Queiroz tem mesmo advogado de miliciano morto

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Foto: NELSON ALMEIDA / AFP

Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), Fabrício Queiroz era o responsável pelas ligações entre a família Bolsonaro e os milicianos do Rio de Janeiro. Preso na manhã desta quinta-feira, dia 18, pela Polícia Federal na “Operação Anjo”, em Atibaia, interior de São Paulo, Queiroz já está no Rio de Janeiro. Ele era amigo de Adriano da Nóbrega, ex-capitão do Bope, acusado de ser o chefe de um grupo criminoso formado por matadores de aluguel, que ficou conhecido como “Escritório do Crime” — investigado por suspeita de envolvimento nas mortes da ex-vereadora Marielle Franco e Anderson Gomes, em março de 2018. O advogado Paulo Emílio Catta Preta, que defendeu o miliciano, é o mesmo que atua no caso Queiroz agora.

Em entrevista à revista Época, Catta Preta afirmou que começou a atuar no caso Queiroz “a partir de hoje”.

— Mas eu já estou sendo procurado pela família há alguns dias, cerca de uns 15 dias no sentido de eu advogar para ele nessa questão da Alerj. Ele estava sem advogado porque o defensor tinha renunciado já há algum tempo. Eles me perguntaram se eu podia advogar, falei que sim, pedi para estudar os autos e prosseguimos – explicou o advogado. — Posso supor que por eles terem visto a minha atuação no caso do Adriano, eles eram amigos, talvez isso tenha sido um dos motivos de eles terem me procurado. Mas não me foi dito isso.

Nóbrega era réu na “Operação Intocáveis” do Ministério Público do Rio (MP-RJ), que apura a milícia de Rio das Pedras. Ele também era suspeito de se beneficiar financeiramente do esquema de repasses ilegais no gabinete de Flávio Bolsonaro, então deputado estadual, no esquema chamado de “Rachadinha”. Além, disso, foi homenageado pelo então deputado estadual duas vezes na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Conhecido como Capitão Nóbrega, Adriano foi morto em uma troca de tiros com policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Bahia, com apoio do setor de inteligência da Polícia Civil do Rio, no dia 9 de fevereiro deste ano. Apontado como autor de diversos homicídios, o ex-militar era um dos criminosos mais procurados do Rio, inclusive com alerta vermelho da Interpol. Há pouco mais de um ano, Adriano da Nóbrega vinha sendo investigado e monitorado pela inteligência da Secretaria de Polícia Civil, que conseguiu chegar ao paradeiro dele na Bahia.

Por indicação de Queiroz, a mãe e a ex-esposa de Adriano da Nóbrega trabalhavam no gabinete do filho 01 do presidente da República na Alerj. Raimunda Veras Magalhães aparece em relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) como uma das pessoas que fizeram depósitos para o ex-assessor de Flávio Bolsonaro.

A mãe do ex-capitão do Bope, de acordo com o relatório do Coaf, fez 17 depósitos no valor de R$ 4,6 mil cada um na conta de Queiroz. Ela aparecia na folha da Alerj com salário líquido de R$ 5.124,62. A mãe de Adriano estava nos quadros da Alerj desde 2 de março de 2015 e só foi exonerada em 13 de novembro do ano passado.

Já a ex-mulher de Adriano, Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega, também trabalhou no gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj, com o mesmo salário da sogra. Ela estava listada na Assembleia desde novembro de 2010 e foi exonerada junto com Raimunda.

Segundo o advogado Catta Preta, ele foi procurado inicialmente pelas filhas de Queiroz e não sabia onde ele estava.

— Depois, falei com ele ao telefone. Não estive com ele ainda até porque achei que tinha tempo para estudar o processo e, enfim, acho que a medida de hoje abrevia o meu tempo. Fui procurado em Brasília.

De acordo com o advogado, ele precisa ainda ler todos os elementos do caso Queiroz para formar uma opinião.

— Mas, enfim, coisas que já me parecem evidentes é que ele não era procurado pela Justiça. Pelo que eu sei, ele já tinha prestado esclarecimentos por escrito ao MP, li na mídia. Estava disponível, bastava uma intimação. Se a ideia era levá-lo para um depoimento, aí é que a prisão não se justifica mesmo porque a condução coercitiva de quem é investigado pode ser feita. Muito menos uma prisão que seja para ouvi-lo. Tem que se considerar a questão do tratamento dele, da saúde. Sabe? Agravada pelo risco da Covid-19.

A ligação de Queiroz com Nóbrega o aproximou tanto da família Bolsonaro, que o ex-capitão do Bope está na lista de homenageados pelo filho do presidente Jair Bolsonaro, durante o seu mandato como deputado estadual. Ele recebeu uma moção de louvor em 2003 e a medalha Tiradentes em 2005, considerada a maior honraria do Legislativo fluminense, a mesma concedida a Marielle Franco postumamente. As honrarias ao Capitão Nóbrega foram indicadas por Flávio Bolsonaro. Nóbrega foi expulso da polícia por envolvimento com máfia do jogo do bicho no Rio.

Queiroz tenta explicar desde o fim de 2018 uma “movimentação atípica” de R$ 1,2 milhão, no intervalo de um ano, em suas contas, ponto inicial da investigação do Ministério Público (RJ) que apura a prática de “rachadinha” na Alerj, onde Queiroz trabalhou como assessor do então deputado Flávio Bolsonaro como chefe de segurança.

Ele esteve no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio entre 2007 e 2018 e, no período, emplacou sete parentes na estrutura. Além dele, também foram lotados outros sete parentes dele no gabinete de Flávio desde 2007. Entre os parentes de Queiroz investigados junto com ele, estão a mulher, a enteada e duas filhas, uma delas é a Nahtalia Queiroz, conhecida por ser personal trainer.

De lá pra cá, as investigações avançaram e a suspeita de que assessores devolviam parte de seus salários para o parlamentar aumentou. Ao menos 102 assessores que trabalharam para família Bolsonaro tem algum parentesco ou relação familiar entre si. Um ano depois de virem à tona, as movimentações financeiras aumentaram em volume e número de envolvidos.

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) detectou uma movimentação de R$ 7 milhões, entre os anos de 2014 e 2017, valor muito superior à renda de Queiroz. Segundo admite o próprio presidente, R$ 40 mil desse valor foi repassado para a primeira-dama, Michelle Bolsonaro. O presidente alega que foi o pagamento de um empréstimo.

Outro montante teria sido destinado ao próprio Flávio Bolsonaro. Após o caso virar um grande escândalo midiático, Queiroz se escondeu no Rio das Pedras, Zona Oeste do Rio de Janeiro, a mesma região onde atuavam os milicianos presos na operação intocáveis, Ronald Pereira e Adriano Nóbrega, suspeitos no envolvimento na morte de Marielle Franco. Após o “desaparecimento”, ele foi preso em um sítio em Atibaia, no interior de São Paulo, que pertence ao advogado de Flávio, Frederick Wassef, chamado de “Anjo” pelo clã bolsonarista na intimidade.

O Globo