Facebook pode complicar muito a vida dos Bolsonaros
Foto: Johanna Geron / Reuters
A iniciativa do Facebook de excluir, na última quarta-feira, 88 páginas e contas de usuários ligadas a assessores da família Bolsonaro e de deputados do PSL pode ter consequências que extrapolam o ambiente das redes sociais. Desde que assumiu o governo, em janeiro do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro e seus filhos estão atentos a três frentes de apuração envolvendo o Judiciário que os interessam: o caso da “rachadinha” envolvendo Fabrício Queiroz e o senador Flávio Bolsonaro; as oito ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que podem levar à cassação da chapa Bolsonaro e Hamilton Mourão; e o inquérito das fake news, tocado pelo ministro Alexandre de Moraes no Supremo Tribunal Federal (STF).
=No caso da rachadinha, se algum dia Bolsonaro fosse implicado no caso (hoje ele sequer é investigado), não haveria com o que se preocupar até 2022, quando o mandato chegará ao fim. Por ser presidente, ele não pode ser julgado por fatos que ocorreram antes de assumir o cargo.
Nos outros casos, contudo, há riscos de desdobramentos concretos para o presidente, sobretudo após a ação do Facebook. Entenda os motivos:
=Das oito ações de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão que tramitam no TSE, quatro tratam de suposto uso de notícias falsas na campanha.
Essas ações investigam se a chapa vitoriosa foi beneficiada pela contratação de empresas de disparos de mensagens de WhatsApp em massa par atacar candidatos adversários e promover Bolsonaro.
Há uma tentativa do Partido dos Trabalhadores (PT) de que essas ações do TSE passem a considerar provas colhidas pelo Supremo no chamado “inquérito das fake news”. A sigla acredita que as informações podem ajudar a desvelar a existência da estrutura chamada de “Gabinete do Ódio”, um grupo dedicado a disseminar notícias falsas e ataques ofensivos a pessoas comuns, autoridades e instituições. Segundo depoimento prestado por um deputado federal cujo nome é mantido em sigilo, o grupo teria, entre seus principais integrantes, assessores especiais da Presidência da República.
Em maio, aliados e apoiadores de Bolsonaro tiveram equipamentos apreendidos pela Polícia Federal (PF) no inquérito que apura ataques e ofensas ao STF. Em junho, o mesmo procedimento foi adotado, também contra apoiadores do presidente.
O PSOL já pediu que o ministro Alexandre de Moraes inclua no inquérito as medidas tomadas pelo Facebook.
A investigação mira organizadores de manifestações antidemocráticas nas ruas, mas também na internet. Nesse inquérito, já foram presos apoiadores do presidente Bolsonaro, como a extremista Sara Giromini e o blogueiro Oswaldo Eustáquio.
O grupo ao qual Sara pertence soltou fogos de artifício em direção ao STF, em junho, além de ter divulgado na internet vídeos atacando a Corte e outras instituições da República. A investigação também apura quem divulgou os atos.
Nos dois inquéritos, apesar de serem alvos assessores próximos de Bolsonaro, não há comprovação de que os ataques eram comandados de dentro do Palácio do Planalto. Caso isso aconteça, a situação de Bolsonaro pode ficar mais complicada no TSE, já que as provas desses inquéritos podem ser compartilhadas com as açõesda corte eleitoral.
O acesso aos dados da apuração do Facebook também pode trazer novos elementos sobre conexão de personagens e indicar se houve uso de estrutura do Planalto para continuar disseminando informações através da plataforma. Ainda pode ser possível identificar se o assessor de Bolsonaro citado no relatório da rede social, Tércio Arnaud Thomaz, disparava mensagens a partir de seu gabinete na Presidência da República.
Na explicação para a remoção das 88 páginas e contas de usuário, o Facebook afirmou que a rede bolsonarista utilizou perfis “inautênticos” e com comportamento “coordenado”.
Para a plataforma, o fato de as contas ocultarem seus verdadeiros administradores para propagar conteúdos políticos feriu as regras de uso do serviço, uma vez que o público foi privado de compreender quem eram as pessoas que estavam transmitindo as mensagens a favor de Bolsonaro e contrárias aos opositores dele.
Também houve registro de utilização de contas duplicadas: mesmo quando elas continham a identificação do usuário, eram criadas múltiplas vezes, de diversas maneiras diferentes, passando a sensação de um discurso amplificado. Um dos casos envolvia uma única pessoa comandando sete perfis diferentes. Ainda chamou a atenção da plataforma a frequência com que as mesmas mensagens eram compartilhadas pelas páginas e contas, mostrando a existência de um esforço coordenado.