Moro acusa PGR de politizar inquérito
Foto: EVARISTO SA / AFP
Uma decisão da Lava-Jato em Brasília alimentou rumores, no meio político, de que o procurador-geral da República, Augusto Aras, estaria agindo de acordo com interesses do presidente Jair Bolsonaro em desgastar a imagem do ex-ministro da Justiça Sergio Moro. A força-tarefa, subordinada ao PGR, desengavetou a negociação de um acordo de delação premiada que pode atingir o advogado Carlos Zucolotto Júnior, amigo do ex-juiz. As tratativas vêm sendo feitas com o advogado Rodrigo Tacla Duran, foragido na Espanha, que afirma ter pago US$ 5 milhões a Zucolotto em troca de vantagens em uma proposta de delação que foi rejeitada pela Lava-Jato de Curitiba em 2016. A própria PGR investigou os relatos do delator e arquivou o caso em 2018, após concluir que não ficou comprovada a prática de crimes.
Em nota divulgada ontem, Moro sugeriu que a decisão da Lava-Jato de Brasília é uma tentativa de atingi-lo para satisfazer os interesses do presidente. “Causa-me perplexidade e indignação que tal investigação, baseada em relato inverídico de suposto lavador profissional de dinheiro tenha sido retomada e a ela dado seguimento pela atual gestão da Procuradoria-Geral da República logo após a minha saída, em 22/04/2020, do governo do presidente Jair Bolsonaro”, escreveu no comunicado.
À tarde, em conferência on-line realizada pela consultoria Arko Advice, Moro voltou ao tema. “Fui surpreendido. Espero que não seja verdade, mas, se for, recebo com estranheza. Não posso fazer uma avaliação de intenção, mas por que reabrir agora, logo depois que eu deixo o governo?”, questionou. “Se for verdade, estou tranquilo de que nada houve de errado na Lava-Jato. Nós é que sofremos muitos ataques de pessoas que, infelizmente, cometeram crimes e foram julgadas por eles.” Segundo Moro, Tacla Duran foi indiciado pela operação, fugiu do país e criou um álibi fraudulento.
A retomada das negociações entre as partes foi noticiada pelo jornal O Globo. Parlamentares ouvidos pelo Correio, que pediram anonimato, avaliam que a medida favorece o interesse de Bolsonaro de tornar Moro inelegível em 2022. Segundo esses congressistas, o presidente teme um possível racha em sua base eleitoral com uma eventual candidatura do ex-ministro. Bolsonaro já havia confidenciado a aliados que sempre percebeu, no agora adversário, uma movimentação política com vistas à próxima eleição presidencial.
O advogado paulista Tacla Duran, que também tem nacionalidade espanhola, era operador financeiro da Odebrecht em contas no exterior e teve seu acordo de delação recusado pela Lava-Jato de Curitiba por suspeita de omissão de atos ilícitos e ocultação de recursos. Essa nova negociação com a PGR se dá no momento em que Moro se tornou adversário de Bolsonaro, após ter pedido demissão, em 24 de abril, acusando o presidente de tentar interferir politicamente na Polícia Federal. As denúncias do ex-juiz estão sendo investigadas em um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF).
A nova negociação entre Duran e PGR tem sido vista até mesmo por membros do Ministério Público Federal como uma possível retaliação de Aras a Moro. Porém, fontes do gabinete do procurador, ouvidas pela reportagem, asseguraram que as tratativas começaram por iniciativa dos advogados do delator, há aproximadamente três meses, portanto, antes das denúncias do ex-juiz contra Bolsonaro. Elas afirmaram, também, que Aras não está envolvido diretamente nas negociações, que são conduzidas pela subprocuradora-geral Lindora Maria Araújo, coordenadora da Lava-Jato em Brasília.
As tratativas avançaram mais recentemente e, no início de maio, foi assinado um termo de confidencialidade para formalizar a fase preliminar das negociações pelo acordo. Fontes próximas a Duran dizem que ele decidiu buscar um acerto com a Lava-Jato em Brasília por acreditar que Aras não está alinhado com os procuradores da força-tarefa de Curitiba.
Acusações reiteradas
Na nova negociação com a PGR, o advogado Rodrigo Tacla Duran reitera relatos: afirma ter pago US$ 5 milhões, sob extorsão, ao advogado Marlus Arns, sócio de Zucolotto. Marlus e Zucolotto são ex-sócios da advogada Rosângela Moro, mulher do ex-ministro da Justiça. Segundo o delator, o objetivo do pagamento foi a obtenção de condições favoráveis na negociação de sua delação com a Lava-Jato em 2016, como a diminuição do valor de sua multa, acordada, inicialmente, em R$ 55 milhões — essa vantagem não se concretizou, uma vez que o acordo foi recusado pela Lava-Jato. Zucolotto é amigo próximo e padrinho de casamento de Moro.