Justiça libera saque total do FGTS

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Foto: FLÁVIO TAVARES/HOJE EM DIA/ESTADÃO CONTEÚDO

Trabalhadores e desempregados têm usado a pandemia do novo coronavírus, que já deixou mais de 109 mil mortos em todo o país, como argumento para sacar – com sucesso, em vários casos – todo o dinheiro do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Na prática, o resgate do FGTS é bem limitado, o que gera críticas de espacialistas, uma vez que o dinheiro é, afinal, do trabalhador. A legislação permite o saque em casos de demissão sem justa causa ou para quem se aposentou, por exemplo – conheça 10 situações nas quais é possível fazer o resgate do dinheiro do FGTS.

Além disso, o governo permitiu, por causa da pandemia, o saque emergencial do FGTS de até R$ 1.045. Também é possível ter acesso ao dinheiro via saque-aniversário, igualmente limitado, pois a pessoa terá de abrir mão de parte do resgate caso seja demitido.

No entanto, brasileiros têm conquistado na Justiça o direito de acessar até todo o Fundo de Garantia com base no Decreto nº 5.113/2004, que permite o resgate caso o governo federal determine estado de calamidade pública em razão de desastre natural.

A lei diz o seguinte: “O titular de conta vinculada do FGTS que resida em área em situação de emergência ou estado de calamidade pública, poderá movimentar a referida conta por motivo de necessidade pessoal, cuja urgência e gravidade decorram de desastre natural”.

Utilizando e adaptando essa disposição legal, uma vez que o governo federal decretou estado de calamidade pública em 20 de março, que vigora pelo menos até 31 de dezembro, muitos trabalhadores e desempregados que comprovem necessidade estão conseguindo acesso ao FGTS. Embora não exista um registro formal de quantas causas do tipo já foram vencidas no país, advogados assinalam o crescimento dessas ações.

“Até o fim deste ano, todo o país está em estado de calamidade pública. Com essa decretação, mais o estado de necessidade da própria pessoa, a Justiça entende que o autor da ação pode sacar”, explica o advogado trabalhista Peterson Vilela, do escritório L.O. Baptista Advogados.

De acordo com o artigo 4 da lei que autoriza o resgate do FGTS em caso de calamidade pública, o “valor do saque será equivalente ao saldo existente na conta vinculada, na data da solicitação, limitado à quantia correspondente a R$ 6.220”. No entanto, juízes têm autorizado o saque de todo o Fundo de Garantia.

Isso aconteceu, por exemplo, com o desempregado Rosenildo Cunha da Silva. Ele ganhou uma causa no Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (TRT-11), na vara de Manaus (AM), e conseguiu sacar todo o dinheiro do Fundo de Garantia.

No recurso, ele assegura que possui filhos menores e que, por isso, precisa sustentar a família e pagar aluguel. Ele contou também ter sido dispensado por justa causa, o que o impede de ter acesso, além do FGTS, ao seguro-desemprego.

“Desde logo, ressalto que a liberação do saldo de FGTS por meio de decisão liminar, em tempos normais, encontraria óbice na modalidade da dispensa, haja vista que a justa causa imputada ao empregado impede o saque imediato do FGTS”, esclareceu o tribunal.

“Entretanto, nas circunstâncias atuais, o quadro é diverso”, completou o juiz trabalhista Julio Bandeira de Melo Arce, ao considerar que a pandemia é um “desastre natural de proporções globais”, apesar de a legislação falar apenas em chuvas ou inundações.

“Por todo o exposto, concedo a tutela de urgência postulada determinando a expedição de alvará judicial para saque integral do saldo de FGTS depositado na conta vinculada do reclamante”, prosseguiu.

Nesse caso, o juiz reconheceu, na decisão, o limite do saque de R$ 6.220 previsto em casos de calamidade pública. No entanto, destacou que a legislação não prevê situações como a pandemia e, por isso, “tal limite incidir no caso concreto em razão da amplitude e profundidade da crise sanitária, econômica e social que vivenciamos”.

Situação semelhante aconteceu com Ricardo Morais Sangiorato, que ganhou um processo na vara de Araras (SP), no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15). Ele é vendedor e sustentou que, em razão do isolamento social obrigatório (a ação foi protocolada em abril deste ano) “está encontrando graves dificuldades financeiras devido à redução de ganhos”.

O juiz Luís Rodrigo Fernandes Braga reconheceu o direito do vendedor ao Fundo de Garantia, também em razão da calamidade pública, e informou que: “Por medida de celeridade e economia processual, cópia da presente decisão, assinada pela forma eletrônica, tem força de alvará judicial para saque dos valores depositados na conta vinculada da parte reclamante”.

Documentos
A Caixa Econômica Federal explica que em casos de estado de calamidade pública decorrente de desastre natural causado por chuvas ou inundações que tenham atingido a área de residência do trabalhador é necessário apresentar os seguintes documentos:

Documento de identificação pessoal.

Carteira de Trabalho.

Cópia autenticada das atas das assembleias que comprovem a eleição, eventuais reconduções e término do mandato, quando se tratar de diretor não empregado.

Número de inscrição PIS/Pasep/NIS.

Comprovante de residência emitido nos últimos 120 dias anteriores à decretação da emergência ou calamidade havida em decorrência do desastre natural.

O advogado Peterson Vilela, por sua vez, aconselha à pessoa reunir o máximo de documentos que possam comprovar uma necessidade pessoal de obter a grana.

“Se a pessoa está com a intenção de entrar com uma ação visando alcançar os recursos do FGTS, acredito que o primordial é demonstrar para o juiz o seu real estado de necessidade, para que, justamente, consiga convencer o juiz que, de fato, precisa do dinheiro”, diz.

“Não basta entrar como uma ação e não apresentar prova documental. É preciso apresentar os documentos que comprovam, se paga aluguel, se está com o condomínio atrasado, se tem assistência médica. Talvez mostrar o extrato do cartão de crédito para comprovar a necessidade de compras, além de contas de luz, internet, água”, completa.

Metrópoles