Congresso teme que Bolsonaro lhe empurre ônus do Renda Brasil
Foto: Gabriela Biló/ Estadão
Deputados e senadores estão convencidos de que o presidente Jair Bolsonaro quer empurrar uma nova “batata quente” para o Congresso com essa história de Renda Brasil. Nos bastidores, muitos dizem que, ao perceber que o programa antes anunciado com pompa e circunstância para substituir o Bolsa Família não conseguiria chegar aos pés do auxílio emergencial, já reduzido para R$ 300, Bolsonaro tenta agora transferir o ônus para o Legislativo.
Embora parlamentares façam movimentos para apresentar uma agenda social mais robusta neste ano eleitoral, o grupo ligado ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já avalia que é preciso ir devagar com esse andor. Longe dos holofotes, o diagnóstico é o de que o Congresso não pode deixar Bolsonaro capitalizar medidas populistas, enquanto deputados e senadores ficam com a imagem de quem tirou dinheiro dos pobres.
A preocupação ocorre porque, pelos cálculos em estudo por esse grupo, um programa mais amplo de benefícios, como o planejado Renda Brasil, acabaria frustrando as expectativas em termos de recursos. Ao fim e ao cabo, os repasses das parcelas para a população carente seriam menores do que o auxílio emergencial criado pelo governo para atenuar os efeitos provocados pela pandemia do coronavírus, como o desemprego em massa. O auxílio, que no início da crise foi de R$ 600, acabou reduzido pela metade até dezembro.
E o que vai entrar no lugar até 2022, ano de novas eleições presidenciais? “Nós defendemos e achamos muito importante um programa de renda básica, mas é atribuição do governo apresentar essa proposta”, disse ao Estadão o líder do Cidadania, deputado Arnaldo Jardim (SP).
Na outra ponta, o PT vai insistir na marca Bolsa Família, criada no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, e quer que o benefício seja incorporado à Constituição, para torná-lo permanente. É, na prática, um discurso de campanha. “Covarde, Bolsonaro não ousa enfrentar os interesses do mercado. O PT vai insistir com os R$ 600 do Mais Bolsa Família”, escreveu no Twitter o deputado José Guimarães (PT-CE), líder da Minoria.
Enquanto isso, entre canetadas e ameaças de “cartão vermelho”, que agora podem atingir o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues – mensageiro da proposta de congelar por dois anos aposentadorias, na tentativa de abrir espaço no Orçamento para o Renda Brasil –, Bolsonaro vai barrando qualquer medida com risco de abalar sua popularidade. E costuma sempre debitar a culpa por infortúnios na conta do Congresso.
Dias antes de dar um piti com a equipe econômica comandada por Paulo Guedes e repetir que jamais tiraria “dinheiro dos pobres para dar aos paupérrimos”, por exemplo, o presidente vetou parte de um projeto de lei que concedia perdão a dívidas de igrejas.
Apesar de ter atendido Guedes nesse quesito – já que a iniciativa poderia ter impacto de R$ 1 bilhão aos cofres da Receita –, Bolsonaro foi às redes sociais, no domingo, para dizer que, se fosse deputado ou senador, votaria pela derrubada do seu próprio veto.
Pressionado pela bancada evangélica, que o apoia e prometeu defender o governo nas disputas de novembro em cidades estratégicas para seu projeto de reeleição, como São Paulo e Rio, Bolsonaro encomendou agora outra proposta para beneficiar as igrejas. Na avaliação de parlamentares, esse vaivém é mais um exemplo de como o Palácio do Planalto acaba sempre deixando a “batata quente” nas mãos do Congresso para ficar bem na foto. E assim segue o jogo político. Ao vencedor, as batatas!