PM é pop nas redes
Foto: Paulo Guereta/Photo Premium
A Polícia Militar é a corporação de Segurança que mais gera mobilização de apoiadores na internet, apontou um relatório feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Segundo o estudo, os profissionais da Polícia Militar têm uma maior presença nas redes, em comparação com as Polícias Civil e Federal. O relatório também mostra que os admiradores da PM são os mais ativos e têm maior tendência a defender abordagens policiais violentas na internet.
Desenvolvido em parceria com a agência de dados Decode, o estudo analisou mais de 2,8 milhões interações virtuais e os posicionamentos de profissionais das Polícias Militar, Civil e Federal na web, assim como o comportamento de seus fãs e admiradores. A ideia era traçar o perfil ideológico do policial do brasileiro. Seguindo critérios estatísticos, a pesquisa mapeou 879 perfis de policiais, cujo vínculo profissional com as corporações foi verificado por portais de transparência do governo federal e das administrações estaduais.
Os dados mostraram que a PM apresentou a maior quantidade de membros inscritos nas redes sociais (77%); em seguida vêm a Polícia Civil, com 21,4%, e a Federal, com 1,1%. O estudo também concluiu que, de todas as corporações, a PM é a que tem o público de admiradores mais numeroso e ativo. Dos 4,2 milhões de posts analisados pelo FBSP nos últimos três anos, em páginas de apoio a policiais, 47% enaltecem a Polícia Militar. A Polícia Federal foi a segunda mais citada (35%), com destaque para a época em que a Operação Lava-Jato passou a ganhar popularidade. A Polícia Civil foi a menos citada, com 18%. Informações do relatório foram divulgadas primeiro pelo portal UOL.
O estudo também concluiu que os fãs da PM são três vezes mais favoráveis a ações policiais violentas do que os fãs de outras corporações. Nos grupos de admiradores da Polícia Militar, comentários em defesa de abordagens mais duras são a segunda categoria mais frequente de posts, com 13% do total. Entre os fãs da Polícia Civil, o índice é de 5; e entre os fãs da PF, de 3%.
Para David Marques, coordenador de projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o enaltecimento das ações policiais, discurso absorvido de maneira ponderada pela mídia, encontrou vazão irrestrita nas redes, o que explica a forte presença de PMs na web.
O sociólogo também pontua que a defesa da abordagem violenta se relaciona com um clima de opinião vigente não só nas corporações, mas na sociedade brasileira como um todo. Essa atmosfera, que favorece políticas mais duras de enfrentamento ao crime, estaria representada no governo de Jair Bolsonaro.
— Bolsonaro defende que a polícia tem de usar a violência para coibir a violência, um discurso ainda amplamente aceito pela sociedade brasileira. Isso acaba levando o policial a se entender como um herói, e não como um trabalhador — diz o sociólogo.
O estudo do FBSP mostrou que a PM é a corporação que mais apresenta interações bolsonaristas nas redes sociais (37%). Em seguida vêm a Polícia Federal, com 12%, e a Civil, com 8%.
Na PM, a penetração do bolsonarismo entre os cargos de praça (soldados, cabos, sargentos e subtenentes) se destaca: 41% desses profissionais já fizeram publicações favoráveis a Bolsonaro. Entre os oficiais (aspirantes, tententes, capitães, majores, tenentes-coronéis e coronéis), esse índice cai para 35%.
Para David Marques, coordenador de projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a adesão do bolsonarismo entre os profissionais de Segurança aponta para a politização das polícias:
— Os policiais estão entre os maiores grupos de apoio a Bolsonaro e ao conjunto de ideias que ele representa. As polícias são instituições de Estado, isentas, e têm um papel fundamental para a preservação da democracia em situações de acirramento político, como a que estamos vivendo.
Segundo ele, a força do bolsonarismo entre os PMs pode se explicar pela agenda de segurança defendida pelo presidente em campanha eleitoral, com forte apelo aos profissionais da corporação. Isso teria satisfeito uma demanda antiga relatada por membros da Polícia Militar: a falta de representação, sobretudo quando relacionada a pedidos de melhores condições de trabalho.
No comparativo entre as corporações, a maioria dos comentários de viés antidemocrático analisadas pelo estudo, como a defesa do fechamento do Congresso e do STF, está ligada a representantes da PM. “Maia é um bandido! Esse congresso nacional tem que fechar as portas, só tem rato!”, diz a publicação de um PM citada na pesquisa.
Além disso, segundo o relatório, a PM foi a corporação que mais apresentou comentários de oposição a pautas LGBT, assunto que consumiu 24% do total de temas abordados entre profissionais da corporação e seus admiradores. Mais de 90% dessas interações vieram de cargos de praça da Polícia Militar. Em comparação, a pauta anti-LGBT representou 1% dos conteúdos comentados entre policiais civis e seus fãs; na comunidade da PF, não houve registro desse tipo de interação.
“Tem que boicotar eles (…). Como que colocam um travesti na propaganda de dia dos pais? Eles têm filhos?”, perguntou um policial militar em uma rede social, em alusão à campanha publicitária de Dia dos Pais da Natura com Thammy Miranda..
Para o sociólogo, a crescente popularidade de pautas antidemocráticas e de oposição aos Direitos Humanos justifica o esforço de entender a cabeça do policial brasileiro. Instabilidades políticas recentes na América Latina, como no Equador e na Venezuela, mostram que o conservadorismo radical não se vale mais do poder das Forças Armadas, e sim das polícias, pontua.
— Policiais tendem a ser conservadores, aqui e no resto do mundo. É preciso reforçar que ser conservador não é o problema. O problema é quando o posicionamento político se radicaliza de tal forma a oferecer riscos à democracia — diz Marques. — O caso das pautas anti-LGBT trazem uma preocupação especial. O PM que critica o público LGBT é aquele que, lá na ponta, terá de defendê-lo da homofobia.