Golpismo de Bolsonaro é medo da derrota
Foto: Orlando Brito/Reprodução
O compromisso dos militares brasileiros com a democracia será testado novamente – desta vez, depois que o presidente Jair Bolsonaro demitiu o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, e cobrou do seu substituto, general Braga Neto, a troca do comandante do Exército, general Edson Leal Pujol.
Se quiserem ficar nos seus postos, ficarão os atuais comandantes da Marinha, almirante Ilques Barbosa, e da Aeronáutica, brigadeiro Antônio Carlos Bermudez. Do contrário sairão, cabendo ao Estado Maior de cada Arma indicar seus sucessores. Os nomes ainda terão de passar pelo crivo de Bolsonaro.
Azevedo e Silva perdeu o lugar porque resistiu nos últimos meses a várias tentativas do presidente da República de aparelhar politicamente as Forças Armadas. Fazia tempo que Bolsonaro pedia a cabeça de Pujol que sempre manteve o Exército a salvo dos seus delírios. Azevedo e Silva preservou Pujol.
Bolsonaro pediu a cabeça do general Paulo Sérgio, responsável pelo setor de Recursos Humanos do Exército, que em entrevista ao jornal Correio Braziliense defendeu medidas de isolamento social, elogiou a Organização Mundial de Saúde e falou sobre o índice de mortalidade da Covid que é bem mais baixo entre os fardados.
A entrevista deixou o presidente furioso. Acostumado a ver fantasmas onde eles não existem, Bolsonaro achou que ela era mais uma peça da conspiração para derrubá-lo. Azevedo e Silva negou-se a afastar o general. Segundo confessou a amigos, estava de saco cheio das “loucuras” do seu chefe, e de ter de aturá-lo.
O que mais pesou na sua queda, porém, foi a recusa em promover um alinhamento automático das Forças Armadas ao projeto de Bolsonaro de permanecer no poder mesmo se derrotado ano que vem. Em mais de uma ocasião, Bolsonaro disse ao ministro que o Exército deve estar pronto para “o agravamento da situação”.
Admitiu que o número de mortos pela Covid vai seguir aumentando e que isso poderá deflagrar saques a lojas e produzir levantes populares país a fora. Talvez ele então se visse forçado a adotar providências severas contra a anarquia – entre elas, o Estado de Sítio. Azevedo e Silva discordou da ideia.
Nada de estranho há na pretensão de Bolsonaro, basta que se consulte sua extensa folha corrida. À época de soldado, planejou detonar bombas em quartéis em reivindicação por melhores salários. Processado, fez um acordo para sair do Exército desde que com o título de capitão, e assim se deu.
Como deputado federal durante quase 30 anos, defendeu o golpe de 64 que amanhã aniversaria, a ditadura militar, a tortura e o assassinato de opositores do regime. Lamentou que pelo menos 30 mil deles não tivessem sido mortos. Por ele, até mesmo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso teria sido fuzilado.
Como presidente da República, passou a pregar em quartéis e fora deles o armamento dos brasileiros, e a facilitar a posse de armas. Só um povo armado jamais será escravizado, repetiu e ainda repete. Apostou errado na condução da pandemia. Está perdendo apoio de sua base mais fiel, hoje reduzida a 15% dos eleitores.
Agora, vê-se ameaçado de não se reeleger. Pensava que não seria difícil bater um candidato do PT. Não contava que esse candidato poderia ser Lula que, de dentro da cadeia há dois anos, o derrotava em todas as pesquisas de intenção de voto. O golpista que sempre foi dá sinais de desespero e volta a orientar suas ações.
Entregou ao Senado a cabeça do embaixador Ernesto Araújo, mas pôs em seu lugar o copeiro do Palácio do Planalto, amigo seu e dos seus filhos. Chefe de cerimonial é chamado no Itamaraty de copeiro. Na dança de cadeiras entre ministros, abriu uma vaga para o Centrão na Secretaria de Governo.
Ali será alojada Flávia Arruda (PSL-DF), a ex-personal trainer de José Roberto Arruda, o ex-governador do Distrito Federal que se envolveu no escândalo do mensalão do DEM e acabou preso por dois meses. Casada com ele, Flávia é deputada federal de primeiro mandato. Funcionará como uma despachante do Centrão.
Da Advocacia Geral da União foi retirado o titular para dar vez a André Mendonça, que era ministro da Justiça. Mendonça volta ao posto de onde saiu para que o ministério seja ocupado por mais um fiel servidor da família Bolsonaro, um delegado da Polícia Federal, no momento Secretário de Segurança Pública.
São movimentos que traem a fragilidade do presidente, o quanto está isolado, e seu empenho em não perder de todo a autoridade que o cargo lhe confere. Todos os militares são de direita e votaram em Bolsonaro. Nem todos votarão outra vez. Mas, por serem de direita, não se pode concluir que a maioria seja golpista.
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