10 indícios de que Lava Jato morreu
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A Lava Jato não é a primeira e muito provavelmente não será a última operação contra o combate à corrupção no Brasil.
Fato é que, a despeito disso, a relativamente idosa operação chega ao seu sexto 9 de dezembro, Dia Internacional contra a Corrupção, diante de uma marcante sequência de derrotas neste ano de 2020.
A operação perdeu parte dos seus rostos. Depois do ex-juiz Sergio Moro, que era o magistrado responsável no Paraná e saiu do cargo no final de 2018, este ano foi a vez do procurador da República Deltan Dallagnol deixar a Lava Jato pressionado por ações contra ele no conselho da procuradoria.
Em 2020, Moro deixou o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública, que assumiu no início de 2019 prometendo consolidar as práticas da Operação Lava Jato. Com o ex-juiz fora do governo, rompido com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o grupo de críticos à Lava Jato cresceu em Brasília.
Em discurso feito em outubro, Bolsonaro chegou a dizer que “acabou” com a Lava Jato e que a operação não seria mais necessária porque não haveria mais corrupção no governo. Dias depois, afirmou que falou de forma figurativa e que a Lava Jato seguiria pra investigar os órgãos onde ainda houvessem desvios.
A Lava Jato também reduziu de tamanho, com o fim do braço em São Paulo, mas também na amplidão de temas que poderia abranger em sua reta final.
Em agosto, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu excluir de uma ação contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) trechos da delação do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci.
Trata-se de um “fio” que poderia manter sob investigação em Curitiba outros temas relatados por Palocci. Outros casos semelhantes foram registrados ao longo dos últimos meses, afunilando as investigações que ficam sob a alçada da Lava Jato.
Aras
As divergências com o procurador-geral da República, Augusto Aras, estiveram presentes em vários momentos. Indicado para o cargo pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em 2019, Aras é um defensor da revisão do modelo de forças-tarefas, em que um procurador titular aciona colegas e forma um grupo para cuidar de determinado caso.
O chefe da PGR prefere centralizar em Brasília as apurações e defende o acesso do seu gabinete aos dados e investigações das operações. Essa é uma questão que se desdobra até agora, com o imbróglio sobre o acesso ou não ao acervo da Lava Jato paranaense.
Para não dizer que eu não falei das flores, nesta semana, as forças-tarefas ganharam um respiro. O grupo original, de Curitiba (PR), foi prorrogado pelo procurador-geral Augusto Aras até 31 de outubro de 2021. O do Rio de Janeiro, que poderia terminar nesse mês, ganhou um curto tempo extra e deve se encerrar na largada do ano, em 31 de janeiro.
Abaixo, a CNN lista os fatos mais importantes que foram interpretados pelos mundos da política e da Justiça como derrotas para a Operação Lava Jato, nesse ano de 2020 que chega ao fim em poucas semanas.
1) ‘Acabei com a Lava Jato’
Eleito em 2018, o presidente Jair Bolsonaro convidou o então juiz federal Sergio Moro para assumir o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública, o projeto de um “superministério” que abarcaria ainda o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
A intenção de ser ministro, disse Moro então, seria consolidar em nível federal as práticas adotadas pela Lava Jato. Um ano e três meses depois, o ex-juiz pediu demissão do cargo de ministro em atrito com Bolsonaro, a quem acusou de interferência política na Polícia Federal, o que o presidente nega.
Meses depois, acusado por defensores da operação de “acabar” com ela, o presidente da República afirmou que a Lava Jato não era mais necessária no governo federal porque, segundo ele, não haveria mais corrupção.
“É um orgulho, uma satisfação que eu tenho dizer para essa imprensa maravilhosa nossa que eu não quero acabar com a Lava Jato, eu acabei com a Lava Jato, porque não tem mais corrupção no governo”, disse Bolsonaro
2) Saída de Deltan
No que diz respeito ao Ministério Público Federal (MPF), poucos rostos são tão expressivos quanto o do procurador da República Deltan Dallagnol, que até o início de setembro coordenava a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Dallagnol deixou o comando da Lava Jato em meio a pressões derivadas de representações contra ele no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que questionavam a sua atuação.
Para o analista da CNN Caio Junqueira, a saída de Deltan distensiona o ambiente político e facilita a absolvição do procurador no CNMP. Além disso, a razão familiar de fundo, uma doença rara da filha de Dallagnol, também entra na conta dos aspectos políticos de um julgamento.
3) Forças-tarefas
Deltan Dallagnol foi sucedido pelo procurador Alessandro Oliveira, que assumiu a coordenação da Lava Jato em Curitiba. No entanto, o trabalho de Oliveira dificilmente chegará aos cinco anos que durou o de Deltan na operação.
Isto pela posição do procurador-geral, Augusto Aras. Chefe do MP, Aras defende a revisão desse modelo, em que um procurador titular de uma ação recebe a delegação de colegas para ajudá-lo nesse processo.
A intenção do PGR é a criação de grupos especializados em combate à corrupção, em modelo diverso do que funciona hoje na Lava Jato.
4) Dados da Lava Jato
A divergência entre o comando do MPF em Brasília e as forças-tarefas não se resume a uma questão metodológica. Augusto Aras disse ao longo deste ano que o “lavajatismo” é negativo ao país e que as forças-tarefas seriam “caixas de segredos”, que armazenariam de forma irregular dados de brasileiros.
Aras chegou a obter uma autorização do ministro Dias Toffoli, então presidente do STF, para receber uma cópia de todo o acervo da Lava Jato em Curitiba.
A decisão foi revogada pelo relator, ministro Edson Fachin, mas a discussão não ficou sem sequelas. Em julho, veio à público uma denúncia de seis meses antes, em que a Lava Jato citaria “David Samuel” e “Rodrigo Felinto” em uma planilha de investigados.
As duas menções seriam uma espécie de “drible”, que a Lava Jato nega, para investigar os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Como Maia e Alcolumbre têm foro privilegiado, eles só poderiam ser investigados pela própria PGR.
Maia se chama Rodrigo Felinto Ibarra Epitácio Maia, enquanto o nome completo de Alcolumbre é David Samuel Alcolumbre Tobelem. Daí, o questionamento.
5) São Paulo
Iniciada em Curitiba, a força-tarefa da Lava Jato foi “exportada” para o Rio de Janeiro e para São Paulo.
Nas terras fluminenses a Lava Jato produziu condenações expressivas, sobretudo as dezenas de anos de prisão impostas ao ex-governador Sérgio Cabral (MDB), o que não se repetiu em São Paulo.
No início de setembro, todos os procuradores da Lava Jato pediram demissão coletiva, em divergência com a coordenadora da força-tarefa, a procuradora Viviane Martinez. A operação acabou no final do mesmo mês e parte dos casos será redistribuída.
6) Palocci
A Segunda Turma do STF decidiu excluir, de um processo contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), trechos da delação premiada de Antonio Palocci, que foi ministro da Fazenda do governo petista.
A decisão teve um forte precedente contra a Lava Jato. Ao votar para excluir os trechos de Palocci, o ministro Gilmar Mendes afirmou que o então juiz Sergio Moro tentou criar “um fato político” que constrangesse o PT às vésperas das eleições gerais de 2018.
“Verifica-se que o acordo foi juntado aos autos da ação penal cerca de três meses após a decisão judicial que o homologara. Essa demora parece ter sido cuidadosamente planejada pelo magistrado para gerar verdadeiro fato político na semana que antecedia o primeiro turno das eleições presidenciais de 2018″, argumentou Gilmar Mendes.
Moro, naquele momento, defendeu a inclusão da delação. Segundo o ex-juiz, a intenção era incluir no processo os temas que diziam respeito às investigações e sobre os quais Lula deveria se defender.
Vale ressaltar que a acusação de possível parcialidade de Moro — que o ex-juiz nega — é alegação da defesa do ex-presidente Lula, que pede no STF e em outras instâncias da Justiça a anulação dos casos do petista que foram julgados pelo então juiz.
7) Raupp e Jucá
Uma das principais divergências entre o Ministério Público e as defesas de investigados ao longo dos seis anos da Lava Jato foi a responsabilidade, ou não, da operação para julgar determinados fatos que teriam acontecido muito longe do Paraná.
A Lava Jato paranaense surgiu de investigações sobre desvios na Petrobras. Para os procuradores do MPF-PR e o então juiz Sergio Moro, a maior parte dos relatos de delatores que tivessem alguma conexão com a petrolífera.
Essa avaliação continuou depois que o juiz Luiz Antonio Bonat sucedeu Moro. Em maio, ele abriu uma ação contra os ex-senadores Romero Jucá (MDB-RR) e Valdir Raupp (MDB-RO), acusados de receber dinheiro desviado da Transpetro, subsidiária da Petrobras (o que ambos negam).
O STF tomou outra decisão que mudou o entendimento que se tinha a respeito dessa conexão. A Segunda Turma decidiu retirar o caso contra Jucá e Raupp do Paraná e transferi-lo para a Justiça de Brasília.
8) Vital do Rêgo
No início de setembro, a mesma Segunda Turma decidiu travar um processo movido pela Lava Jato contra Vital do Rêgo, ministro do Tribunal de Contas da União (TCU).
O ministro do TCU é acusado de, enquanto foi senador, atuar para comprometer os trabalhos da CPI que o Congresso abriu para investigar os supostos casos de corrupção na Petrobras.
Vital do Rêgo, que presidiu a CPI, teria recebido propina de Leo Pinheiro, ex-presidente da empreiteira OAS, para beneficiá-lo, o que o hoje ministro do TCU nega.
Para o ministro Gilmar Mendes, que deu voto decisivo para que o processo fosse suspenso pelo STF, a Corte deveria entrar no mérito dos recursos do ex-senador.
Vital do Rêgo afirma que o inquérito traz apenas a palavra de delatores, alegação que Gilmar Mendes julgava pertinente, e questiona também a análise do caso na Justiça do Paraná.
Enquanto suas argumentações não são analisadas, decidiu o Supremo, o caso não pode seguir.
9) Delações questionadas
Uma decisão que não diz respeito à Lava Jato, mas afeta diretamente a filosofia de atuação jurídica da operação é a que trata da contestação às delações premiadas.
Em julgamento de 2015, o STF havia decidido que acordos de delação só poderiam ser contestados pelas partes que o assinaram — os delatores e os representantes do estado, o Ministério Público e a Polícia Federal.
Apesar de ainda não ser uma decisão com repercussão geral, que valha para todo e qualquer caso, o Supremo tomou uma decisão importante em outro sentido. Em agosto, o STF pemitiu a contestação de terceiros à delação do ex-auditor fiscal Luiz Antônio de Souza, citada em processos contra o ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB).
É um precedente que pode ser utilizado por outras pessoas, inclusive delatados, para questionar acordos de delação de premiada. O instrumento da delação é defendido por Moro e pelos procuradores como um dos alicerces da Lava Jato.
10) Elos com os EUA
Um dos mais recentes reveses da Lava Jato ocorreu no final de novembro, quando o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, determinou que a Corregedoria do MPF deve apurar possíveis irregularidades nas tratativas entre a força-tarefa e autoridades estrangeiras.
O prazo para resposta é de 60 dias.
O pedido foi apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que obteve, também por decisão de Lewandowski, o acesso integral ao acordo de leniência firmado pela empreiteira Odebrecht.
O acordo de leniência é a versão para empresas da delação premiada. De acordo com a argumentação dos advogados de Lula, a colaboração entre autoridades do Brasil, dos Estados Unidos e da Suíça foi irregular.
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