STF pode liberar acesso ao vídeo que Ele tentou esconder
Foto: Jorge William / Agência O Globo
A Advocacia-Geral da União (AGU) entregou ao Supremo Tribunal Federal (STF) o vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, citada pelo ex-ministro da Justiça Sergio Moro como prova do depoimento que deu à Polícia Federal no inquérito que apura suposta interferência política do presidente Jair Bolsonaro na corporação. O ex-juiz afirma que, naquele encontro, o chefe do Executivo solicitou a troca no comando da superintendência da instituição no Rio de Janeiro, além de acesso a relatórios de inteligência. O ministro Celso de Mello, relator do inquérito no Supremo, colocou o material sob sigilo.
O arquivo foi entregue em um HD externo na Secretaria Judiciária do Supremo e, de acordo com a AGU, não foram feitos cortes ou edições. No documento que confirma o encaminhamento do material, o advogado-geral da União, José Levi, afirma que apresenta “referido HD externo, na forma que lhe foi apresentado pela Presidência da República” e que o arquivo “contém o inteiro teor, sem qualquer edição ou seleção de fragmentos, da gravação mencionada (…).”
O governo havia pedido ao ministro Celso de Mello — relator do inquérito aberto no Supremo para investigar as denúncias de Moro — que fosse reconsiderada a decisão de entregar o vídeo, ou que fosse autorizada a apresentação apenas de um material editado, do qual seriam retirados trechos que se referem a conteúdo “sensível ao Estado”. O magistrado pediu manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR), em até 24 horas. No entanto, o prazo para o conteúdo ser apresentado terminava ontem.Continua depois da publicidade
Além de Moro, estiveram na reunião os ministros Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Walter Braga Netto, da Casa Civil; e Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo. Os três serão ouvidos pela Polícia Federal, na condição de testemunhas, na próxima terça-feira, às 15h, no Palácio do Planalto.
Celso de Mello afirmou que os depoimentos deveriam ser marcados em locais e horários a serem definidos pelos ministros em tratativas com a Justiça, já que eles têm a prerrogativa de não serem ouvidos dentro da unidade policial, em razão dos cargos que ocupam.
No meio militar, causou desconforto o fato de Celso de Mello intimar os integrantes do Executivo para depor, pois todos ocupam cargos de alto escalão das Forças Armadas. A futura cena da Polícia Federal entrando no Planalto é considerada como ponto de tensão em Brasília, mesmo que seja com horário previamente combinado.
Bolsonaro deve depor futuramente, na condição de investigado. Os depoimentos serão confrontados com as declarações de Moro. Com base nas afirmações do ex-juiz, a PGR afirma que o presidente pode ter cometido os crimes de falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administrativa, prevaricação, obstrução de Justiça e corrupção passiva privilegiada. Caso as acusações de Moro não sejam comprovadas, o ex-magistrado pode responder por denunciação criminosa e crime contra a honra.
Além dos ministros, a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) prestará depoimento na próxima semana. Ela deve ir na quarta-feira à Superintendência da PF em Brasília. A parlamentar trocou mensagens com Moro, na tentativa de convencê-lo a permanecer no Ministério da Justiça e aceitar a demissão do delegado Maurício Valeixo, então diretor-geral da corporação. A deputada também vai falar na condição de testemunha.
Na segunda-feira, os investigadores vão colher os depoimentos de Valeixo e de Alexandre Ramagem, diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que Bolsonaro tentou nomear diretor-geral da PF, mas foi impedido por decisão de Alexandre de Moraes, ministro do STF (leia reportagem abaixo). Ricardo Saadi, ex-superintendente da PF no Rio de Janeiro, também será ouvido.
Valeixo atuou na corporação após Bolsonaro assumir o governo. Ele chegou ao cargo por indicação de Moro. Já Ramagem é próximo da família de Bolsonaro e teria conversado com o presidente sobre a troca no comando da corporação. No caso de Saadi, outro citado pelo ex-juiz, os investigadores querem saber se ele sofreu algum tipo de pressão por parte do governo e se tem informações adicionais que possam colaborar com as autoridades.
Os delegados serão ouvidos pelo Serviço de Inquéritos Especiais (Sinq), grupo da PF responsável por inquéritos em andamento no STF. Na quarta-feira também está prevista a coleta dos depoimentos de mais três delegados: Carlos Henrique de Oliveira Souza, Alexandre da Silva Saraiva e Rodrigo de Melo Teixeira.
Celso de Mello determinou que “incida em caráter temporário a nota de sigilo sobre o HD externo encaminhado a esta Corte, no dia de hoje (ontem), pelo senhor advogado-geral da União, mediante petição protocolada sob o nº 29.860/2020”. “Esse sigilo, que tem caráter pontual e temporário (…), será, por mim, levantado em momento oportuno.”
Um dos pontos “sensíveis” no vídeo seriam ofensas que o presidente Jair Bolsonaro teria feito à China. Outro trecho polêmico envolveria o ministro da Educação, Abraham Weintraub, que teria chamado os ministros do Supremo de “11 filhos da p.”
Veja quando testemunhas serão ouvidas pela PF
Segunda-feira
» Maurício Valeixo, ex-diretor da PF
» Alexandre Ramagem, diretor da Abin
» Ricardo Saadi, ex-superintendente da PF no Rio de Janeiro
Terça-feira
» Augusto Heleno, ministro do GSI
» Walter Braga Netto, ministro da Casa Civil
» Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo
Quarta-feira
» Carlos Henrique de Oliveira Souza, delegado da PF
» Alexandre da Silva Saraiva, delegado da PF
» Rodrigo de Melo Teixeira, delegado da PF
» Carla Zambelli, deputada