Glenn vê indícios fortes de crime de Bolsonaro
Foto: Vinícios Loures
O advogado e jornalista Glenn Greenwald, editor do site The Intercept Brasil, afirmou hoje que ‘há indícios fortes’ na reunião ministerial de 22 de abril de que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tentou interferir na Polícia Federal. A declaração foi dada em participação no UOL Debate.
Questionado pelo colunista do UOL Reinaldo Azevedo sobre indícios de crime no vídeo divulgado na última sexta-feira pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Glenn fez um paralelo entre Bolsonaro e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
A publicidade da gravação foi pedida pelo ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, como prova de que Bolsonaro teria tentado interferir politicamente na cúpula da Polícia Federal.
“Tem indícios, sem provas. É interessante porque o Bolsonaro gosta de copiar o Donald Trump. Tinha controvérsia bem parecido. Em 2017, Trump demitiu o diretor da FBI [equivalente à Polícia Federal dos EUA] quando tinha investigação da campanha presidencial do Trump. O presidente dos EUA tem o direito de demitir o diretor do FBI quando quiser? Tem sim, mas tem que ter um motivo válido. Se o motivo do Trump fosse para obstruir a justiça, isso é um crime. Para mim, é a mesma pergunta: o presidente Bolsonaro tem o direito de trocar do diretor da PF a hora que quiser? Se o motivo fosse para blindar seus filhos, aliados, isso é motivo corrupto, criminoso”, disse Glenn.
“Isso se tornou um crime. Dentro da reunião, ele não disse explicitamente que está fazendo isso para obstruir a Justiça, mas deixa mais ou menos claro que a preocupação dele era proteger seus filhos e amigos. Ele disse isso claramente. Para mim, tem provas de crime? Não, mas tem indícios fortes e evidências fortes”, acrescentou o jornalista.
Para o jurista Luiz Fernando Amaral, professor de direito da Faap, apesar de o presidente ter a prerrogativa de trocar o diretor-geral da PF, cabe à Justiça analisar se esta ação serve ao interesse público ou ao interesse do agente público.
“A partir do instante em que Bolsonaro fala, e ele fala mais do que deveria e fora da liturgia do cargo, pode haver a caracterização de um desvio de finalidade”, aponta.
“Se Bolsonaro simplesmente trocasse o diretor-geral da PF, seria uma prerrogativa legal, mas diante do que soubemos pelo Moro e diante do que ouvimos neste vídeo da reunião, juridicamente dá a entender que essa mudança interessa à proteção maior de seus amigos, familiares, grupos políticos”, explicou o professor.
A presidente do sindicato de delegados da PF, Tânia Prado, completou, dizendo que “o vídeo agregou com mais informações”, mas que “é imaturo dizer que há provas”.
“[O vídeo] nos traz preocupação com credibilidade da PF. Todo agente público tem dever de probidade. Os atos têm que respeitar lei, constituição e princípios. As coisas da reunião, temos que ver qual é o dolo, se ele tinha intenção de fazer mudança para proteger algum com o delegado tem que entender o dolo. Tem que ser apurado isso a fundo. O vídeo agregou com mais informação, mas é prematuro dizer que ele prova”.
A troca do diretor-geral da Polícia Federal foi o que desencadeou a atual crise política do Governo Federal. Bolsonaro tirou Maurício Valeixo do cargo e, em reação, o então ministro Sergio Moro pediu demissão publicamente, em uma entrevista coletiva em que apontava suposta interferência política do presidente na PF.
Há uma investigação em curso para saber se Bolsonaro interferiu na corporação para ter vantagens pessoais — o próprio presidente admite “receber informações”. É no âmbito desta investigação que o ministro Celso de Mello, do STF, levantou o sigilo do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril. Tanto Valeixo quanto Moro já depuseram à PF sobre o assunto.
O sucessor de Maurício Valeixo seria Alexandre Ramagem, mas a escolha deste foi suspensa pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF. Na decisão, Moraes escreveu que a PF não é “órgão de inteligência da Presidência da República”.
O UOL Debate reuniu, além de Glenn, a presidente do sindicato dos delegados da PF Tânia Prado, o colunista do UOL Reinaldo Azevedo e o jurista e professor de Direito da FAAP Luiz Fernando Amaral.