Especialistas opinam sobre confisco de celular de Bolsonaro

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Foto: Ernesto Rodrigues/Estadão

Na última sexta, 22, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, encaminhou três notícias-crime contra o presidente Jair Bolsonaro para análise da Procuradoria-Geral da República. O despacho se deu no âmbito do inquérito que apura se houve tentativa de interferência política do presidente na Polícia Federal para obter informações de investigações que pudessem atingir seu núcleo familiar, como afirmou o ex-ministro Sérgio Moro ao deixar o governo.

As notícias-crime foram enviadas ao Supremo pelos deputados federais Gleisi Hoffman e Rui Falcão, ambos do PT, e pelas bancadas do PDT, PSB E PV e pedem o depoimento do presidente e a busca e apreensão do celular dele e de seu filho, Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), para perícia. Ao recebê-las, o decano do STF encaminhou para avaliação do procurador-geral da República, Augusto Aras, como manda o rito da Corte. Caberá ao PGR analisar as notícias-crime e se manifestar sobre os pedidos. A decisão sobre permitir ou não a apreensão dos aparelhos, no entanto, será de Celso de Mello.

Após a medida, o decano sofreu ataques da base de apoio bolsonarista e foi alvo de manifestações críticas de ministros do governo. O general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional, assinou uma nota classificando o pedido como ‘inconcebível e inacreditável’. O general disse ainda que, se for aceito, poderá ter ‘consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional’.

O ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, disse ao Estadão estar ‘extremamente preocupado’ com a tensão entre os Poderes. “A simples ilação de o presidente da República ter de entregar o seu celular é uma afronta à segurança institucional”, afirmou ele.

Leia o que pensam advogados sobre o assunto:

Flávio Henrique Costa Pereira, sócio coordenador do departamento de Direito Eleitoral e Político do BNZ Advogados e um dos advogados do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Roussef:

“Em um Estado Democrático de Direito todos são iguais em direitos e obrigações. A Constituição Federal é expressa quanto a igualdade. Mas a principal igualdade é aquela advinda do princípio republicano, qual seja, as autoridades se submetem à mesma lei, ressalvadas as exceções expressamente previstas na Constituição da República.

O presidente da República responde pelos crimes que pratica no exercício de seu mandato, em razão de seu ofício. Na hipótese de se entender presentes indícios desses crimes pelo presidente, ele está sujeito às ações de investigação como qualquer brasileiro, inclusive, se o caso exigir, a busca e apreensão de celulares, decorrente do afastamento de sigilo telefônico e telemático. Nesses casos, há de se observar a proporcionalidade e razoabilidade do ato, inclusive considerando sua condição de Chefe do Poder Executivo. Ainda, deve-se tomar todas as medidas necessárias para preservar o sigilo das informações obtidas, especialmente aqueles relevantes para a segurança do Estado.

No Brasil, essa discussão já se mostra superada, inclusive com o posicionamento unânime do Supremo Tribunal Federal quanto a possibilidade de se realizar a busca e apreensão de equipamentos telemáticos de representantes de outros Poderes, como deputados e senadores. O Superior Tribunal de Justiça também já tem posicionamento sobre esse ato investigativo contra governadores de Estado.

A ninguém é permitido utilizar de seu cargo público para fazer ameaças, ainda que veladas, a um outro Poder, ofendendo a harmonia entre eles. Tal prática afronta os princípios da administração pública e constitui ato de improbidade administrativa. Ainda, tal conduta, quando realizada por um ministro de Estado, o sujeita a processo de impeachment, perante o Supremo Tribunal Federal, por afronta à probidade na administração.”

Conrado Gontijo, criminalista, doutor em direito penal e econômico pela USP:

“A manifestação do general Heleno é mais um dos graves ataques que integrantes do governo têm feito à democracia e às instituições brasileiras. O presidente não está acima da Lei. Na hipótese de haver razões para investigá-lo pela prática de comportamento criminoso, desde que haja autorização judicial fundamentada, o seu aparelho telefônico pode – e deve – ser apreendido. O Gabinete de Segurança Institucional não tem qualquer competência para opinar sobre o assunto, que eventualmente poderá ser decidido pelo Supremo Tribunal Federal.”

Claudio Bidino, sócio do Bidino & Tórtima Advogados, mestre em Criminologia e Justiça Criminal pela Universidade de Oxford:

“A nota do General Heleno parece contraditória justamente com o que ela pretenderia resguardar, que é a harmonia entre os poderes da república. Se o pedido de apreensão do telefone do presidente é ou não cabível, competirá exclusivamente ao decano do Supremo Tribunal Federal decidir, no momento oportuno, sem qualquer intromissão externa”

Estadão