Justiça valida estupros por suposta conduta imoral de vítimas
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1974. A Justiça do Rio de Janeiro absolve o réu Fernando Cortez de uma acusação de estupro baseando-se no questionamento de um procurador, que perguntou se seria justo que Cortez tivesse “a sua vida estragada por causa de um fato sem consequências oriundo de uma falsa virgem”. Diz, ainda, que a vítima, “amorosa com outros rapazes, vai continuar a sê-lo”. E continua: “Com Cortez, assediou-o até se entregar e o que, em retribuição lhe fez Cortez, uma cortesia”, consta no acórdão da decisão.
2020. Em audiência do caso Mariana Ferrer, em que o empresário André de Camargo Aranha foi absolvido da acusação de estupro de vulnerável, Mariana, que é modelo e blogueira, é questionada pelo advogado do então réu, Cláudio Gastão da Rosa Filho, sobre as fotos que ela postava em suas redes sociais. Ele diz que a modelo aparece em posições “ginecológicas” nas imagens e que em uma delas está “com o dedinho na boquinha”.
São quase 50 anos separando um caso do outro mas, até hoje, se perpetua no judiciário o argumento de que o comportamento da mulher pode validar ou não seu relato. O foco sai do crime em si e recai sobre a vítima: a veracidade da palavra dela vai depender de como se comporta e da exposição que ela decidiu fazer do próprio corpo ou de sua sexualidade até então.
“O estupro é um dos poucos crimes no Direito brasileiro em que o histórico da vítima é colocado em análise”, afirma a advogada criminalista e especialista em direitos das mulheres Andressa Cardoso, que trabalhou com Mariana no início do processo, há cerca de um ano.
Redação com Uol