PM mata jovem no dia de seu aniversário

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Foto: Reprodução

Um jovem saiu de moto para comemorar o aniversário de 19 anos, mas morreu baleado na tarde de domingo (9) após ter sido perseguido e abordado por dois policiais militares de motocicletas, na Zona Sul de São Paulo. Familiares e amigos acusam os agentes da Polícia Militar (PM) de atirarem em Rogério Ferreira da Silva Júnior, mesmo ele estando desarmado.

O PM que atirou no rapaz alegou que disparou em legítima defesa porque achou que ele estivesse armado e fosse a atirar. Os próprios policiais admitem, no entanto, não terem encontrado nenhuma arma com a vítima. Os dois agentes da PM foram afastados preventivamente dos serviços de rua para o que o caso seja investigado pela Polícia Civil e pela Corregedoria da PM.

Inicialmente, a Polícia Civil e a Corregedoria da PM concordaram com a versão dos policiais e entenderam que se trata de “legítima defesa putativa”, que é aquela na qual o indivíduo imagina estar em legítima defesa, reagindo contra uma agressão inexistente. Mas isso não impede que essa posição mude no futuro durante as investigações.

A Polícia Civil e a Corregedoria ainda vão analisar o vídeo gravado por câmera de segurança mostra o momento que Rogério pilotando sozinho a moto que tinha pego emprestada de um amigo (veja acima). Às 17h51, o rapaz aparece sem capacete, trafegando pela Avenida dos Pedrosos, no Sacomã.

Em seguida é possível ver nas imagens o momento que dois policiais da Rocam (Ronda Ostensiva com Apoio de Motocicletas) cercam Rogério, que reduz a velocidade da moto até parar perto da calçada.

Na sequência, a moto tomba com o rapaz. Segundo o boletim de ocorrência do caso, Rogério teria sido baleado momentos antes de cair, ainda no momento que era perseguido. Outros vídeos, gravados logo em seguida por testemunhas com seus celulares, mostram Rogério agonizando sem socorro médico. As imagens circulam nas redes sociais.

Os PMs fazem um cordão de isolamento para impedir a aproximação da população, que demonstram revolva e acusa os agentes de execução.

“Aqui é o menino, gente”, grita desesperada uma mulher que filma Rogério.

“Até então, para mim, ele tinha caído, alguma coisa assim. Nem imaginei que fosse tiro, porque não tinha sangue por perto. O tiro foi fatal. Não foi [de] hemorragia que ele morreu, essas coisas. Foi do tiro mesmo. Aí eu parei, ainda tentei socorrer ele, os policiais não deixaram, fizeram o procedimento lá deles, falaram que já tinham chamado reforço e tal, não sei o quê”, disse o amigo que emprestou a moto para Rogério. Ele aceitou falar desde que não fosse identificado.

O caso chegou a ser levado para o 26º Distrito Policial (DP), no Sacomã, mas depois a investigação foi transferida para o Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), no centro da capital.

Segundo parentes e amigos de Rogério, o 26º DP se recusou a registrar a ocorrência, que seguiu para o DHPP somente no final da noite. O boletim de ocorrência só foi finalizado na manhã desta segunda-feira (10) após 15 horas de espera da família e amigos de Rogério na frente do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa.

O caso foi registrado como “resistência, homicídio simples decorrente de intervenção policial, desobediência, dano qualificado, dirigir sem permissão ou habilitação, trafegar em velocidade incompatível e permitir direção de veículo automotor a pessoa não habilitada”.

O G1 entrou em contato com a Secretaria da Segurança Pública (SSP) para perguntar porque o BO do caso da morte de Rogério, ocorrida por volta das 17h50, não foi feito no 26º DP, e por qual motivo só foi levado ao conhecimento do DHPP perto das 23h30. A pasta também foi indagada porque o boletim de ocorrência só ficou pronto perto das 8h30 desta segunda.

“Só deixaram a gente tentar socorrer ele depois que ele não esboçava mais nenhuma reação”, falou o amigo de Rogério. “Porque de início, quando eu cheguei lá, ele estava vivo ainda. Ele estava tentando lutar ainda, estava agonizando, estava tentando respirar, estava até… lutando pela vida ali. Se deixasse socorrer, não sei, só Deus sabe, mas eu acho que ainda teria chances dele viver”.

Segundo testemunhas, uma amiga da família de Rogério, que é enfermeira, rompeu o cordão de isolamento dos PMs para tentar fazer massagem cardíaca no jovem, que posteriormente foi levado por parentes e amigos ao Pronto Socorro Municipal Augusto Gomes de Mattos, no Sacomã, onde morreu.

Segundo os PMs disseram no DHHP, o atendimento médico deveria ter sido feito por uma ambulância. Mas, ainda de acordo com os agentes, cerca de 50 pessoas insistiram para socorrer o rapaz. Posteriormente, o registro policial informa que uma viatura foi apedrejada por moradores em protesto contra a morte de Rogério.

Parentes e amigos de Rogério passaram a noite em frente ao DHPP.

“Era aniversário dele, ele estava muito feliz. Eu comprei bolinho para ele. A gente não conseguiu cantar os parabéns porque veio um e tirou a vida do meu filho”, disse Roseane da Silva Ribeiro, mãe de Rogério. “Eu quero justiça porque isso foi uma maldade, uma injustiça muito grande que fizeram com meu filho”.
Segundo Roseane, o filho trabalhava numa empresa de logística e estava fazendo curso de cabeleireiro, já que a mãe é cabeleireira.

“Um policial mal preparado. Para mim é um policial que não devia estar na rua. Entendeu? Ele [é] totalmente despreparado. O moleque não esboçou nada contra ele. Não tinha porque ele falar que ele se sentiu ameaçado. Não tinha porquê. Não tinha porquê. Até porque o policial está com a arma e ele está com o colete. O moleque estava sem capacete, não tem um colete à prova de balas e muito menos uma arma. Entendeu? Então acho que, assim, não era para ele ter feito isso, esse policial”, completou o amigo de Rogério.

Por meio de nota, a assessoria de imprensa da Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que o caso está em apuração pela Polícia Civil e pela Corregedoria da PM.

“Todas as circunstâncias relacionadas aos fatos estão sendo apuradas pela Polícia Militar, por meio de IPM, e pelo DHPP, onde o caso está sendo registrado. A Corregedoria da PM também foi acionada”, informa comunicado da pasta da Segurança.

Desde o final de julho, a Justiça Militar determinou que os responsáveis pela investigação na Corregedoria da PM e nos batalhões locais da corporação podem apreender armas e objetos em casos de mortes decorrentes de intervenção policial.

A questão envolve uma briga entre a Polícia Civil e a PM sobre a quem cabe a responsabilidade de assumir inquéritos que investigam ações de policiais militares que acabam com mortes de civis. Atualmente, ambas as corporações abrem inquéritos para apurar o mesmo caso.

A questão envolve uma briga entre a Polícia Civil e a PM sobre a quem cabe a responsabilidade de assumir inquéritos que investigam ações de policiais militares que acabam com mortes de civis. Atualmente, ambas as corporações abrem inquéritos para apurar o mesmo caso.

Familiares e amigos acham que Rogério foi perseguido e abordado pelos policiais pelo fato de estar pilotando uma moto sem capacete. Segundo os PMs disseram no boletim de ocorrência, eles foram abordar o rapaz na motocicleta porque, além da falta de capacete, o veículo estava sem placa.

Ainda segundo os agentes da Rocam, o condutor da moto não obedeceu o sinal de alerta para parar e fugiu “em alta velocidade e fazendo ziguezague pela via”.

De acordo com o registro do caso no DHPP, um dos PMs alega que baleou Rogério porque achou que ele estivesse armado e fosse atirar. “Durante a breve tentativa de fuga, o condutor da motocicleta fez menção de colocar a mão na cintura como se estivesse armado e simulando que buscaria sacar uma arma de fogo, o que fez os policiais militares pensar estar diante de uma iminente agressão, a qual foi repelido de imediato pelo policial”, informa trecho do boletim sobre o tiro que atingiu a região dorsal do rapaz.

A versão dos PMs foi aceita por um oficial da Corregedoria da PM que aparece no BO e pelo DHPP, que entendeu que o caso foi de “legítima defesa putativa”, que é aquela na qual o indivíduo imagina estar em legítima defesa, reagindo contra uma agressão inexistente.

A Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio acompanha o caso. “É um caso triste. Para você ter ideia, a família não tem dinheiro para pagar a funerária e fazer o velório”, disse ao G1 Marisa Fefferman, uma das articuladoras da Rede.

O coletivo, que é formado por articuladores de movimentos sociais que buscam combater a violência policial, informou que procurou o Ministério Público (MP) para que ele acompanhe o caso.

Procurado pelo G1, o promotor Arthur Pinto de Lemos Junior, Secretário Especial de Políticas Criminais e Coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do MP, afirmou que “vamos acompanhar a investigação policial”.

“O Ministério Público aguarda e confia que tanto a Corregedoria da Polícia Militar quanto o DHPP irão apurar os fatos de forma isenta e profunda, assim não é possível qualquer conclusão prematura a cerca da presença de legítima defesa real ou putativa”, disse o promotor Arthur.

G1