Secretário de Saúde do DF é acusado de liderar organização criminosa

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Joel Rodrigues/Agência Brasília

Ao determinar a abertura da segunda fase da Operação Falso Negativo nesta terça, 25, o desembargador Humberto Adjuto Ulhôa, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, apontou que dados colhidos durante as investigações do Ministério Público do DF revelaram ‘sérios e robustos indícios de que o Secretário de Saúde Francisco Araújo Filho atuou no comando e no controle de organização criminosa instituída para fraudar’ duas dispensas de licitação destinadas à aquisição de insumos destinados ao enfrentamento da Covid-19.

As licitações que estão no centro da investigação visavam a compra de 100.000 testes rápidos do tipo IgG/IgM e a contratação de Drive Thru para realização dos exames para detecção da Covid-19. Segundo o desembargador, o Distrito Federal ‘pagou preços aviltantes em manifesta violação à finalidade pública pretendida pelos novos diplomas legais editados visando o combate à pandemia’, sendo que o Ministério Público do DF avalia que houve um superfaturamento R$ 18 milhões nos procedimentos em questão.

No entanto, Ulhôa também indica que as apurações também identificaram suposto ‘comando’ de Francisco Araújo em outras dispensas de licitações para aquisição de insumos destinados ao combate ao novo coronavírus – ‘que serão tratadas em outras investigações’.

Apontado como ‘chefe da organização criminosa’ por quase sempre dirigir, orientar e fiscalizar a atuação de outros agentes do grupo, Francisco foi apenas um dos alvos da ofensiva aberta nesta terça, 25, por ordem do desembargador do TJDF. Além prender o secretario preventivamente, a Operação Falso Negativo 2 cumpriu mandados contra Jorge Chamon (diretor do LACEN), Eduardo Seara Machado Pojo Do Rego (secretário adjunto de gestão em saúde), Ricardo Tavares Mendes (então secretário adjunto de assistência à saúde), Eduardo Hage Carmo (subsecretário de vigilância à saúde), Ramon Santana Lopes Azevedo (assessor especial do secretário de saúde) e Iohan Andrade Struck (subsecretário de administração geral). O último está foragido.

Os integrantes da cúpula da secretaria de Saúde que foram presos prestaram esclarecimentos na tarde desta terça, 25, na sede do MPDFT. O governador Ibaneis Rocha afastou os envolvidos de seus cargos e disse ‘lamentar a desnecessária operação’. Após ofensiva, a procuradora-geral de Justiça do DF Fabiana Costa, afirmou: “O Ministério Público lamenta que seja preciso uma iniciativa drástica como essa. Nós compreendemos que a situação de pandemia demanda medidas emergenciais, inclusive com regras especiais, mas nada pode justificar o mau uso do dinheiro público. Como fiscal da lei, é dever do MPDFT proteger a sociedade e o patrimônio público”.

Ao remeter à Justiça a representação pelas prisões, a Promotoria descreveu a conduta individualizada de cada investigado e suas participações na organização criminosa, inclusive, transcrevendo áudios de algumas conversas supostamente havidas entre os envolvidos, diz Ulhôa em decisão datada do dia 17 de agosto.
O desembargador relata que ‘escolhida a empresa beneficiada por Francisco Araújo, Jorge, Iohan, Eduardo Seara, Ricardo, Eduardo Hage e Ramon articulavam-se entre si para a montagem de um projeto básico que atendesse aos interesses das empresas e do núcleo de servidores públicos da organização criminosa, chefiada pelo Secretário de Saúde’.

“Assim, sem que fosse realizado nenhum estudo que contabilizasse a quantia necessária de testes para o atendimento à população; sem pesquisas de preços; com publicação de aviso em feriado e com prazos ordinariamente inexequíveis; além da juntada de propostas coberturas/fictícias – a partir de todos esses atos concatenados foram cumpridas as etapas do esquema criminoso, tudo a fim de concretizar a violação ao caráter competitivo do certame e desviar o dinheiro público da saúde, conforme identificado pelo Ministério Público”, registra o magistrado.

Levando em consideração ‘farta prova documental’ apresentada pelo MPDFT, o desembargador considerou que ‘há, em tese, prova da habitualidade, reiteração criminosa, utilização do grande poderio econômico aliado aos cargos públicos ocupados e participação de inúmeros agentes em diversos contratos firmados pela Secretaria de Saúde, com dispensa indevida e/ou fraude em licitações, tudo em prejuízo ao erário e, por óbvio, à população do Distrito Federal’.

Ao avaliar os pedidos de prisão preventiva – sem data para acabar – Ulhôa apontou que, além dos ‘fortes elementos produzidos na investigação da possível existência de engrenagem montada por organização criminosa, possivelmente comandada pelo Secretário de Saúde, para dilapidar o patrimônio da saúde pública do Distrito Federal’, o Ministério Público indicou que: ‘outro procedimento administrativo aparentemente superfaturado está em curso; há evidências de ajustes de discurso para prejudicar a instrução criminal; e ao que tudo indica o Secretário de Saúde está dificultando a fiscalização dos procedimentos de dispensa de licitação pelo MP, o que também evidencia o perigo à preservação das provas’.

“As evidências de ajustes de discursos entre os integrantes da cúpula da Secretaria de Saúde, além do embaraço à fiscalização dos processos administrativos, demonstram que a prisão cautelar também tem sua imprescindibilidade lastreada no juízo prospectivo quanto à probabilidade de que os investigados, uma vez em liberdade, possam atrapalhar a colheita de elementos probatórios voltados ao esclarecimento de qualquer dos fatos em apuração. Ainda, os ados colhidos demonstram que foram efetivados pagamentos vultosos para a aquisição de produtos de baixa qualidade e, possivelmente, imprestáveis. Então, a aparente não observância das determinações legais e regulamentadoras da execução de despesa pública também justifica as medidas constritivas para que esses valores sejam rastreados e retornem aos cofres públicos com a menor dificuldade possível”, escreveu o magistrado em sua decisão.

Estadão