Governador de SC está à beira do impeachment
Foto: Ricardo Wolffenbüttel/Secom
O processo de impeachment contra o governador de Santa Catarina, Carlos Moisés (PSL), avançou ontem na Assembleia Legislativa, com a aprovação na Comissão Especial do parecer do deputado Luis Fernando Vampiro (MDB) pela perda de mandato dele e da vice-governadora Daniela Reinehr (sem partido). A ação coincidiu com a apresentação pelo Ministério Público Federal de uma denúncia contra o presidente do legislativo catarinense, Júlio Garcia (PSD), um dos alvos da Operação Alcatraz e que herdará o governo do Estado, caso a cassação comandada por ele se consume.
Garcia é investigado por lavagem de dinheiro. Moisés é alvo de julgamento de crime de responsabilidade por ter autorizado equiparação salarial de carreira no Ministério Público sem autorização legislativa.
O processo contra o governador e a vice será lido hoje, com votação prevista para amanhã em plenário. Para se salvar, Moisés precisa que ao menos 14 dos 40 deputados não votem pelo seu impedimento – podem ser votos contrários, faltas ou abstenções.
Caso o impeachment receba os votos de 27 deputados, o processo será encaminhado para uma comissão mista de desembargadores e deputados, que poderá afastá-lo do cargo até a decisão final. Esse rito foi definido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
O governador, em entrevista ao Valor, liga os dois temas. Sem citar nomes, diz que a iniciativa parte de grupos que foram tirados do poder e formavam esquemas dentro da administração pública, em contratos investigados em operações da Polícia Federal. Afirma que ele o governo do Estado economizaram na revisão de contratos, o que mexeu com interesses estabelecidos. “Eu não entreguei a chave do cofre”, diz.
“Nós entendemos que é um terceiro turno. É uma vontade de tirar governadores. Há seis ou sete processos [de impeachment protocolados na Alesc], mas escolheram um que pode tirar o governador e a governadora. Não querem tirar um ou outro. Querem tirar os dois para assumir o poder. Isso ficou muito claro”, disse Moisés. “São grupos que foram tirados do poder em 2018 e operavam no nosso Estado dentro da administração pública, com contratos que traziam prejuízo ao erário público. Esse é o verdadeiro motivo.”
Eleito com 75,92% dos votos válidos em segundo turno, surfando na onda bolsonarista de 2018, Moisés não teve o mesmo sucesso em construir uma base sólida. Pelo contrário, colecionou desafetos dentro do Estado, foi acusado de dialogar pouco tanto com atores políticos como econômicos. E, embora não admita, também acabou se desentendendo com o presidente Jair Bolsonaro, que não frequentemente o critica tanto nas “lives” semanais do Facebook como na porta do Palácio da Alvorada.
Bolsonaro opera para salvar a vice-governadora. Seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), age há várias semanas em articulações em seu favor no Estado. Além disso, a advogada e tesoureira do Aliança pelo Brasil, Karina Kufa, a atua na defesa de Reinehr, com o aval do presidente.
Moisés classifica sua relação com a vice, com quem também teve desavenças, como “boa”.
“Entendemos que é momento de união. Houve divergências de ideias pontuais que não pode se refletir em toda uma história”, disse. “Nós temos de estar juntos, porque temos um inimigo em comum. Isso foi percebido por mim e pela Daniela.”
Mas o Valor apurou com fontes próximas à vice-governadora que a relação não anda tão harmoniosa, e que ela prossegue com a estratégia de se dissociar de Moisés.
“A vice-governadora está trabalhando em sua defesa e não na defesa do governador, já que os fatos são diferentes. Ou seja, ele está sendo acusado pela prática de atos ilegais e ela por não tê-lo fiscalizado”, afirmou uma fonte.
A vice-governadora entende que, juridicamente, não há motivo para cassar Moisés no caso que trata dos procuradores estaduais. Aliados dela entendem que a denúncia contra o presidente da Assembleia Legislativa fragiliza o processo.
Moisés diz estar convicto de que terá os votos suficientes para não ser cassado, admite que a experiência lhe trouxe aprendizados e acena com a possibilidade de um “governo de coalizão”.
“Esse processo tem sido revelador, porque agora a gente sabe quem são as pessoas que podem estar do nosso lado. Então, isso aproxima, como um pacto. Quando você recebe ajuda dos parlamentares para manter o seu governo, você vai tratar de forma muito especial aqueles parlamentares que estão contigo”, afirmou o governador. “Estou aberto hoje a um governo de coalizão, desde que com práticas republicanas. Eu não tenho receio nenhum de abrir o nosso governo. Eu sei que aqueles que virão serão nossos parceiros. E virão para fazer exatamente aquilo que é de interesse público”.
O governador disse que tem conversado inclusive com os parlamentares de partidos de esquerda. “Alguns deputados de esquerda têm dito que votarão tecnicamente. É uma maneira de cuidar da própria sobrevivência política. Imagina se isso vira moda? É preciso fortalecer a democracia para todo o Brasil. A vontade popular deve ser obedecida”.
Procurado, Julio Garcia não quis se manifestar nem sobre a denúncia, nem sobre o impeachment.