Witzel barrou criação de órgão contra corrupção
Foto: Wilton Junior/Estadão Conteúdo
O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), engavetou um projeto de lei elaborado pela Controladoria Geral do Estado que tinha como objetivo reforçar o combate à corrupção.
A mensagem que seria enviada à Assembleia Legislativa chegou a ser assinada pelo governador em setembro do ano passado, mas nunca foi enviada ao Legislativo fluminense.
O projeto previa a criação da Subcontroladoria de Integridade e Combate à Corrupção, inspirada na Secretaria de Combate à Corrupção da CGU (Controladoria Geral da União).
O órgão teria entre suas atribuições definir procedimentos para celebração de acordos de leniência, ações de inteligência, promoção de integridade e implementação de políticas públicas voltadas à prevenção da corrupção.
A proposta para a criação da subcontroladoria foi do ex-secretário Bernardo Barbosa, delegado federal que chefiava a CGE até janeiro. Ela foi apresentada em março de 2019 à gestão Witzel, tendo o projeto de lei sido debatido internamente até setembro.
O fortalecimento da CGE era uma das bandeiras de Witzel no combate à corrupção. No ano passado, a pasta instaurou cinco processos administrativos de responsabilização contra empresas identificadas em fraudes contra o estado. As ações da controladoria resultaram numa redução de R$ 1,5 bilhão em contratos do estado, segundo dados do governo.
A CGE também municiou investigações da Polícia Civil. Na primeira delas, foram presos um amigo e um ex-funcionário do vice-governador Cláudio Castro (PSC), o que provocou desgaste interno de Barbosa.
O governo disse, em nota, que criou estruturas na CGE para o combate à corrupção. A proposta de Barbosa, porém, previa justamente alterar o formato a que se refere o posicionamento do Palácio Guanabara.
Investigado sob suspeita de fraudes em contratações emergenciais para o combate da pandemia do novo coronavírus, Witzel é também alvo de processo de impeachment. O desembargador Elton Leme negou nesta quarta-feira (15) liminar pedida pelo governador para suspender a tramitação do processo na Assembleia.
O ex-secretário Bernardo Barbosa descrevia as alterações no órgão como um aperfeiçoamento da controladoria e seus procedimentos. Além da criação da subpasta, o projeto de lei ampliava a integração da CGE com a Polícia Civil e outros órgãos de investigação penal. Ele também agilizava a avocação de processos administrativos que tramitavam nas secretarias para apuração de irregularidades.
Esta última medida poderia acelerar, por exemplo, a identificação de irregularidades cometidas nas compras emergenciais para o combate à pandemia do novo coronavírus. A Secretaria de Saúde mantinha em sua controladoria interna um servidor ligado ao ex-secretário Edmar Santos, sem participação da CGE.
Apenas no fim de maio, um mês após a divulgação de irregularidades nas aquisições sem licitação e a prisão do ex-subsecretário Gabriell Neves, a pasta integrou em seus quadros dois auditores da CGE para avaliar os processos em tempo real.
Eleito com um discurso de intolerância à corrupção, Witzel é alvo de uma investigação da Procuradoria-Geral da República sob suspeita de fraudes na contratação de organização social para montagem e gestão dos hospitais de campanha para o enfrentamento da pandemia.
A PGR também investiga a relação entre o governador e seu entorno próximo com o empresário Mário Peixoto, preso em desdobramento da Lava Jato no Rio de Janeiro.
A Assembleia Legislativa instaurou processo de impeachment contra o governador em razão das suspeitas, bem como a recomendação de reprovação das contas de 2019 sugerida pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado).
Barbosa deixou o cargo no início do ano após o Ministério da Justiça, sob a gestão de Sérgio Moro, determinar o fim da cessão de delegados a órgãos estaduais. O novo secretário, o advogado Hormindo Bicudo, era assessor especial de Witzel e um dos primeiros incentivadores da campanha do governador.
Witzel também ainda não se movimentou para implementar uma de suas bandeiras de campanha no setor, o teste de integridade para flagrar e demitir funcionários públicos corruptos. Barbosa pretendia enviar um projeto de lei para regulamentar a prática até o fim do ano passado, o que não ocorreu.
O objetivo do ex-secretário era tirar dos quadros do poder público servidores flagrados em atos criminosos pelo teste. A vedação ao compartilhamento da prova para fins criminais ficaria expressa no projeto de lei, já que súmula do STF (Supremo Tribunal Federal) proíbe o flagrante preparado de um crime.
Bicudo, em entrevista ao jornal Extra, afirmou que reformularia a proposta, focando a ferramenta na verificação da qualidade do serviço público, em vez da tentativa de identificar atos de corrupção.
O teste de integridade fez parte das Dez Medidas de Combate à Corrupção propostas pelo Ministério Público Federal em 2016. Ele prevê o uso de agentes para flagrar ou até mesmo estimular um ato ilícito —como o oferecimento de propina— de funcionários públicos, a fim de identificar aqueles que seriam suscetíveis a cometer um crime.
Em nota, a gestão Witzel afirmou que determinou a criação das superintendências de Integridade e de Combate à Corrupção.
“As estruturas, incorporadas à Controladoria Geral do Estado do Rio de Janeiro (CGE-RJ), sem aumento de despesas, têm papel semelhante ao do Projeto de Lei que seria enviado à Alerj, incluindo atividades de integridades pública e privada e acordos de leniência, que acontecem em conjunto com a Procuradoria Geral do Estado (PGE)”, diz a nota.
O decreto que criou as superintendências é de fevereiro de 2019. A necessidade de alteração foi apontada por Barbosa em março. O governo não explicou porque o projeto de lei assinado em setembro de 2019 não foi enviado.
A assessoria de imprensa do governador também afirmou que a CGE criou um ouvidoria para o combate à corrupção e o Disque Rio Contra a Corrupção que já recebeu 1,5 mil denúncias de tentativa de suborno, fraudes em licitações estaduais, nomeação de funcionários fantasmas e desvio de dinheiro público.
Em relação ao teste de integridade, a administração estadual disse que “optou, temporariamente, por não adotar o teste de integridade, já que a CGE conta com o Programa de Integridade, criado por meio do decreto n° 46.745, em agosto do ano passado”.
“O programa prevê a reeducação da conduta do servidor em sua função e em sua relação com a sociedade no cumprimento de suas tarefas”, disse o governo fluminense.