Bolsonaro se afasta de radicais por pressão do Centrão

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Foto: Marcos Correa/PR

No esforço para a consolidação da base governista no Congresso, o presidente Jair Bolsonaro dá sinais de que se afasta da ala mais radical dos seus apoiadores no Legislativo. Esse movimento ficou claro, na quarta-feira (22/7) à noite, quando uma edição extra do Diário Oficial da União (DOU) publicou a retirada da deputada Bia Kicis (PSL-DF), fiel defensora do presidente, da vice-liderança do governo. E sem qualquer aviso pelo Palácio do Planalto.

A surpresa foi geral, inclusive dela. A destituição pode prenunciar mais mudanças, que alcançariam o líder do governo, major Vitor Hugo (PSL-GO), na função desde janeiro do ano passado. Ao longo da última quinta-feira (23/7), o nome do deputado Ricardo Barros (PP-PR) voltou a circular como cotado para assumir o comando da base. Ao Correio, o parlamentar paranaense negou. “Não há conversas. O Vitor Hugo é o líder, o cargo está ocupado. É especulação”, garantiu.

Mas, o nome é, sim, falado e ouvido entre parlamentares. O major é reconhecido como alguém de diálogo, é benquisto pelos colegas, avaliado como uma pessoa educada e tem o inegável apreço do presidente. No entanto, o Planalto estaria buscando alguém com mais trânsito na Câmara legislativa; alguém que articule bem nos bastidores. E o major não seria esta pessoa.

Barros, por sua vez, foi ministro da Saúde no governo Temer e tem quilometragem no Congresso, onde está desde 1995. Apesar de a eventual troca na liderança aumentar o cacife do Centrão, um líder de partido que integra o grupo foi enfático ao dizer que não haveria interesse do PP em indicá-lo para a liderança. “Se for, vai ser uma decisão do próprio presidente mesmo”, assegurou, sob condição de anonimato.

E esta decisão passa pela recente aproximação do governo com os partidos que integram esse bloco, ação que começou com a chegada dos pedidos de impeachment. O Planalto percebeu sua ausência de governabilidade e continua buscando melhorar a base para aprovar propostas. Ontem, em transmissão ao vivo pelas redes sociais, o presidente brincou com estas especulações de mudança. “Agora há pouco fiquei sabendo que ele (major Vitor Hugo) tinha sido demitido da liderança. É isso mesmo, major? Tu veio aqui me cobrar alguma coisa?”, disse ao líder, que estava na sala.

A remoção de Bia Kicis é apenas mais um movimento de afastamento das alas radicais e aproximação com grupos que agreguem em favor do governo. Antes dela, no início deste mês, os deputados Daniel Silveira (PSL-RJ) e Otoni de Paula (PSC-RJ) também deixaram a vice-liderança. Não por acaso, os três são investigados no inquérito sobre o financiamento e organização de atos antidemocráticos. Bia e Daniel ainda estão no inquérito das fake news, no Supremo Tribunal Federal (STF).

Diferentemente dos bolsonaristas, o apoio do Centrão não é irrestrito. A votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) foi um termômetro disso. O governo queria um fundo só em 2022, deixando 2021 sem os recursos, mas os deputados, inclusive do Centrão, não cederam. Só votaram contrariamente cinco parlamentares, todos da ala radical — Bia Kicis incluída. Ela perdeu o cargo de vice-líder um dia depois de votar contra a orientação do governo.

Um parlamentar próximo do presidente disse, reservadamente, ao Correio, que “o grupo mais radical não vai prosperar até o fim do governo”. “O governo tem que chegar em um equilíbrio, reduzir a fervura”, pontuou, afirmando que os que saíram de papéis de destaque não necessariamente deixarão de apoiar Bolsonaro. Mas, como resumiu este deputado, o governo “precisa de vice-líderes que construam pontes, e não destruam”. “Tem que fugir do confronto”, acrescentou.

E é exatamente isso que o governo tem buscado fazer nessas mudanças que agora alcançam com mais força o Congresso Nacional. Outro deputado do Centrão, que pediu para não ser identificado, salientou que o núcleo ideológico perderá espaço, pois o Planalto se convenceu de que deve ser “pragmático” nas relações dentro do Congresso.

Correio Braziliense