Desemprego terá alta histórica em janeiro
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Com o fim do ano, chegam também as últimas levas de pagamento do auxílio emergencial, o benefício mensal de R$ 600 e, depois, de R$ 300 pago a cerca de 50 milhões de brasileiros ao longo dos últimos nove meses.
Destinado a amparar famílias e trabalhadores informais de baixa renda durante a freada sem precedentes da economia causada pela pandemia, o programa social chegou a ser prorrogado duas vezes pelo governo.
Começou em abril previsto em três parcelas mensais de R$ 600, ganhou depois mais duas de R$ 600 e, por fim, foi estendido pelos últimos quatro meses do ano, mas em valor menor, de R$ 300.
Os pagamentos de dezembro, até segunda ordem, serão de fato os últimos. Sem de onde mais tirar recursos, tanto o presidente Jair Bolsonaro quanto seu ministro da Economia, Paulo Guedes, têm reafirmado repetidamente que o programa extraordinário acaba junto com 2020. “Nossa capacidade de endividamento está no limite”, disse Bolsonaro ontem quando perguntado sobre o assunto.
É virtualmente impossível encontrar um economista, político ou eleitor que discorde da importância que a injeção bilionária de recursos do auxílio teve para evitar o debacle da economia neste ano e, em última instância, impedir que milhões de brasileiros despencassem na pobreza.
O problema é que o programa de ajuda termina deixando uma dívida enorme a ser paga pelo governo, o que torna a decisão por novas prorrogações especialmente difícil.
Com seu fim iminente, todos os problemas que o auxílio ajudou a amenizar em 2020 voltam a atormentar em 2021. É o caso da renda e o do desemprego, que, sem o suporte do benefício, devem acabar pior no próximo ano do que no auge da pandemia.
“Muitos trabalhadores informais que estavam impedidos de trabalhar em 2020, por causa da pandemia, já vão conseguir trabalhar em 2021, mas não vão ter a mesma renda que tiveram em 2020”, explicou o economista Cosme Donato, analista da LCA Consultores Cosme Donato.
Uma estimativa feita pela LCA projeta que a renda total do país deve cair 2% no ano que vem, já desconsiderado o efeito da inflação. Neste ano, à despeito de uma das piores recessões da história, a renda total cresceu em cerca de 3%, nas estimativas da consultoria, justamente por causa do auxílio.
A conta considera a massa de rendimentos total, isto é, tudo o que todas as pessoas ganham somado, incluindo a renda do trabalho e a renda de outras fontes, como aposentadorias e Bolsa Família.
Uma redução nessa grande massa de renda significa menos dinheiro circulando no país, o que puxa o consumo e o crescimento da economia para baixo.
O desemprego, por sua vez, medido pela quantidade de pessoas que estão procurando trabalho, também deve continuar crescendo e renovando os recordes que já conquistou neste ano, conforme mais pessoas perdem o auxílio sem terem antes conseguido retomar suas outras fontes de renda.
“Os números atuais podem dar a impressão de que vivemos uma bonança, mas temos um cenário bem complicado pela frente”, disse o superintendente de pesquisas macroeconômicas do Santander Brasil, Maurício Oreng.
Ele menciona os ritmos surpreendentes de recuperação da indústria e do comércio brasileiros, que já vendem hoje mais do que antes da pandemia.
“Eles tiveram impulso de um motor que é temporário, acontecendo à base de endividamento público, mas não é esse o fundamento da economia. É uma situação irreal, e será no ano que vem que veremos qual é essa realidade”, diz Oreng.
Desemprego “real” e recorde
Nas estimativas do Santander, o desemprego deve passar dos 16% até o fim do primeiro semestre, podendo depois melhorar um pouco e fechar o ano perto dos 15%.
Qualquer dos dois números, porém, será a pior taxa já registrada no país desde pelo menos 2012, ano em que começa a série feita pelo Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
No fim de 2019, pouco menos de 12% dos trabalhadores brasileiros procuravam emprego. Em setembro, esse número tinha subido para 14,6% – também um recorde.
Muitos economistas estimam, porém, que a “taxa real” do desemprego atual seria algo muito mais próximo dos 20%, proporção que a história brasileira nunca viveu antes.
Isto porque, entre as várias distorções econômicas e sociais criadas pela pandemia, um número enorme de brasileiros deixou de procurar emprego, mesmo não tendo trabalho – seja porque não tinham como sair à rua para exercer sua atividade, seja porque estavam recebendo o complemento do auxílio e adiaram a busca.
Conforme a economia volta a se movimentar, muitos desses conseguem se recolocar ou retomar suas atividades, mesmo que parcialmente, mas milhares de outros não. São estes que devem engrossar as estatísticas dos desempregados no ano que vem.
“Há um cenário de recuperação, mas ela não vem de imediato”, disse Oreng, do Santander. “Então o mercado de trabalho ainda vai piorar antes de melhorar.”
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