Brasil torrou R$ 9 bi em hospitais militares após o golpe de 2016

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Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Hospitais militares custaram pelo menos R$ 9,2 bilhões nos últimos cinco anos ao contribuinte brasileiro. Esse é o valor liquidado informado para as unidades médicas das Forças Armadas no Siga Brasil, portal do Senado no qual é possível consultar a execução do orçamento público. Esse valor é todo de recursos federais. Além dos R$ 9,2 bilhões de verba pública, as unidades também recebem aportes de todo militar, da ativa ou da reserva. Eles têm um desconto em folha de 2,5% para custear assistência à saúde.

O total gasto pela União, entretanto, pode ser maior, porque o Siga não revela valores de diversas instituições militares. Os sites da Aeronáutica, do Exército e da Marinha listam 55 hospitais, policlínicas e outras instituições de saúde, mas o Siga não retorna os dados de todos eles. As consultas realizadas pelo (M)Dados, núcleo de jornalismo de dados do Metrópoles, obtiveram resultados para 45 estabelecimentos – nenhum deles da Força Aérea, por exemplo.

As informações no Siga foram acrescidas às dos Hospitais das Forças Armadas (HFA) disponibilizadas no portal de dados públicos da União.

Não é possível fazer uma comparação com o sistema público de saúde tradicional – porque os militares pagam uma contribuição específica para atendimento – nem com o sistema privado normal – considerando que a União precisa cobrir parte dos gastos excedentes de manutenção, mas o financiamento dos hospitais das Forças Armadas ganhou atenção pública após o Tribunal de Contas da União (TCU) determinar a divulgação da quantidade de leitos disponíveis para ajudar no combate à pandemia de Covid-19.

O problema estaria na reserva de leitos nessas unidades para militares e familiares. Com lugares vagos em algumas instituições, enquanto sistemas de saúde colapsam pelo Brasil, o mecanismo ficou sob escrutínio público.

A União tem atualmente 360 mil militares na ativa. Essa é apenas parte do público atendido nas unidades das Forças Armadas, já que a assistência se estende aos servidores na reserva e aos familiares. O Sistema de Atendimento Médico-hospitalar aos Militares do Exército e seus Dependentes (Sammed) atende cerca de 750 mil pessoas.

Questionado, o Ministério da Defesa apontou que “os hospitais militares não fazem parte do Sistema Único de Saúde (SUS) e atendem 1,8 milhão de usuários da família militar (militares da ativa, inativos, dependentes e pensionistas), em sua maioria idosos, que contribuem de forma compulsória todos os meses para os fundos de saúde das Forças Armadas”.

Já o SUS é o sistema de saúde universal, que atende cerca de 71,5% da população brasileira, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Isso significa que mais de 150 milhões de pessoas dependem do serviço – que é muito mais amplo no escopo de atendimentos, que vai de vacinas e postos de saúde a procedimentos de alta complexidade.

Em 2020, todo o SUS recebeu investimento de R$ 150 bilhões.

O Ministério da Defesa nega a existência de leitos sendo “desperdiçados”. A reserva aconteceria apesar de parte do custeio dessas instituições vir do Orçamento Federal, cujos recursos advêm da arrecadação de impostos de todos os contribuintes. Além disso, os militares têm se posicionado em diversas ações de combate à pandemia de Covid-19 no Brasil.

Por conta disso, pelo menos 41 mil servidores das Forças Armadas foram contaminados pela doença, levando a incidência na corporação para um número superior a 11%. Essa taxa é quase quatro vezes maior do que a verificada na população em geral.

“As Forças Armadas seguem atendendo à população civil, especialmente as comunidades indígenas e ribeirinhas, tanto na Amazônia como no Pantanal, realizando evacuação de pacientes nas regiões mais críticas, transportando toneladas de oxigênio, medicamentos e suprimentos, transportando, montando e operando hospitais de campanha, além de, em parceria com a academia e com a indústria, fabricando respiradores”, disse, em nota, o Ministério da Defesa.

Questionada sobre a quantidade de recursos do orçamento destinados aos seus hospitais, a Marinha respondeu que atende 350 mil pessoas em seu sistema assistencial. As unidades desse sistema não integram “nem o sistema privado de saúde (Saúde Suplementar), nem o sistema público de saúde – o Sistema Único de Saúde (SUS) e, por essa razão, o acesso aos hospitais é restrito, por disposição legal, aos militares e seus dependentes”.

São eles que, prossegue a nota “financiam esse sistema, mediante contribuições mensais de militares para os fundos de saúde, indenizações de atos médicos, paramédicos e serviços afins e com a receita oriunda da produção e venda de medicamentos”. Por fim, a Marinha aponta que “os recursos empregados nos hospitais militares estão disponíveis para livre acesso no Portal da Transparência do Governo Federal”.

A Defensoria Pública da União (DPU) pediu na Justiça Federal a liberação de vagas em hospitais militares de Brasília para a população em geral. O sistema do governo do Distrito Federal que informa a ocupação de leitos não tem dados sobre as unidades das Forças Armadas na capital.

O professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Piscitelli tem uma posição crítica em relação ao assunto. “Esses hospitais estão destinados a uma casta”, resumiu. “O tratamento do militar é privilegiado no Brasil, o que causa uma enorme contrariedade, na medida em que eles possam ser considerados servidores da administração de um país pobre, carente, com tantas limitações econômicas e financeiras.”

Em nota divulgada em 7/4, o Ministério da Defesa disse que “a grande maioria dos hospitais militares está com quase todos os leitos de UTI ocupados. Na realidade, muitos hospitais militares têm frequentemente removido pacientes para outras regiões para evitar o colapso. Assim como os hospitais civis, a situação varia de acordo com cada região. Os números são críticos e evoluem diariamente”.

Pisicitelli compara a situação dos hospitais militares com os outros estabelecimentos públicos de saúde. “Eles não têm os desafios que enfrentam hoje os hospitais públicos. E em vez de se colocarem, como seria lógico, a serviço da população de um modo geral, dão atendimento exclusivo e especial para determinada categoria e seus dependentes. Isso por si só já me parece um privilégio inadmissível”, concluiu.

A nota da Defesa aponta que “os hospitais militares não fazem parte do Sistema Único de Saúde (SUS) e que atendem 1,8 milhão de usuários da família militar (militares da ativa, inativos, dependentes e pensionistas), em sua maioria idosos, que contribuem de forma compulsória todos os meses para os fundos de saúde das Forças Armadas”.

Essa contribuição é feita diretamente da folha de pagamento do pessoal militar, e corresponde a 2,5% do soldo. Os recursos assim amealhados, entretanto, não são suficientes para custear toda a estrutura, daí a necessidade de receitas do orçamento público geral.

A instituição militar de saúde que mais recebeu recursos nos últimos cinco anos, de acordo com os dados do Siga Brasil, é o Hospital Naval Marcilio Dias, localizado no Rio de Janeiro: R$ 1,1 bilhão, valor liquidado entre 2016 e 2020.

Metrópoles

 

 

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