Bolsonaro ajoelhou no altar social e terá que rezar
Foto: Alan Santos/PR
Os reflexos da pandemia do novo coronavírus no bolso dos mais pobres vêm preocupando Jair Bolsonaro. Por mais que o governo adote medidas para tentar preservar empregos e, sobretudo, socorrer os brasileiros que perderam a renda por causa da covid-19, o presidente da República terá de fazer mais para não perder a popularidade –– que, segundo a pesquisa encomendada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) ao Ibope, divulgada na última quinta-feira, deu ao atual governo uma aprovação de 40% e constatou 46% de confiança da população no chefe do Executivo –– entre essa parcela da população, que cobrará dele uma camada de proteção social mais ampla.
O recente número divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que indicou pelo menos 13 milhões de brasileiros desempregados, pressiona o governo a encontrar uma saída para o auxílio emergencial que seja tão eficiente quanto o benefício, que alcança mais de 67 milhões de pessoas. Ciente disso, na última semana, em diversas reuniões com deputados e senadores, Bolsonaro deu as instruções à base no Congresso de como montar um novo programa de transferência de renda, que deve ser mais robusto do que o Bolsa Família.
O presidente quer acelerar as discussões para que o benefício possa ser repassado no início de 2021. Como o auxílio emergencial termina em 31 de dezembro deste ano, a ordem de Bolsonaro é não deixar ninguém desamparado, como disse o senador Márcio Bittar (MDB-AC). O parlamentar, relator do Orçamento do próximo ano e da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do Pacto Federativo, ficou incumbido de construir as regras do novo programa.
“O programa novo cria mecanismos que fazem com que as pessoas queiram ter a carteira assinada. Muitos têm medo de deixar o Bolsa (Família) hoje. Temos ideias que transformariam essa modernização em uma coisa mais ágil, mais refratária à fraude. Foram feitos muitos filtros, mas o novo programa faz um filtro a mais”, explicou Bittar.
O que também explica a urgência de Bolsonaro em apresentar um substituto ao auxílio emergencial é o fato de o presidente querer dar uma garantia aos mais humildes de que não serão esquecidos pelo governo. O Palácio do Planalto acredita que, ao continuar transferindo renda para os pobres, faz com que a avaliação do presidente siga em alta neste estrato da população.
O Executivo espera contornar a insatisfação das classes mais baixas com o governo pela redução das parcelas do auxílio de R$ 600 para R$ 300 e, sobretudo, pela alta no preço dos alimentos. Levantamento divulgado pela pesquisa Exame/Ideia, na semana passada, constatou uma alta na rejeição de Bolsonaro exatamente pelos impactos negativos da deterioração do poder de compra entre os mais pobres.
Segundo os dados, o pior desempenho na popularidade do presidente foi observado entre quem ganha até um salário mínimo (R$ 1.045): 54% dos entrevistados nesta faixa de renda desaprovam a gestão Bolsonaro. E 41% das pessoas que participaram da pesquisa responderam que o presidente é o culpado pela inflação dos alimentos.
“Estão todos conversando. O presidente da República está fazendo a parte dele; os líderes, também. É preciso entender que vai ter que tirar de algum lugar. Mas não podemos deixar as pessoas desamparadas. Busca-se o consenso dentro do possível”, comentou Bittar.
Apesar da mobilização do governo para chegar a um valor para o programa sucerssor do Bolsa Família, para a oposição, os mais humildes estão sendo abandonados, sobretudo pela redução do auxílio à metade. “Há quanto tempo não ouvíamos falar na palavra ‘carestia’? A carestia voltou para o dicionário econômico por causa daqueles que produzem e constroem esse modelo de desenvolvimento econômico centrado na ideia do Estado mínimo, que não protege, não planeja e não dá garantia de vida às famílias que mais precisam”, reclamou o deputado José Guimarães (PT-CE).
Parlamentares querem tentar manter o valor original do programa até dezembro e, para isso, pedem a votação da medida provisória editada pelo governo que prorrogou o benefício até o fim do ano. O texto já recebeu 264 emendas, a maioria delas para impedir que o auxílio caisse a R$ 300.
O deputado André Janones (Avante-MG) reclama da estratégia do governo em não querer votar a MP. Segundo ele, “um auxílio emergencial digno, que permita aos brasileiros da baixa renda saírem vivos dessa pandemia, não é uma luta da direita ou da esquerda, mas do Brasil. Há eleitor da direita e da esquerda desempregado”, destacou.
Para o cientista político Nauê Bernardo, resolver o acesso da população a postos de trabalho e alimentação será o grande teste de Bolsonaro no último trimestre do ano. “Ele tem até o final do ano para conseguir dar uma resposta. Com o fim do auxílio, se não achar espaço para um programa social, a opinião negativa voltará a subir fortemente. O presidente sabe que precisa ter um plano de continuidade”, analisou.
Na visão do cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, “o problema é tentar resolver questões políticas e econômicas ao mesmo tempo, o que demanda habilidade e liderança. Nisso, ele demonstra-se deficitário”, observou.
Após se submeter a uma cirurgia para retirada de um cálculo na bexiga, o presidente Jair Bolsonaro recebeu alta, na tarde de ontem, e veio direto para Brasília. Ele passará este final de semana em repouso, por prescrição médica, no Palácio da Alvorada.
Segundo o boletim do hospital Albert Einstein, divulgado antes da alta, Bolsonaro estava com “ótima evolução clínica, não apresentando sangramentos ou febre”. Com a retirada da sonda vesical, o presidente já estava recebendo hidratação oral e caminhando fora do quarto.
Mais cedo, a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, que o acompanhou, postou uma foto do presidente nas redes sociais –– que posou vestindo uma camisa da Ferroviária, do Ceará. Em alusão ao Dia Nacional do Surdo, celebrado ontem, ele cumprimentou os seguidores em libras com a mão direita.
Segundo a equipe médica que o atendeu, a cirurgia realizada na última sexta-feira durou 1h30 e o cálculo foi totalmente removido. Bolsonaro estava sob os cuidados do cardiologista Leandro Echenique e do urologista Leonardo Borges.
Para a extração do corpo na vesícula, a equipe recorreu a uma cistolitotripsia, procedimento considerado simples e minimamente invasivo. Esse método permite que um catéter siga pelo canal da uretra até a bexiga, onde o cálculo é fragmentado com a ajuda de um laser. No início do mês, o presidente comentou com apoiadores que a pedra era “maior de que um grão de feijão”. Foi o sexto procedimento médico realizado por ele desde a facada recebida durante a campanha eleitoral, em Juiz de Fora (MG), em 2018.
Uma das visitas recebidas por Bolsonaro durante a internação foi a do deputado Celso Russomanno (Republicanos-SP), líder nas pesquisas para a prefeitura paulistana e que conta com o apoio do presidente.
Mas, amanhã, ele retoma as atividades. Reúne-se no Alvorada com a ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) e parlamentares e pastores da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil. À tarde, consta reunião com os ministros Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura) e Bento Albuquerque (Minas e Energia). Há, ainda, a expectativa de que ele participe, no final da tarde, do lançamento do programa Mineração e Desenvolvimento, das Minas e Energia. (IS)
O ministro da Economia, Paulo Guedes, pretende apresentar, amanh,ã a segunda parte da reforma tributária ao presidente Jair Bolsonaro e a líderes partidários. A ideia é desonerar a folha de pagamentos das empresas e, para compensar a perda na arrecadação, criar um novo tributo. Ele reuniu-se ontem, no Ministério da Economia, com o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), para acertar os detalhes da proposta.
A equipe econômica apresentará mais de uma alternativa, para que o presidente e as lideranças da base avaliem qual é a melhor. A meta é conseguir o aval de Bolsonaro para tocar o assunto e o parecer dos parlamentares sobre qual é a chance real de que a proposta avance no Congresso, já que a criação do imposto é uma medida impopular. “Teremos um texto para ele (Bolsonaro) escolher. Os líderes também poderão opinar. Só será anunciada a solução que já tiver passado pelo crivo do presidente e senhores líderes da base do governo, porque isso dá uma maior previsibilidade na aprovação da matéria”, explicou Barros.
O novo imposto, que compensaria a perda de arrecadação, deve incidir sobre todas as movimentações financeiras, nos moldes da extinta CPMF, ideia que enfrenta resistências no Congresso. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é um dos maiores opositores. Além disso, parte dos parlamentares acredita que a proposta, se enviada à Comissão Mista da Reforma Tributária, pode contaminar a discussão dos projetos em andamento, que simplificam a cobrança de tributos sobre o consumo.
Vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros pediu ao Supremo Tribunal Federal, ontem, que abra inquérito para apurar se o ministro da Educação, Milton Ribeiro, cometeu crime de homofobia. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, na quinta-feira, ele associou a homossexualidade a “famílias desajustadas”. O relator do caso será o ministro Dias Toffoli. A Procuradoria-Geral da República (PGR) considera que Ribeiro “fez afirmações ofensivas à dignidade do apontado grupo social”. A PGR entende que as falas caracterizam infração penal, prevista desde que o STF permitiu a criminalização da homofobia, em 2019.