Weintraub chamou ministros do STF de “vagabundos”

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Foto: Jorge William/Agência O Globo

Na reunião ministerial do dia 22 de abril, o ministro da Educação, Abraham Weintraub afirmou que, se dependesse dele, colocaria “esses vagabundos todos na cadeia”, começando no STF (Supremo Tribunal Federal).

A fala consta em gravação tornada pública nesta sexta-feira (22) por decisão do ministro Celso de Mello, do Supremo, no âmbito do inquérito que investiga se o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal.

“Eu por mim colocava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF”, disse Weintraub.

Também naquela reunião, Weintraub defendeu “acabar com essa porcaria que é Brasília”. “É muito pior do que eu imaginava. As pessoas aqui perdem a percepção, empatia, a relação com o povo”, afirmou o ministro na ocasião.

Weintraub disse ainda que odeia o termo povos indígenas. “Só tem um povo nesse Brasil, é o povo brasileiro.” Ele defendeu ainda “acabar com esse negócio de povos e privilégios”.

Na decisão, Celso de Mello cita “aparente crime contra a honra dos ministros do STF, supostamente perpetradas pelo ministro da Educação”, Abraham Weintraub.

O decano do Supremo afirma que houve a “absoluta falta de gravitas”, expressão em latim que significa ética ou honra, de alguns participantes da reunião.

“As expressões indecorosas, grosseiras e constrangedoras por eles pronunciadas, ensejou a descoberta fortuita ou casual de aparente crime contra a honra de integrantes do STF”, escreveu Mello.

Na reunião em que fala em prisão de integrantes do Supremo, Bolsonaro saiu em defesa do ministro e criticou o inquérito aberto contra ele pelo ministro Celso de Mello após pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República).

“E eu tenho certeza que vão me condenar por homofobia, oito anos por homofobia. Daí inventam um racismo, como inventaram agora pro Weintraub. Desculpa, desculpa o … o desabafo: puta que o pariu! O Weintraub pode ter falado a maior merda do mundo, mas racista? Vamos ter que reagir pessoal, é outra briga”, disse o chefe do Executivo.

A acusação contra Weintraub ocorreu depois de o ministro insinuar nas redes sociais que a China seria a maior beneficiada pela pandemia do novo coronavírus.

O texto do ministro faz analogia ao personagem Cebolinha, da Turma da Mônica, que, ao falar, troca a letra “R” pela “L”. O ministro ridicularizou o fato de alguns chineses, quando falam português, efetuarem a mesma troca de letras.

“Geopolíticamente [sic], quem podeLá saiL foLtalecido, em teLmos Lelativos, dessa cLise mundial? PodeLia seL o Cebolinha? Quem são os aliados no BLasil do plano infalível do Cebolinha paLa dominaL o mundo? SeLia o Cascão ou há mais amiguinhos?”, escreveu Weintraub.

Procurado pela reportagem para comentar a reunião, o ministro não respondeu.

Em sua decisão desta sexta, Celso de Mello não atendeu aos pedidos do governo e da PGR, que defenderam a publicidade apenas dos trechos do encontro que teriam relação com o inquérito em curso no Supremo.

A investigação aberta a pedido da PGR, e autorizada por Mello, apura a veracidade das acusações do ex-juiz da Lava Jato ao pedir demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Segundo Moro, o presidente o pressionou pela troca da direção-geral e superintendência da PF do Rio de Janeiro com intuito de interferir no trabalho da corporação, o que viola a autonomia da PF prevista em lei.

Ao defender a publicidade parcial da gravação, o órgão que faz a defesa do Executivo transcreveu os trechos que considerava ter conexão com o inquérito.

De acordo a transcrição da AGU, Bolsonaro falou em “interferir na PF” e disse que não iria esperar “f.” alguém de sua família ou amigo dele para poder tomar providências.

Além de ter mencionado nominalmente a corporação na reunião, ao contrário do que havia declarado ao desmentir que teria se referido nominalmente à PF, Bolsonaro classificou como uma “vergonha” não ter acesso a informações de órgãos de inteligência e avisou: “Por isso, vou interferir. Ponto final”.

“Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar f. minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança da ponta de linha que pertence à estrutura. Vai trocar; se não puder trocar, troca o chefe dele; não pode trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira”, disse.

Dois depois dessa reunião, Bolsonaro, de fato, exonerou o diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, o que resultou na saída do ex-ministro Sergio Moro do governo e deu início à disputa entre o chefe do Executivo e seu ex-auxiliar.

Ao pedir demissão, Moro fez duras acusações contra Bolsonaro e disse que iria deixar o governo por não aceitar ingerência política na PF, como desejava o presidente.

Com a saída de Moro e de Valeixo, a primeira medida do novo comando da corporação foi substituir o superintendente do Rio de Janeiro, que, segundo Moro, Bolsonaro já havia pedido para trocar.

“Você tem 27 superintendências, eu só quero uma, a do RJ”, disse o chefe do Executivo ao então ministro, segundo o próprio.

De acordo com a transcrição, o presidente reclama aos auxiliares na reunião que não pode ser “surpreendido com notícias” e faz críticas aos órgãos vinculados à segurança.

“Pô, eu tenho a PF que não me dá informações; eu tenho a inteligência das Forças Armadas que não tem informações; a ABIN tem os seus problemas, tem algumas informações, só não tem mais porque tá faltando realmente… temos problemas… aparelhamento etc. A gente não pode viver sem informação”, disse.

Após afirmar que não recebe informações da PF e de outros órgãos de inteligência, Bolsonaro afirma: “E me desculpe o serviço de informação nosso —todos— é uma vergonha, uma vergonha, que eu não sou informado, e não dá para trabalhar assim, fica difícil. Por isso, vou interferir. Ponto final.”.

Bolsonaro não deixa, claro, segundo a transcrição, ao que se refere quando fala em carência de “aparelhamento” na Abin, mas usa como exemplo do que quer uma metáfora sobre a necessidade, em sua visão, de ouvir “atrás da porta” o que os filhos estão falando.

Folha