Bolsonaro está tendo semana infernal
Foto: SERGIO LIMA VIA GETTY IMAGES
A prisão de Fabrício Queiroz gerou um abalo que ainda não havia sido visto no humor de Jair Bolsonaro pelos corredores do Palácio do Planalto neste ano e meio de governo, segundo fontes palacianas que interagiram com ele nesta quinta-feira (18). Considerado grave no meio político, o episódio veio coroar uma das semanas mais conturbadas da gestão do presidente até o momento. Começou com a prisão de apoiadores, seguida por uma operação contra aliados próximos, passando por quebra de sigilo de outros colaboradores, além de derrotas no Judiciário — mais que desfavoráveis, há ações que podem atingir direta ou indiretamente o mandatário e sua família.
De acordo com interlocutores de Bolsonaro no Planalto, no Congresso e também no Judiciário, com os quais o HuffPost esteve em contato durante a quinta, nem mesmo a demissão de Sergio Moro, em maio, foi capaz de perturbar tanto o presidente. Ontem, Jair Bolsonaro alterou momentos de extrema irritação com certa apatia.
A descoberta de Queiroz foi só o clímax de um dos períodos mais críticos do presidente até o momento. Na segunda-feira (15), foi presa a ativista bolsonarista Sara Winter, principal voz do grupo “300 do Brasil”, que estava acampado na Esplanada dos Ministérios e organizava manifestações a favor do governo e contra o STF (Supremo Tribunal Federal).
A operação da Polícia Federal foi executada no âmbito do inquérito que apura atos antidemocráticos. Foi também por meio dessa investigação que, no dia seguinte, o Ministério Público pediu a quebra do sigilo de 11 parlamentares que apoiam o presidente Jair Bolsonaro. Eles são investigados por suspeita de organização e financiamento dessas manifestações. O Supremo aceitou o pedido e quebrou o sigilo financeiro de 10 deputados federais e um senador.
Também na terça (16), aliados do mandatário foram alvo de busca e apreensão, entre eles, o blogueiro Alan dos Santos e o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), porém, por outro inquérito no âmbito do STF — o das fake news. Pelas redes sociais, o presidente disse que tomará “todas as medidas legais possíveis para proteger a Constituição e a liberdade dos brasileiros”.
Na manhã de quarta (17), em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse que “está chegando a hora de colocar tudo em seu devido lugar”. “Estou fazendo exatamente o que tem que ser feito. Eu não vou ser o primeiro a chutar o pau da barraca. Eles [STF] estão abusando, isso está a olhos vistos. O ocorrido no dia de ontem, quebrar sigilo de parlamentar, não tem história vista numa democracia por mais frágil que seja. Está chegando a hora de colocar tudo em seu devido lugar”, ameaçou.
O pedido de quebra de sigilo dos aliados do presidente pegou de surpresa Bolsonaro. Isso porque partiu da Procuradoria-Geral da República.
O procurador-geral, Augusto Aras, foi indicado pelo mandatário ao cargo fora da lista tríplice e vem demonstrando alinhamento com Bolsonaro. O PGR, porém, tem sido cobrado internamente por seus pares por posturas recentes e, de acordo com interlocutores, decidiu atuar no inquérito dos atos antidemocráticos, que apura os organizadores e patrocinadores das manifestações que pedem fechamento das instituições, retorno da ditadura e reedição do AI-5, um dos golpes mais duros da ditadura militar. Aras, no entanto, mantém sua posição contrária à investigação das fake news.
Os últimos dias foram de muitos recados, que partiram também do STF. A Corte negou ao agora ex-ministro da Educação Abraham Weintraub habeas corpus no inquérito das fake news e terminou de julgar a validade da investigação — o placar foi de 10 a 1 a favor de manter o inquérito, com voto contrário apenas do ministro Marco Aurélio Mello.
A avaliação entre interlocutores, congressistas e até aliados é que “Bolsonaro reconhece que o momento não é bom”. Tanto que, mesmo em sua live semanal no Facebook, na qual ele costuma mandar recados mil e falar no tom elevado que seus eleitores gostam e se acostumaram a ver, o que se percebeu nesta quinta foi um presidente com voz mais baixa, sem exaltações, e num discurso menos agressivo que de costume.
De acordo com políticos ouvidos pelo HuffPost, Bolsonaro “sentiu o baque” e “até ele, com seu jeito de embate, percebeu a necessidade de um momento de reflexão”, nas palavras de pessoas próximas ao mandatário.
A estratégia, que ainda está sendo traçada, porém, não será de silêncio. Todos sabem que isso não faz o tipo do presidente. Assessores palacianos acreditam que, cedo ou tarde, ele vai rebater. Até porque, conforme relatos feitos ao HuffPost, a crença do clã Bolsonaro é de que todo o enredo da semana não passa de “perseguição”.
As investigações sobre as fake news, que podem esbarrar no chamado gabinete do ódio do governo, e sobre os atos antidemocráticos, outro motivo de irritação do presidente esta semana após atingirem aliados próximos, não são os únicos motivos de preocupação.
Uma outra investigação em curso é a que apura a possibilidade de que Bolsonaro tenha interferido politicamente na Polícia Federal em benefício pessoal, como acusou o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro ao deixar o governo.
As diligências estão em curso, a PF pediu mais tempo para apuração e o presidente pode ser ouvido pessoalmente. Ele nega as acusações.
O site do jornal O Globo revelou, porém, que uma das ações realizadas nesta semana contra bolsonaristas, justamente a que foi ordenada pelo MPF, levou 20 dias para ser executada. Isso porque a delegada da PF Denise Dias Rosa Ribeiro solicitou ao STF para adiar ou postegar a ação, ordenada em 27 de maio, alegando “risco desnecessário” à estabilidade das instituições.
Mais uma fonte de atenção é o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Há ao menos 8 ações que pedem a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão em curso na Corte. Semana passada, o primeiro julgamento, de duas delas, foi adiado por um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. Foi no caso que acusa a campanha bolsonarista de atacar um grupo de mulheres no Facebook em benefício da chapa vencedora.
Na próxima terça (23), porém, o tribunal dá início a uma nova análise, desta vez por abuso de poder econômico por colocação irregular de outdoors em pelo menos 33 cidades de 13 estados.
A prisão de Queiroz, porém, revolucionou todo o contexto. A preocupação maior do presidente é que o ex-assessor de seu filho Flávio Bolsonaro faça um acordo de delação com a Polícia Civil do Rio. Como revelou o HuffPost, o presidente chegou a se exaltar e gritar com assessores ao dizer que é preciso “dar um jeito” de que o ex-funcionário “fique calado”.
Fabrício Queiroz afirmou lealdade total a Jair e Flávio Bolsonaro. Contudo, como mostrou a coluna de Lauro Jardim em O Globo, o ex-assessor disse que se manteria em silêncio desde que sua família não fosse envolvida no caso. Na operação realizada na quinta, porém, o Ministério Público do Rio de Janeiro expediu um mandado de prisão contra Márcia, a esposa do amigo dos Bolsonaro. Ela e as duas filhas do casal também trabalharam para Flávio na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
O ex-assessor do primogênito aparentemente tem muito a dizer. No mandado de prisão preventiva decretada pelo juiz Flávio Itabaiana Nicolau, da 27ª Vara Criminal do estado, a justificativa é que o ex-policial militar estaria atrapalhando as investigações da rachadinha.
Mais que um funcionário, Queiroz era amigo pessoal da família Bolsonaro. O ex-policial militar e o mandatário se conheceram quando ainda eram do Exército, no Rio, e seguiram a amizade.