Comissão Arns vê afronta do MJ contra STF
Foto: Isac Nóbrega/PR – 27.fev.2019
A Comissão Arns de Direitos Humanos classificou como uma “afronta” ao Supremo Tribunal Federal (STF) as explicações do Ministério da Justiça sobre a suposta produção de dossiês contra opositores do governo Jair Bolsonaro. “A resposta do Ministério da Justiça é absolutamente insuficiente e constitui uma afronta à autoridade do Supremo”, afirmou ao Valor o advogado Oscar Vilhena, integrante e fundador da comissão.
A entidade, que reúne 20 juristas, acadêmicos, jornalistas e militantes sociais em prol dos direitos humanos, emitiu ontem à noite nota sobre o caso dos dossiês. De acordo com reportagem publicada na semana passada no portal “UOL”, a Secretaria de Operações Integradas (Seopi), vinculada ao Ministério da Justiça, vinha investigando e fichando professores universitários e servidores federais e estaduais de segurança identificados como integrantes do “movimento antifascismo”.
Segundo Vilhena, o Ministério da Justiça tenta argumentar que os dados seriam sigilosos, para não compartilhá-los com o STF. “Não há segredo a que o Supremo Tribunal Federal não possa ter acesso”, afirmo. “O ministro da Justiça poderia, por exemplo, pedir que as informações prestadas fossem mantidas em sigilo, mas não poderia se negar a fornecê-las.”
Outra justificativa do governo federal confrontada pelos integrantes da Comissão Arns é a indicação, por parte do ministro André Mendonça, de que caberia exclusivamente ao Congresso analisar o caso, e não ao Judiciário. Vilhena explica que o Legislativo “pode e deve” tomar atitudes para aferir a integridade da política brasileira de inteligência, mas que, em caso de suspeita de violação de direitos por parte dessa política de inteligência, quem age é o Judiciário.
“O artigo 5, inciso 35, da Constituição Federal deixa claro que não há exceções. Qualquer lesão ou ameaça a direitos deve ser analisada pelo Judiciário”, diz Vilhena.
Na hipótese de que se confirmem os dossiês, os cerca de 570 acadêmicos e servidores terão sido vítimas de ataques a seus direitos de liberdade de expressão, associação e privacidade. De acordo com reportagem do “UOL”, os documentos do Ministério da Justiça reúnem fotos e dados de redes sociais das vítimas.
A Comissão Arns informa em nota esperar da ministra Cármen Lúcia, do STF, relatora da ação, “medidas enérgicas” para obter as informações completas do Ministério da Justiça. “Quem tem de julgar se direitos foram violados ou não é o Supremo, não o Ministério da Justiça”, afirma Oscar Vilhena.
A entidade estuda maneiras de reforçar a pressão pela elucidação do episódio. Entre as alternativas em análise estão o uso da Lei de Acesso à Informação e de um “habeas data”, mecanismo por meio do qual uma pessoa ou empresa pleiteia obter informações sobre si que constem em registros e bancos de dados governamentais.
“A Comissão Arns acompanha com extrema preocupação o caso e tomará todas as medidas cabíveis, no plano nacional e internacional, para o esclarecimento dos fatos e a obtenção do famigerado dossiê”, informa em nota. Integram o grupo, presidido pelo advogado criminalista José Carlos Dias, os ex-ministros José Gregori e Luiz Carlos Bresser-Pereira e os professores eméritos de Direito da Universidade de São Paulo Dalmo Dallari e Fábio Konder Comparato.