Anvisa proibe venda livre de vermífugo bolsonarista

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Reprodução

Uma norma da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que classificou o vermífugo ivermectina como remédio controlado motivou desinformação nas redes sociais. Postagens no Facebook que questionam a decisão da Anvisa afirmam que o fármaco é uma opção barata para combater a covid-19; no entanto, não há comprovação científica de sua eficácia.

Os posts insinuam ainda que a norma da agência teria motivação política — a Anvisa, no entanto, justificou a medida como uma forma de evitar a “compra indiscriminada” de medicamentos divulgados como possíveis tratamentos para o novo coronavírus. Como esses remédios são usados no combate a outras doenças, é necessário garantir o estoque para outros pacientes.

O Estadão Verifica checa postagens virais sobre a pandemia do novo coronavírus que possam espalhar desinformação. Este tipo de conteúdo gera descrença em órgãos oficiais de saúde e pode levar as pessoas a não respeitarem medidas recomendadas por autoridades sanitárias, necessárias para o combate da pandemia. As duas publicações verificadas foram compartilhadas mais de 2,1 mil vezes em 24h.

A Anvisa publicou a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 405/2020 na última quinta-feira, 23, na qual estabelece regras de controle específicas para a prescrição, a dispensação e a escrituração de cloroquina, hidroxicloroquina, nitazoxanida e ivermectina. A partir de agora, a compra desses produtos em farmácias só é permitida com a apresentação de receita médica em duas vias — uma delas fica retida na loja. Cada receita tem validade de 30 dias e pode ser usada apenas uma vez.

Segundo a Anvisa, a medida visa “coibir a compra indiscriminada de medicamentos que têm sido amplamente divulgados como potencialmente benéficos no combate à infecção humana pelo novo coronavírus (SARS-CoV-2), embora ainda não existam estudos conclusivos sobre o uso desses fármacos para o tratamento da covid-19”. O Estadão Verifica já checou postagens que exageravam os benefícios de todos os remédios citados pela Anvia.

Outra intenção da norma é garantir o estoque dos medicamentos para quem precisa deles para outras doenças. A hidroxicloroquina é um fármaco há muito tempo utilizado para tratar malária, lúpus e artrite reumatóide. Desde que ela foi defendida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como possível tratamento da covid-19, pessoas com estas enfermidades passaram a relatar dificuldade em encontrá-la nas farmácias.

Por isso, hidroxicloroquina, cloroquina e nitazoxanida já haviam sido incluídas na lista de controle da Portaria 344/1998. Agora, elas foram retiradas dessa primeira listagem e foram inseridas na RDC 405/2020, juntamente com a ivermectina.

O Conselho Federal de Farmácia (CFF) considera as restrições benéficas. “Elas exigem o acesso mediante um acompanhamento mais criterioso”, disse a assessoria de comunicação por e-mail. A entidade fez um levantamento sobre a alta dos medicamentos nos primeiros meses deste ano em comparação com o ano anterior:

Hidroxicloroquina: aumento de 58%

Ivermectina: aumento de 128,9%

Nitazoxanida: aumento de 16,2%

A ivermectina é um medicamento usado contra parasitoses como piolho e sarna. Sua possível aplicação no tratamento da covid-19 foi inicialmente impulsionado por uma pesquisa da universidade australiana Monash University, que detectou a eliminação de 100% do coronavírus em laboratório em 48h. A universidade, no entanto, avisou expressamente que seu uso no tratamento da covid-19 continuava sem comprovação, uma vez que ainda seriam necessários estudos em seres humanos.

Não é raro que substâncias eliminem o vírus em testes de laboratório, mas isso não prova sua eficácia in vivo — isto é, nos seres humanos. “In vivo, (a ivermectina) não tem nenhuma eficácia contra o coronavírus. A gente não dispõe de nenhum dado conclusivo”, diz Jamal Suleiman, infectologista do Instituto Emílio Ribas.

A Anvisa já havia emitido comunicado no qual lembra que não há estudos comprovando a eficácia da ivermectina no tratamento da covid-19.

Este boato foi checado por aparecer entre os principais conteúdos suspeitos que circulam no Facebook. O Estadão Verifica tem acesso a uma lista de postagens potencialmente falsas e a dados sobre sua viralização em razão de uma parceria com a rede social. Quando nossas verificações constatam que uma informação é enganosa, o Facebook reduz o alcance de sua circulação. Usuários da rede social e administradores de páginas recebem notificações se tiverem publicado ou compartilhado postagens marcadas como falsas. Um aviso também é enviado a quem quiser postar um conteúdo que tiver sido sinalizado como inverídico anteriormente.

Um pré-requisito para participar da parceria com o Facebook é obter certificação da International Fact Checking Network (IFCN), o que, no caso do Estadão Verifica, ocorreu em janeiro de 2019. A associação internacional de verificadores de fatos exige das entidades certificadas que assinem um código de princípios e assumam compromissos em cinco áreas: apartidarismo e imparcialidade; transparência das fontes; transparência do financiamento e organização; transparência da metodologia; e política de correções aberta e honesta. O comprometimento com essas práticas promove mais equilíbrio e precisão no trabalho.

Estadão