PT começa interlocução com empresariado

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Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

Após uma convivência harmônica durante a maior parte do período em que esteve no poder, o PT viu o empresariado e o mercado financeiro se afastarem do partido com o impeachment de Dilma Rousseff e a Lava-Jato. A operação, inclusive, dragou o principal interlocutor da sigla nesse meio, o ex-ministro Antonio Palocci, que virou delator. Nos últimos meses, a legenda tem tentado reconstruir as pontes.

O primeiro discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva após recuperar os direitos políticos, no último dia 10, acelerou esse movimento. Aliados do líder petista têm conversado, principalmente, com o setor produtivo. Depois de sua fala, Lula também passou a receber recados do empresariado por meio de outros petistas. Um deles veio de Josué Alencar, do Grupo Coteminas, filho do ex-vice-presidente José de Alencar. Gomes é candidato único à presidência da Fiesp apoiado pelo hoje bolsonarista Paulo Skaf, atual líder da entidade.

Em resposta às mensagens que tem recebido dos empresários, Lula tem dito, em linha com o discurso feito 11 dias atrás, que a sua credencial para não dar margem a instabilidades é a sua gestão entre 2003 e 2010. Um dirigente do PT diz que um eventual governo Lula não promoveria radicalismos, muito menos na economia.

O mesmo dirigente petista diz que “muita gente virou a cara” para o PT e talvez o “empresariado hoje pode ser mais hostil” do que no passado. Mesmo assim, está descartada uma nova versão da carta ao povo brasileiro de 2002, documento apresentado antes da campanha presidencial daquele ano para acalmar o mercado.

Um grupo de empresários e executivos do setores produtivo e financeiro que, na eleição de 2018 divulgou um manifesto de apoio ao candidato do PSOL em São Paulo, Guilherme Boulos, planeja ter uma reunião com Lula em breve.

Dirigentes de entidades da indústria relataram terem sido procurados pelo entorno do petista. Uma das estratégias é a aproximação por meio de dirigentes sindicais. Outra, é convidar industriais e presidentes de associações setoriais, em sua maioria distantes do PT e mais próximos de Paulo Guedes. Um desses dirigentes diz que um número expressivo de presidentes de entidades prefere um candidato da terceira via, embora não descarte se aproximar do PT. Por receio de contrariar o governo Bolsonaro, empresários mostram receio em manifestar publicamente disposição de dialogar com Lula.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirma que devem ser procurados micro e pequenos empresários.

— Ele (Lula) sabe que gerar emprego e renda passa por uma conversa com o setor empresarial.

Os petistas que conseguiram manter alguma ponte com o empresariado depois da turbulência dos últimos anos foram o ex-prefeito Fernando Haddad, o senador Jaques Wagner (BA) e o ex-senador Jorge Viana (AC). Os ex-ministros Nelson Jobim e Walfrido dos Mares Guia, que não são filiados à sigla, também são vistos no PT como pessoas que podem ajudar a fazer pontes com o empresariado, mas eles negam estarem empenhados nessa missão.

Um consultor com trânsito em vários setores da economia afirma que o discurso de Lula foi “visto como uma versão oral da carta ao povo brasileiro”. O setor produtivo e investidores estrangeiros avaliaram bem a fala, mas há resistência no varejo e mercado financeiro.

Uma executiva de um banco estrangeiro conta que o economista-chefe da instituição avaliou, em uma reunião interna, o discurso como coerente com a gestão de Lula. O entendimento é que acenos mais à esquerda, como a ameaça de reestatizar a BR Distribuidora e os ataques à autonomia do Banco Central, são esperados, mas que, caso eleito, ele adotaria o pragmatismo.

Outra dirigente de instituição financeira concorda com a análise, mas diz que, para se conectar ao empresariado, Lula precisa de uma proposta clara de combate à corrupção.

O Globo