Defesa de Bolsonaro contra vídeo tem contradições
Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil / Agência O Globo
Apesar de o presidente Jair Bolsonaro negar ter citado a Polícia Federal na reunião ministerial do dia 22 de abril e dizer que sua preocupação era com a segurança dos filhos, versão sustentada na terça-feira nos depoimentos à Polícia Federal dos ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), as declarações públicas do presidente mostram que a preocupação dele foi sempre com a PF. Falas de Bolsonaro desde o ano passado e os atos praticados pelo governo após a demissão do ministro Sergio Moro ajudam a fragilizar a versão que, agora, o governo tenta dar às ações do presidente da República, investigado no Supremo Tribunal Federal (STF) por suposta tentativa de interferência política na Polícia Federal.
Nos depoimentos que prestaram ontem à PF, Ramos e Heleno disseram que Bolsonaro, na reunião do dia 22 de abril, só falou da “segurança pessoal” que tem no Rio. Segundo os ministros, o presidente citou o caso como exemplo para dizer que poderia trocar qualquer um. Ramos disse que o presidente ameaçou “interferir em todos os ministérios” para melhorar a qualidade dos relatórios de inteligência recebidos por ele.
A responsabilidade pela segurança do presidente e de sua família é do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência que seleciona agentes, a maioria da Forças Armadas, para a função. O comando do GSI é do ministro Augusto Heleno, que estava na reunião.
Mas a versão sustentada pelos ministros choca com as demissões efetivadas pelo governo. Com a demissão de Moro e do diretor-geral Maurício Valeixo, a primeira troca feita pelo novo comando da PF foi justamente na superintendência do Rio. Bolsonaro nomeara Alexandre Ramagem, que é ligado a sua família e dirige a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), também subordinada a Heleno), para chefiar a PF, mas a indicação foi barrada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes. Depois disso, escolheu Rolando Alexandre de Souza, subordinado a Ramagem a Abin, para o posto. Entre os primeiroa atos como diretor geral da PF, Rolando de Souza mudou o comando da superintendência da PF no Rio.
Heleno também atestou, no seu depoimento, que Bolsonaro citou a PF ao reclamar de relatórios de inteligência produzidos pelo governo, mas nada disse sobre pressão do presidente sobre a PF no Rio por conta de investigações que poderiam atingir parentes e amigos.
Desde o ano passado, Bolsonaro tornou pública sua insatisfação com a atuação da PF no Rio e com a própria direção-geral do órgão. A seguir, os momentos em que Bolsonaro expôs sua insatisfação com o comando da PF:
Em 15 de agosto do ano passado, por exemplo, Bolsonaro anunciou durante uma entrevista coletiva que substituiria o então superintendente da Polícia Federal (PF) no Rio de Janeiro Ricardo Saadi por problemas de “gestão e produtividade”. Na época, o presidente não entrou em mais detalhes sobre o motivo da troca. Ele mencionou a decisão quando foi perguntado sobre possíveis mudanças na Receita Federal. No mesmo dia, em nota divulgada pelo Ministério da Justiça, a PF informou que a substituição já estava prevista havia algum tempo e nada tinha a ver com o desempenho profissional dele.
— Todos os ministérios são passíveis de mudança. Vou mudar, por exemplo, o superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro. Motivos? Gestão e produtividade — disse Boslonaro em agosto do ano passado.
Um dia depois, afirmou que é ele quem “manda” no seu governo, ao comentar a mudança na superintendência. Questionado sobre se a decisão da mudança teria partido dele ou da PF, Bolsonaro disse que a pergunta teria que ser direcionada ao então ministro da Justiça Sergio Moro, a quem o órgão está subordinado. Ele também disse que tinha poder de veto e que não poderia ser um “presidente banana”.
— Pergunta para o Moro. Já estava há três, quatro meses para sair o cara de lá. Está há três, quatro meses. O que acontece, quando vão nomear alguém, falam comigo. Ué? Eu tenho poder de veto. Ou vou ser um presidente banana agora? Cada um faz o que entende e tudo bem?
Em 22 de agosto, o presidente disse que poderia substituir o diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, mas ressaltou que não pensava em fazer isso naquele momento. Bolsonaro reclamou da repercussão da troca do superintendente da PF do Rio de Janeiro, anunciada por ele uma semana antes. O presidente ressaltou que é o responsável por indicar o ocupante do cargo, e não o então ministro da Justiça, Sergio Moro, a quem a PF está vinculada.
— Agora há uma onda terrível sobre superintendência. Onze foram trocados e ninguém falou nada. Sugiro o cara de um estado para ir para lá, “está interferindo”. Espera aí. Se eu não posso trocar o superintendente, eu vou trocar o diretor-geral. Aí é… Não se discute isso aí — disse Bolsonaro na época.