Governo teve trabalho para se livrar de Regina

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Foto: Reprodução

Trocas ministeriais são comuns em todos os governos e, em geral, ocorrem por necessidade de mudanças administrativas ou ajustes políticos. No caso de Jair Bolsonaro, elas têm sido feitas de forma precoce e em ritmo mais frenético que o normal. Simbolizam o desastre em termos de gestão de um presidente que fez uma carreira política alicerçada na criação de factoides e ganhou visibilidade devido a propostas absurdas, opiniões chocantes e ideias radicais. Na chegada ao Palácio do Planalto, ele manteve a coerência e vem se guiando na escolha de alguns dos integrantes de seu gabinete mais pela intuição marqueteira do que por critérios técnicos. Ao brigar com o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, por exemplo, o capitão precisava de um médico de renome para reduzir o mal-estar provocado pela saída de um profissional popular e respeitado. Tirou rapidamente da cartola o nome do oncologista Nelson Teich, mas a “solução” não durou nem um mês. Na Secretaria da Cultura, Bolsonaro tinha urgência em apagar o incêndio gerado pelo vídeo de inspiração nazista divulgado pelo dramaturgo Roberto Alvim, que comandava a área. A substituta, Regina Duarte, era um nome de impacto por sua trajetória no meio artístico. Pouco parecia importar o fato de a atriz ter zero experiência em assuntos de Brasília. Tinha tudo para dar errado. E deu mesmo.

A separação foi consumada na quarta 20. O casamento chegou ao fim depois de quase três meses de uma relação turbulenta, com ares de chanchada de quinta categoria. Regina largou uma carreira de cinquenta anos na Rede Globo e um salário fixo de 60 000 reais em troca de uma remuneração de 17 000 na Secretaria da Cultura. Logo no início, enfrentou a oposição da ala ideológica ligada ao polemista Olavo de Carvalho e comandada informalmente pelo vereador Carlos Bolsonaro. Os fanáticos queixavam-se de que Regina Duarte era identificada com artistas de esquerda e não iria promover a “guerra contra o marxismo cultural” na pasta. Ela nunca teve tinta na caneta para demitir desafetos, como o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, que a atacava quase diariamente nas redes sociais. Tampouco teve a carta-branca que Bolsonaro havia lhe prometido para montar a sua equipe. Pedro Horta, um dos poucos nomes que Regina emplacou no governo, durou duas semanas no cargo de secretário adjunto de Cultura. Com o pedido de demissão da atriz, após semanas de humilhação pública, veio um prêmio de consolação: a direção da Cinemateca. O instituto, que cuida da memória do cinema nacional, permitirá que ela volte a São Paulo, onde mora há décadas. No último capítulo do folhetim lamentável protagonizado por Regina e Bolsonaro, os dois anunciaram sorridentes a solução num vídeo mal encenado no Palácio da Alvorada.

Regina demonstrava cansaço e abatimento desde a vexaminosa entrevista que concedeu à CNN Brasil, em que minimizou as mortes e torturas ocorridas na ditadura militar e deu um chilique ao ser apresentada a um vídeo gravado pela ex-colega Maitê Proença com críticas à sua gestão. O episódio aconteceu no último dia 7. Desde então, a atriz passou a se lamuriar para os funcionários da Cultura dizendo que sentia falta de sua família, sobretudo dos netos. A partir desse ponto, a trama só foi piorando. Na terça 12, os assessores de comunicação da Cultura e do Ministério do Turismo, pasta à qual Regina estava subordinada, receberam uma mensagem para que comparecessem a uma reunião de urgência. Ao entrarem na sala, os funcionários depararam com a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), que é amiga da atriz e os aguardava para comandar um brainstorming sobre como levantar o moral de Regina novamente. Zambelli passou a estruturar um plano de ação e sugeriu que fossem produzidos diversos vídeos para divulgar as medidas pensadas pela então secretária. Em uma de suas últimas tentativas para permanecer no cargo, ao qual ela sempre foi muito apegada, Regina pediu a contratação de um CEO para comandar a pasta enquanto atuaria como uma consultora geral, dando ideias e direcionamentos a ser tomados. A proposta não foi acatada. Zambelli, então, passou a articular junto com o governo uma saída honrosa para a secretária.

Para Regina, restou a direção da Cinemateca, que fica a 4 quilômetros de sua casa em São Paulo. A instituição está com os salários dos funcionários atrasados e corre o risco de sofrer com novos incêndios se não conseguir pagar a conta de luz para manter o seu acervo refrigerado. O cargo prometido a ela nem sequer existe, e questões burocráticas poderão impedi-la de trabalhar por lá tão cedo. Em Brasília, até a última quinta, 21, dava-se como certo que seria substituída na Secretaria da Cultura por Mário Frias, ator de segunda linha e bolsonarista de primeira. Ele figurou no elenco da novela Malhação, da Globo, e, nos últimos tempos, apresenta um game-­show na RedeTV! que luta ferozmente contra o traço no Ibope. Regina Duarte deve ser envolvida no processo de transição. Em sua passagem fugaz e melancólica pela Cultura, ela foi sem nunca ter sido, a exemplo de sua personagem mais famosa, a Viúva Porcina, de Roque Santeiro.

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