Congresso aumenta pressão pela demissão de Ernesto Araújo

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Foto: Evaristo Sá/AFP

A saraivada de críticas, acentuada nos últimos dias, contra o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, tornou insustentável a permanência dele no comando da pasta. A atuação do chanceler é apontada — em especial, pelos presidentes da Câmara e do Senado e até o Centrão, base de apoio do governo — como o principal obstáculo diplomático para o Brasil receber de outros países os insumos necessários à vacinação em massa contra a covid-19, que segue em ritmo lento. Se for demitido, será o segundo ministro a cair, neste ano, no contexto da pandemia, depois do ex-titular da Saúde Eduardo Pazuello.

Ontem, foi a vez de o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), elevar o tom contra Araújo. Ele afirmou que há uma frustração, por parte da maioria dos senadores, com o trabalho do titular do ministério. “Mas, muito além da personificação ou do trabalho específico de um chanceler, o que tem que se mudar é a política externa do Brasil. Precisa ser aprimorada, melhorada”, disparou. “As relações internacionais têm de ser mais presentes, em um ambiente de maior diplomacia. Isso está evidenciado a todos. Não só no Congresso Nacional, mas todos os brasileiros que enxergam essa necessidade de o Brasil ter uma representatividade externa melhor do que tem hoje.”

Segundo Pacheco, cabe ao presidente decidir o melhor nome para chanceler, “se é o ministro atual, se é outro”. “Considero que tivemos muitos erros no enfrentamento da pandemia, um deles foi o não estabelecimento de uma relação diplomática de produtividade com diversos países que poderiam ser colaboradores neste momento agudo de crise. Está em tempo de mudar para salvar vidas”, pregou. “Perdemos muitas vidas no Brasil em razão de uma conjuntura muito variada, não é responsabilidade única de alguém ou de um ministério. É um problema nacional, e precisamos, agora, mudar o rumo dessa política externa para termos parcerias internacionais.”

Pacheco deu as declarações um dia depois de o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), repreender Araújo pelos ataques à China e por ter estremecido as relações com os Estados Unidos — ele fez campanha pela reeleição de Donald Trump contra Joe Biden. Um dos pitos ocorreu no encontro de quarta-feira durante a instalação do comitê de combate à covid-19. O deputado cobrou diretamente do chanceler uma melhora no diálogo com países produtores de vacinas e insumos e disse que o momento é de pedir ajuda aos parceiros internacionais. Ele citou, por exemplo, os Estados Unidos e a China. “Pandemia é vacinar, sim, acima de tudo, mas, para vacinar, temos de ter boas relações diplomáticas, sobretudo com a China, nosso maior parceiro comercial e um dos maiores fabricantes de insumos e imunizantes do planeta”, enfatizou. Depois, em sessão plenária da Casa, Lira avisou que estava “apertando um sinal amarelo para quem quiser enxergar”, em razão de “erros primários, erros desnecessários” cometidos “fora daqui” na condução da crise sanitária. Afirmou, ainda, que o Congresso poderá adotar “remédios amargos ou fatais” ante as falhas do governo no enfrentamento à doença. Em uma tentativa de seguir no cargo, Araújo reuniu-se com Lira ontem.

O chanceler, cuja demissão já vinha sendo defendida por setores do Congresso desde o ano passado, ficou em situação ainda mais complicada depois de o discurso de Lira ter sido interpretado por aliados do Executivo como um aceno de que o parlamentar poderia dar encaminhamento a pedidos de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro. Há quase 70 requerimentos dessa natureza aguardando análise do presidente da Câmara, a maioria acusando o chefe do Planalto de cometer crimes de responsabilidade durante a pandemia.

Os bombeiros do Planalto tentam passar a ideia de que o recado de Lira não é tão duro. Seria uma sinalização clara da necessidade de trocar o ministro. Vice-líder do governo na Câmara, Evair Melo (PP-ES) afirmou que o Executivo não trabalha com a hipótese de tirar Araújo. Mas, “se acontecer, é coisa da rotina”, emendou, lembrando que todos em cargos que lidam com a pandemia estão sendo cobrados. Para o parlamentar, o chanceler lidou com situações complexas no âmbito da crise sanitária e, ainda que haja alguma mudança, “a vida continua”. “O mundo não vai mudar de rotação”, ironizou.

Uma eventual demissão de Araújo, que também é pleiteada por banqueiros e empresários, deve ser um processo bastante difícil para Bolsonaro, que resiste à possibilidade. O chanceler faz parte da ala de extrema direita do governo, por meio da qual o presidente mantém mobilizada a base bolsonarista mais radical.

Nos últimos meses, os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), têm sido pressionados, dentro e fora do Congresso, a tomar providências contra as falhas do governo no enfrentamento da pandemia. Enquanto na Câmara a pressão é pelo impeachment de Bolsonaro, no Senado é pela instalação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para apurar ações e omissões do Executivo na crise sanitária. As assinaturas para o colegiado já foram obtidas, e a instalação só depende da autorização de Pacheco. As pressões colocam ambos contra a parede, pois os mandatários das duas Casas se elegeram com o apoio do Planalto.

Em postagem no Twitter, ontem, a mulher de Ernesto Araújo, Maria Eduarda Seixas Corrêa, defendeu o chanceler. “Estão tentando transformar meu marido em bode expiatório da República. Patético. Aguenta firme, meu amor. #NinguemMexeComErnesto”, escreveu. Araújo retuitou e escreveu uma passagem bíblica: “O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta… Assim, permanecem agora estes três: a fé, a esperança e o amor. O maior deles, porém, é o amor. (1 Coríntios 13:6-13)”.

Correio Braziliense

 

 

 

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