Mandetta acusa Bolsonaro de falta de respeito

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Foto: Reprodução

O ex-ministro da Saúde brasileiro, Luiz Henrique Mandetta, não poupa críticas à gestão de crise do presidente Jair Bolsonaro. Demitido durante a pandemia do coronavírus, Mandetta afirma que a gestão de Bolsonaro choca o mundo por manter o discurso da economia em detrimento às vidas e pela “falta de respeito às vítimas”. Em entrevista à televisão francesa France24, o médico disse que o Ministério da Saúde está “sob ocupação militar”.

Com mais de 50 mil vítimas da Covid-19, o Brasil chama a atenção do mundo por não ter adotado a política de confinamento e manter a população nas ruas com o vírus circulando.

Mandetta estava à frente do ministério da Saúde do governo de Jair Bolsonaro quando a pandemia começou a fechar os países da Europa. Naquele momento, enquanto o ministério da Saúde dava recomendações de isolamento social para a redução do contágio, o presidente brasileiro seguia dizendo que a doença não era grave e estimulava a população a sair para trabalhar.

“O presidente da República claramente optou por dar mais importância para o aspecto econômico que para o aspecto de saúde. Ele caiu em um falso dilema, como se essas coisas pudessem ser tratadas em separado, quando elas estão juntas,” disse Mandetta.

Em 16 de abril de 2020, o médico foi demitido por Bolsonaro. Seu substituto, o também médico de Nelson Teich, ficou no cargo por menos de um mês. Desde 15 de maio, o Brasil não tem um ministro da Saúde, e a pasta é comandada pelo interino general Eduardo Pazuello.

Para Mandetta, não existe mais um ministério da Saúde. O médico considera que a pasta está sob tutela militar e não segue nenhuma orientação de saúde.

“Nós, que somos oriundos da saúde, trabalhamos sobre três pilares: proteção incondicional à vida, proteção ao nosso sistema de saúde, o SUS, e uma defesa intransigente da ciência como método principal de tomada de decisões. Lá no Ministério da Saúde tiraram os técnicos de segundo e terceiro escalão, e colocaram no lugar militares seguindo uma norma militar. Nós não temos hoje um Ministério da Saúde, temos uma ocupação militar do Ministério da Saúde.”

Na entrevista, o médico avaliou como um falso dilema o discurso de ter de optar pela saúde ou pela economia.

“Não existe isso de sair forte de uma epidemia. Na história da humanindade, isso não é possível. Se tivéssemos optado pelo cuidado, nossa recuperação econômica seria muito mais precoce, como é demonstrado por qualquer análise econômica que é feita de qualquer tipo de epidemia. É uma questão muito mais pensando em 2022, quando acontecem as eleições.”

O ex-deputado considera que as decisões de Bolsonaro foram tomadas por motivações políticas: “É uma forma de se retirar desse assunto, deixando [o desgaste] para prefeitos e governadores”, considerou.

Ele voltou a criticar o uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19, remédio tratado como milagroso por Bolsonaro, mesmo após a decisão da OMS e de países como Estados Unidos de deixarem de testá-lo. O remédio, usado para malária, oferece riscos cardíacos aos pacientes e não tem efeito provado contra a Covid-19.

“Eles queriam liberar para uso em domicílio, sem monitoramento”, denuncia o médico. “[Bolsonaro] opta pela política em detrimento da ciência”.

Questionado se o político acha que Bolsonaro poderá ser julgado no futuro por sua má gestão da crise sanitária, Mandetta afirmou que o presidente é o único líder mundial a seguir com o discurso inadequado e falta de respeito às vítimas.

“É uma condução [de crise] que choca os outros países porque o mundo optou primeiro por vidas e depois recuperar a economia. E ele vai na contramão e vai falar assim: ‘não, não vamos suspender a economia porque a economia vai ter mais danos do que essa doença’. E acabou sendo o único líder mundial a adotar esta linha. O Trump voltou atrás, Boris Johnson voltou atrás, o presidente do México voltou atrás. Somente o presidente do Brasil permaneceu e permanece até hoje com esse tratamento inadequado, e essa falta de respeito às vítimas”, assinalou.

rfi