Candidato médio é homem, negro, casado e com ensino médio
Foto: Amanda Paes/G1
Homem, negro, casado, com 46 anos e ensino médio completo. Esse é o perfil médio dos candidatos que disputam as eleições deste ano.
Esta é a primeira vez desde 2014, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começou a coletar dados de raça, em que o candidato médio é negro. Nas eleições anteriores, a cor de pele mais comum era a branca.
Para a análise, o G1 usou os dados das candidaturas divulgados pelo TSE. São, no total, mais de 548 mil candidatos registrados para participar das eleições deste ano.
Os números do TSE ainda podem ter alterações, com a atualização dos dados pelo órgão ou até com indeferimento e renúncia de candidatos.
De todas as candidaturas registradas, 49,9% são de pessoas que se declararam pardas ou pretas. Juntos, pardos e pretos formam os negros, segundo classificação do IBGE. Já os brancos representam 47,8% do total. Além disso, 0,4% se declaram indígenas e outros 0,4%, amarelos. Não há informação de raça de 1,6% dos registros.
A proporção de candidatos negros nas eleições deste ano é a maior já registrada pelo TSE. Além disso, é a primeira vez em que os brancos não são mais de 50% dos candidatos. Por isso, houve alteração do perfil médio dos candidatos de branco para negro.
Os especialistas afirmam que cada vez mais brasileiros estão se declarando negros, o que acaba se refletindo nas candidaturas.
“Os brasileiros estão ficando mais conscientes de sua cor. (…) Quando os indivíduos recebem educação, eles podem se fortalecer e abraçar identidades negras”, diz Andrew Janusz, professor-assistente do departamento de ciência política da Universidade da Flórida.
Além disso, o professor de ciência política da UFMG Cristiano Rodrigues afirma que, nos últimos anos, houve “vários movimentos que levaram ao aumento das candidaturas negras”. “Um deles é o efeito Marielle. Ela se tornou um símbolo e tem motivado várias pessoas negras a entrar na política.”
Quanto às outras características, não houve muita diferença em relação ao perfil médio dos candidatos das últimas eleições municipais, em 2016. Os candidatos são predominantemente casados (51%), com ensino médio completo (38%) e com uma média de 46 anos.
Além disso, a ocupação mais comum é a de agricultor. Como há muitas ocupações registradas, porém, os dados são mais pulverizados neste caso. Assim, mesmo sendo a mais comum, a profissão de agricultor foi declarada por apenas 6,8% dos candidatos.
Em relação ao gênero, 67% são homens e 33% são mulheres. O percentual feminino, inclusive, é muito próximo do mínimo estabelecido em lei pela cota de candidatas mulheres que deve ser cumprida pelos partidos, de 30%.
Também vale lembrar que, de acordo com o IBGE, as mulheres correspondem a mais da metade dos brasileiros (52%).
Segundo Polianna Santos, professora da PUC Minas e diretora-presidente da Associação Visibilidade Feminina, mesmo com o percentual de candidatas mulheres baixo, as eleições deste ano trazem mudanças.
“A gente pode não identificar uma mudança quantitativa, pois o percentual de candidatas mulheres continua em 30%, mas podemos perceber uma mudança qualitativa de ter candidaturas reais, com condições materiais, por conta da cota financeira”, diz.
Assim como a cota de candidatas mulheres nas listas dos partidos, a cota financeira reserva uma parte dos recursos para as candidaturas femininas.
Santos destaca, porém, que ainda há muitos problemas estruturais e preconceitos contra a mulher na política.
“Existe uma questão cultural de achar que lugar de mulher é dentro de casa, e não ocupando espaço de poder na política. Então ela é cantada, menosprezada, objeto de chacota. Quando é eleita, falam da sua roupa, do seu corpo”, afirma.
O perfil dos candidatos, porém, muda consideravelmente em alguns quesitos a depender do cargo disputado. Enquanto que o perfil médio dos candidatos a vereador segue a média geral, os dos candidatos a prefeito e vice-prefeito têm outros graus de instrução, ocupações e raças.
Enquanto que a maior parte dos candidatos a vereador é negra (51%), a maioria dos que concorrem a prefeito e a vice é branca (63% e 59%, respectivamente).
Além disso, os candidatos a prefeito e vice têm a escolaridade maior: o grau de instrução mais comum entre eles é o de superior completo. Já entre os candidatos a vereador, o mais comum é ter o ensino médio completo.
Outra diferença é a da ocupação: a mais comum entre os candidatos ao Executivo municipal é a de empresário, enquanto que a de agricultor tem um maior percentual entre os que concorrem ao Legislativo.
Há outros pontos que, mesmo sem mudar o perfil, são diferentes entre os concorrentes. Por exemplo, há muito mais homens entre os candidatos a prefeito (87%) que entre os candidatos a vereador (66%). Os primeiros também são “mais” casados (68%) que os últimos (50%).
“O principal motivo por trás dessas diferenças entre os dois, Executivo e Legislativo, é que, no Legislativo, os vereadores têm mais assentos em disputa. Isso permite que o perfil dos candidatos seja mais diversificado. Fica mais fácil de as pessoas serem eleitas”, diz Lucas Gelape, doutorando em ciência política na Universidade de São Paulo (USP).
O pesquisador também destaca que os perfis de candidatos a prefeito e vice-prefeito são mais semelhante aos de deputados.
“São mais educados e com ocupações como as de empresário e advogado. Vereador, não. Vereador mostra mais diversidade, até mesmo mais proximidade com a população”, afirma Gelape. “E, de fato, o cargo de vereador costuma estar mais próximo das pessoas. Uma parte significativa do trabalho dos vereadores é atender a população, falar com as pessoas.”
Gelape afirma que esta proximidade, ou mesmo representatividade, é importante para a produção de políticas públicas e também para a percepção do próprio eleitorado, que se percebe mais representado ou não, a depender das características dos políticos.
Além disso, ele também diz que as diferenças dos dados refletem o fato de que o cargo de vereador geralmente é o início da carreira política de muitos.
“[Ser] vereador não é a única porta de entrada na política, mas é uma entrada importante. Esses dados refletem um pouco isso, de candidatos mais semelhantes à população, mostrando que essa porta de entrada parece de mais fácil acesso à população.”