Colunistas de O Globo criticam vídeo de Bolsonaro
Foto: Marcos Correa
Aberto por determinação do decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, o HD externo número 195.1992, patrimônio da Presidência da República, foi tornado público sexta-feira como parte da investigação que pretende descobrir se o presidente Jair Bolsonaro tentou intervir politicamente na Polícia Federal, como denunciou o ex-ministro da Justiça Sergio Moro.
Gravada no dia 22 de abril, quando o Brasil registrava 45.757 casos do novo coronavírus e 2.906 mortes, a reunião ministerial se soma a outros indícios que compõem o inquérito nas mãos da Procuradoria-Geral da República.
Para além dos trechos diretamente relacionados à tentativa de interferência na PF, a divulgação do vídeo expôs outras faces do governo. Bolsonaro chegou a defender que a população se arme para reagir a medidas de isolamento social, enquanto o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, advogou que se aproveite as atenções voltadas à pandemia para afrouxar a legislação ambiental. Nos trechos que foram divulgados, pouco foi falado sobre como reduzir o índice de contágio que seria praticamente multiplicado por dez em pouco tempo.
Todo mundo sabe que o presidente Bolsonaro interveio na Polícia Federal, e é preciso ser um nefelibata para acreditar que essa intervenção não tinha intenções não republicanas. Mas, como tudo na vida, depende de quem quer ver e escutar. Agora, é a vez do atual procurador-geral, Augusto Aras, querer ou não ver e ouvir.
Se, como tudo indica, ele decidir arquivar o processo, sem oferecer a denúncia, estará fazendo como o centrão, que provavelmente protegerá Bolsonaro como protegeu Temer, em troca de cargos no governo. Fechando os olhos para as evidências, sem se esforçar para juntar dois mais dois. (Leia mais)
A nação assistiu estarrecida ao vídeo da fatídica reunião ministerial que culminou na demissão do ministro da Justiça, Sergio Moro. Foi um festival de barbaridades e palavrões capaz de fazer corar até mesmo Celsinho da Vila Vintém. Tão grave quanto a reunião, ou até mais, foi a nota do general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, que ameaçou o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, e de resto todo o país, numa defesa despropositada do presidente Jair Bolsonaro. Foi a declaração mais acintosamente antidemocrática de um general desde o fim da ditadura, há 35 anos. (Leia mais)
O mais espantoso na reunião é o conjunto. São duas horas repletas de palavrões e delírios, de escárnio e desrespeito com o país. O Brasil atravessando a sua pior crise em décadas, e em nenhum momento o presidente fala da pandemia como um problema que o preocupasse. Essa ausência choca. Suas falas coléricas são concentradas na defesa da sua família e dos amigos, no insulto aos adversários políticos, e em ordens para que os ministros defendam o governo. E sim, ele claramente quis interferir na Polícia Federal e disse que tem um sistema particular de informação. Na breve fala do ministro Nelson Teich, ele disse “a gente não é um barco à deriva”. Engano. Aquela reunião prova que o Brasil não tem governo, está à deriva no meio de uma tragédia.