têm investido pouco no tema coronavírus em suas redes sociais. O PL também está na lista dos partidos que deixaram o assunto de lado, enquanto o PP e o Solidariedade priorizaram o impacto da pandemia na economia.
O PTB publicou que “precisamos de empregos e do funcionamento de empresas” e, em aspas do presidente da sigla, Roberto Jefferson, chamou o coronavírus de “gripe chinesa”.
Partido do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, o DEM reduziu drasticamente o número de postagens depois da saída de seu filiado da pasta da Saúde. O PRTB, do vice-presidente Hamilton Mourão, também ignorou o coronavírus.
“Chama a atenção o enfoque na agenda econômica e a pouca quantidade de postagens e manifestações. Quase um silêncio dos partidos”, analisa Marcelo Issa, diretor executivo do Transparência Partidária. “É uma postura de evitar a pauta (coronavírus), evitar entrar nessa disputadas de narrativas.”
Quatro partidos de esquerda estão entre os cinco que mais publicaram opiniões e propostas sobre a covid-19, de acordo com o estudo: PSOL (45), PSB (42), PCdoB (36) e PT (28). A quinta sigla da lista é o PSL, o ex-partido de Bolsonaro, com 21 publicações, entre elas a defesa do isolamento social e a defesa de políticas recomendadas pela OMS.
Há indicação de sintonia entre as siglas de esquerda e centro-esquerda, que tentam emplacar “movimentos” digitais de forma unificada. Há alguns dias, PDT, PSB, Rede e PV lançaram o “Janelas pela democracia”, que defende o impeachment de Bolsonaro. “Tem havido tentativas de articulação de partidos de esquerda para defesa de propostas de forma pottual. Isso não se verifica entre as siglas à direita”, diz Marcelo Issa, diretor executivo do Transparência Partidária.”
Dezoito partidos defendem a política de isolamento social e 12 se posicionaram a favor da testagem em massa da população. São as medidas que mais receberam apoio de partidos, de acordo com o estudo. Na sequência estão a renda básica emergencial (11), a tributação de grandes fortunas (10), o projeto que prevê ajuda financeira por parte da União a estados, municípios e o DF (10), até o afastamento do presidente da República (10).
“Os partidos deveriam ser o mais claro possível em suas propostas para combater a pandemia para que a população e seus eleitores tenham uma visão do que está sendo feito e do que pode ser feito para essa crise ser suavizada”, diz Reinaldo Chagas, coordenador de projetos da Abraji.
Partido que o presidente Jair Bolsonaro tenta tirar do papel, o Aliança pelo Brasil vai divulgar, nos próximos dias, uma cartilha com dicas de prevenção contra o coronavírus que ignora as orientações de isolamento social, frequentemente criticadas pelo presidente, embora sejam apontadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como forma de evitar a proliferação da covid-19. O material da sigla em formação será postado nas redes sociais.
Em fevereiro, o Aliança ironizou o vírus chamando-o de “caronavírus”, sem explicações. Foi a única menção do partido em criação à pandemia. “O negócio não estava tão pesado quanto agora (quando da publicação da piada). Nosso trabalho agora é usar nossa audiência para ajudar a população a se informar sobre como se proteger do coronavírus”, diz o marqueteiro do Aliança, Sérgio Lima. Questionado se a cartilha falaria sobre isolamento social, ele disse que a ideia é não entrar em debates da política. “É o partido do presidente, mas governo é governo e partido é partido. A gente não entra em debates do governo.”