Tabata critica convocação do MEC para Enem
Foto: Gabriela Biló/Estadão
Representante da nova geração de parlamentares, a deputada Tabata Amaral (PDT-SP) defende a substituição do debate em redes sociais por respostas mais enérgicas do Congresso e da Justiça ao presidente Jair Bolsonaro. “Não podemos mais nos contentar em responder com notinhas nas redes sociais. Tanto Judiciário quanto Legislativo têm instrumentos para investigar cada uma das acusações”, disse ela em entrevista ao Estadão/Broadcast Político.
Bolsonaro tem sido acusado de incentivar manifestações antidemocráticas, estimular aglomerações durante a pandemia de coronavírus e de interferência na Polícia Federal. Tabata afirma que essas atitudes incentivam ataques nas redes sociais. “A escalada da violência vai atrapalhar ainda mais o processo de renovação na política”, afirmou.
A parlamentar, que tem sido uma das principais críticas da gestão do ministro Abraham Weintraub na Educação, chamou de “piada de mau gosto” o vídeo produzido pelo MEC para promover o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), previsto para novembro. Na peça publicitária, jovens sugerem que a pandemia não pode impedir que os estudantes se preparem para a prova. “Tem um desconhecimento absurdo da realidade brasileira”, afirmou. Ela disse que vai lutar pelo adiamento.
Você tem pedido um basta às notas de repúdio, divulgadas pela internet. Para quem é esse recado?
É um recado para todo mundo, especialmente para aquelas pessoas que estão em posição de fazer alguma coisa a respeito de todo o absurdo que estamos vendo. Também falo aos meus colegas parlamentares. Estamos lidando com uma série de batalhas ao mesmo tempo. É crise em cima de crise. Enquanto a população já está angustiada e com medo, gente perdendo emprego, a fome batendo à porta, vemos o tanto de absurdo que o Bolsonaro faz todos os dias, vemos acusações gravíssimas feitas pelo ex-ministro Sérgio Moro. Não podemos só nos contentar com escrever uma notinha e colocar nas redes sociais. Tanto Judiciário quanto o Legislativo têm instrumentos para investigar cada uma das acusações.
O que tem barrado a abertura de CPIs para investigar Bolsonaro no Congresso?
A primeira batalha é o número de assinaturas. Nenhum dos pedidos atingiu o número necessário ainda. É isso que me incomoda. Eu não entendo o que segura alguém de querer investigar as acusações que foram trazidas. Sempre vou defender o direito da pessoa de se defender, de mostrar provas contrárias. Mas não podemos ficar trabalhando, nenhum dos lados que se colocam na polarização, em cima de acusações.
Você defende a abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro? A aproximação do presidente com o Centrão pode impedir isso?
Bolsonaro fez a campanha de uma forma completamente oportunista, falando que ele era a favor do combate à corrupção. Mas quando ele faz isso (aproximação com o Centrão) de uma forma tão escrachada, trazendo pessoas envolvidas no mensalão para trabalhar junto com ele. Estamos vendo uma série de nomeações. Esses cargos estão sendo loteados para esses novos parceiros. Mais uma vez uma parte da população acreditou em um político que se diz contra corrupção e que na prática não faz nada diferente de tudo aquilo que ele criticou. Sobre impeachment, qual é a minha preocupação nesse momento? A gente passou, quatro anos atrás, por um processo de impeachment movido por razões políticas e com várias falhas no meio do processo. Mais do que nunca, temos de investigar primeiro. Não acho que é um momento de um pedido de impeachment movido puramente por razões políticas sem nenhuma prova. Se comprovarmos alguma das acusações que foram feitas, teremos ali uma amplitude de crimes de responsabilidade pra escolher.
Bolsonaro é um revés para esses movimentos de renovação política, dos quais você faz parte?
Ele prejudica nossa democracia e essa boa política que lutamos para ser majoritária. Por duas razões, primeiro, muita gente votou no Bolsonaro porque realmente acreditou que ele era diferente e que ele iria combater a corrupção. Essas pessoas vão perder a fé na democracia e na política.
O ministro da Educação tem insistindo em manter as datas do Enem, durante o mês de novembro, apesar da pandemia, e feito publicidade sobre isso. É possível realizar a prova na programação estipulada pelo governo?
De jeito nenhum. Não requer nenhum doutorado para você olhar para o Brasil, ver o quão desigual ele é e entender que os alunos de escolas públicas vão ser muito prejudicados se o Enem for mantido na mesma data. A propaganda que o MEC divulgou é uma grande piada de mau gosto. Tem um desconhecimento absurdo da realidade brasileira. Aqueles estudantes, com quartos nobres, internet, celular moderno, essa não é a realidade do estudante brasileiro. Tem um projeto no Congresso para sustar o calendário do Enem e estamos conseguindo mais apoio. Se eu não conseguir, vou para Justiça. Não tem condições do Enem se manter nessa data.
A aproximação do Centrão com Bolsonaro pode dificultar o avanço desse projeto para alterar o calendário do Enem?
A aproximação do Bolsonaro com o Centrão dificultou muito nosso trabalho na Câmara. Porque agora você tem claramente um grupo que está defendendo o governo por interesses próprios a despeito de toda a população, mas isso não quer dizer que vamos conseguir. Talvez não possamos contar com alguns líderes, mas acho que vamos conseguir.
Você veio da periferia, onde a situação hoje com a pandemia é completamente diferente de outros lugares com mais recursos. O que precisa ser feito?
Tem muita gente que não está conseguindo o auxílio-emergencial, são pessoas elegíveis, mas o aplicativo da Caixa não funciona num celular mais antigo, ou mães solteiras que o ex-companheiro foi lá e falou que tinha a guarda das crianças. Não tem nenhuma fiscalização nesse sentido, tem uma série de problemas e essas pessoas precisam ir pra rua pra conseguir alimento. Mas também estamos vendo pessoas se organizando para chegar em um lugar onde o governo ainda não chegou. A periferia tem muito mais dificuldade de cumprir o isolamento e, mesmo assim, faz um trabalho muito bacana que é obrigação do governo.
Muito tem se falado sobre planos de recuperação da economia no pós-pandemia. Na Educação, a senhora acredita que será necessário algo semelhante?
A gente precisa de um plano para ontem, precisa de um plano não só para o pós, mas para a pandemia também. O problema é que temos um ministro da Educação completamente desconhecedor da realidade do Brasil e que não está fazendo absolutamente nada. Quando falamos agora da pandemia, eu não vi nenhuma iniciativa do MEC de chamar secretários estaduais e municipais para conversar. Após a pandemia, vamos precisar de um novo calendário da Educação e, a partir, daí vamos pode marcar o Enem. Mas como se a gente não existisse um Ministério da Educação. Eu, sinceramente, não sei o que o ministro está fazendo com o seu tempo nesse momento.