Baleia e Lira apostam em traições na Câmara
Foto: Leonardo Sá/Agência Estado
A menos de um mês para a eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, os principais concorrentes, Arthur Lira (PP-AL) e Baleia Rossi (MDB-SP), articulam para conseguir os votos necessários para conduzir a casa nos próximos dois anos. A eleição acontece no dia 1º de fevereiro, quando termina o recesso parlamentar.
O posto tem prerrogativas que atraem a mobilização e atenção das forças políticas do parlamento, em busca de influenciar seu ocupante — que tem o poder de decidir sobre a pauta de votação na Casa e até sobre a admissão de pedidos de impeachment contra o presidente da República.
O candidato de Jair Bolsonaro (sem partido) é Arthur Lira, enquanto o principal padrinho de Baleia é o atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Como nem o círculo próximo do presidente nem os principais aliados de Maia, são suficientes para eleger, sozinhos, o comandante da Casa, ambos buscam ampliar o leque de apoios e estimulam “traições” no campo adversário.
Se pudesse contar com a fidelidade indubitável dos integrantes dos partidos que o apoiam, Baleia Rossi poderia se considerar eleito. O bloco de partidos em torno do deputado paulista é formado por DEM, MDB, PSDB, PSL, Cidadania, PV, PT, PSB, PDT, Rede e PCdoB. Juntas, essas legendas somam 281 parlamentares — mais do que os 256 votos necessários para a vitória.
Observando apenas as legendas, seria uma aliança elástica que vai do governador de São Paulo João Doria (PSDB) ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), passando por alguns dos mais antigos aliados do presidente Jair Bolsonaro, abrigados no PSL.
No entanto, o apoio consolidado desses partidos a Baleia Rossi está longe de ser a realidade do momento, considerando que para o comando da Câmara a eleição é individual e, o mais importante, secreta.
Em uma frase clássica, Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte de 1988, diz que “o voto secreto dá uma vontade danada de trair”. É com isso que ambos os candidatos contam.
Até o momento, Baleia enfrenta as maiores ameaças de dissidência. Apesar de ter conquistado o apoio oficial do PT, partido com a maior bancada na Câmara (52 deputados), o emedebista enfrenta muita resistência na legenda. A votação que definiu o apoio a Baleia foi apertada, 27 a 23. Ou seja, 23 deputados podem debandar para o bloco de Lira.
Muitos petistas o acusam de ter participado do que consideram “golpe” que levou ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Outros querem que Baleia se comprometa a aceitar pedido de impeachment de Bolsonaro.
No PSL, 32 deputados do ex-partido de Bolsonaro declararam apoio a Lira, em queda de braço com o comando do partido, que decidiu pelo apoio a Baleia. Esses parlamentares se recursam a apoiar um candidato que tem apoio de partidos de esquerda, como PT e PC do B. A direção do PSL pretende punir os dissidentes, mas isso não teria efeito prático para o emedebista. Como o voto é secreto, nenhum acordo pode garantir resultado.
Mesmo o DEM de Maia tem defecções, como o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), que está em caravana pelo país com o candidato alagoano.
Na sexta-feira (8), em entrevista à CNN, Lira evitou o rótulo de “candidato do governo” e acenou também à esquerda. “O diferencial da nossa campanha é que nós temos contato direto com os deputados, independente de partido e independente de tendência, de centro, de direita ou de esquerda”, disse.
Contando com os partidos que o apoiam oficialmente, o candidato do PP reúne 206 deputados, em um bloco formado por PP, PSD, PL, Solidariedade, Avante, Republicanos, Patriota, Pros, PSC e PTB. Entre os indefinidos, estariam Novo, Podemos e PSOL, que somam 26 deputados.
Não é só Arthur Lira que está cobiçando os aliados do próximo. Além de defender a própria base, o deputado Baleia Rossi também busca arregimentar novos aliados. Entre os partidos hoje na seara de Lira, estão muitos dos que construíram uma relação de confiança e articularam vitórias para o grupo político de Maia — como Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), próximo a Maia e do mesmo partido de Lira, que já anunciou apoio ao emedebista.
O Palácio do Planalto monitora os movimentos do ex-presidente Michel Temer (MDB), com um longo histórico de articulações vitoriosas na Câmara. Quando deputado, Temer comandou três vezes a Câmara (de 1997 a 1999; 1999 a 2001 e 2009 a 2010). Já presidente, conseguiu derrubar duas denúncias criminais apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Temer tem dito que não entrou nem entrará na campanha de Baleia Rossi. No entanto, segundo o colunista da CNN Caio Junqueira, o governo Bolsonaro recebeu relatos de que o ex-presidente telefonou para deputados pedindo votos para Rossi, que considera Temer seu padrinho político e chegou ao comando do MDB chancelado por ele.
O que pensam os candidatos
Na entrevista à CNN, Arthur Lira mirou em Rodrigo Maia para atacar Baleia Rossi.
O discurso de campanha do deputado do PP é o de que a gestão de Maia é “centralista”, com o atual presidente da Câmara decidindo sozinho o que entra e o que não entra na pauta da Casa. Lira promete, se eleito, compartilhar essas decisões com os líderes dos partidos.
Ao acenar por essa “gestão compartilhada”, pode atrair parlamentares da esquerda, que enxerguem nesse discurso a possibilidade de votar temas que não coadunam com a pauta liberal do atual presidente da Câmara.
Já Baleia Rossi retoma um discurso comum aos deputados que concorrem mais afastados do Poder Executivo: o de que a Câmara não pode ser uma espécie de “puxadinho” do Palácio do Planalto. Para o deputado do MDB, a eleição de Arthur Lira facilita ao presidente Jair Bolsonaro colocar a sua vontade para valer no Congresso Nacional.
Entre as vontades de Bolsonaro estariam aquelas que não andaram na primeira metade do seu mandato, como a ampliação do excludente de ilicitude, das hipóteses para o porte e a posse de armas e a PEC que trata do voto impresso em 2022. Evitar que essas pautas andem é um dos argumentos de Baleia para manter o apoio dos parlamentares de oposição.
Em comum, os dois candidatos mantém uma relativa proximidade com a agenda liberal na economia do governo Bolsonaro, sendo que Baleia Rossi chega a ter até uma taxa de governismo maior que a de Arthur Lira, segundo levantamento da consultoria Arko Advice.
Perfil
Arthur Lira é deputado federal pelo Progressistas (PP) de Alagoas desde 2011. Antes, foi deputado estadual de Alagoas por três mandatos e vereador em Maceió (AL) por outros dois mandatos. Filiado ao PP em 2009, pertenceu antes ao PFL (atual DEM), PSDB, PTB e PMN.
Baleia Rossi é deputado federal pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB) de São Paulo desde 2015. Antes, foi deputado estadual de São Paulo por três mandatos e vereador em Ribeirão Preto (SP) também por três mandatos. No MDB desde 1992 (então PMDB), é presidente nacional do partido desde 2019.
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