Centro-direita e PT disputam evangélicos com Bolsonaro
Foto: Amanda Perobelli/Reuters – 10/3/2021
Dias atrás, o presidente Jair Bolsonaro mobilizou o governo para tentar uma decisão favorável do Supremo Tribunal Federal (STF) à abertura de templos religiosos na pandemia. Foi derrotado. Mas, ao tentar, ganhou pontos com chefes das principais igrejas evangélicas do País, que o apoiam na disputa das eleições 2022. Do outro lado do espectro político, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), virtual adversário de Bolsonaro após a Corte invalidar ontem suas condenações na Lava Jato, tenta falar diretamente aos fiéis e se aproximar de igrejas independentes. Entre os dois pólos, candidatos de centro trabalham na aproximação com o segmento.
Apresentador de TV e possível candidato, Luciano Huck pediu a auxiliares que estudassem formas de aproximá-lo do eleitorado evangélico. Outro possível postulante em 2022, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), ainda não destacou ninguém para tratar do assunto.
Interlocutores do chamado Pólo Democrático – grupo que reúne seis possíveis candidatos à Presidência, inclusive Huck e Doria – dizem que há a ideia de fazer um “amplo debate” com os evangélicos. No entanto, afirma um dos integrantes do grupo, ainda “vai chegar a hora” de avançar nessa articulação. O grupo lançou um manifesto em defesa da democracia no fim de março, que também foi assinado pelo ex-governador do Ceará, Ciro Gomes (PDT); pelo ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM); pelo governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB); e pelo ex-candidato do partido Novo à presidência em 2018, João Amoedo.
Após a decisão do Supremo, o próprio Jair Bolsonaro voltou a defender a abertura dos templos. “Geralmente, o cara quando está em uma situação depressiva procura a Deus. E ele procura onde? Na Igreja. No templo. E o templo está fechado”, afirmou em entrevista ao canal de TV CNN Brasil.
“Por enquanto, não tem ninguém que possa fazer frente a Bolsonaro no mundo evangélico. Ninguém”, diz o pastor e psicólogo Silas Malafaia, que lidera desde 2010 a Assembleia em Deus Vitória em Cristo. “Eu conheço essa turma toda, as grandes lideranças (evangélicas). Não conheço um líder desses que esteja conversando com outro (pré-candidato) ou apoiando outro”, disse Malafaia ao Estadão. “Das grandes lideranças, 99% apoiam Bolsonaro.”
Malafaia cita os pastores José Wellington Bezerra da Costa e Manoel Ferreira (Assembleia de Deus), Edir Macedo (Igreja Universal do Reino de Deus), R.R. Soares (Igreja Internacional da Graça de Deus) e Valdemiro Santiago (Igreja Mundial do Poder de Deus) como apoiadores de Bolsonaro, entre outros. Malafaia é próximo do presidente e esteve com o mandatário no Palácio do Planalto pela última vez no dia 15 de março. “A turma vai apoiar o presidente, irmão”, disse ele. Como revelou o Estadão, pesquisa IPEC divulgada no mês passado, com foco no potencial de votos de cada presidenciável, confirma que a maioria dos simpatizantes de Bolsonaro (53%) são evangélicos.
Segundo o deputado e teólogo Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), o presidente não precisa mais dar provas de seu comprometimento com as pautas dos evangélicos como fez ao pedir a abertura dos templos. “Sabemos da luta ideológica dele”, disse o deputado. “Ele fez jus à fidelidade eleitoral dos evangélicos. Não foi surpresa a ação dele de colocar o governo para lutar por isso (manter os templos abertos)”, disse Sóstenes, que é ligado a Malafaia.
Malafaia diz que Bolsonaro tem apoio entre os evangélicos por ter defendido pautas caras aos religiosos — contra o aborto e a união civil de pessoas do mesmo sexo, por exemplo — durante anos. Para ele, candidatos que tentam se aproximar dos evangélicos “seis meses antes das eleições” estão condenados ao fracasso. “Esse tempo (em que essa tática funcionava) acabou”, disse.
Aproximação. Presidente nacional do Cidadania, o ex-deputado e ex-ministro da Cultura Roberto Freire tem mantido conversas com o apresentador Luciano Huck, de quem espera uma resposta sobre a candidatura. Para Freire, Huck deu um passo em direção à candidatura ao assinar o manifesto pela democracia com outros pré-candidatos, no fim de março. “Se ele estivesse pensando em desistir, não teria assinado”, afirmou Freire.
“O diálogo tem de ser com todas as religiões. Estamos disputando a Presidência da República, não o papado”, disse Freire. “O tratamento será de profundo respeito com todos. Estamos abrindo conversas com todos (os segmentos religiosos).”
Outro signatário da carta pró-democracia, o governador de São Paulo João Doria (PSDB) ainda não começou conversas com os evangélicos — ele atraiu a fúria dos chefes das igrejas ao reconhecer o caráter de atividade essencial dos templos em decreto do dia 1º de março, e determinar o fechamento das igrejas logo depois, no dia 11 do mês passado. “O governador não está cuidando deste assunto. Ele está cuidando da questão da vacinação (…). Não está trabalhando essa questão de candidatura, embora seja estimulado por A, B, ou C. Mas não está gastando energia nessas conversas”, diz o ex-deputado tucano e ex-governador da Bahia Antônio Imbassahy, que hoje é secretário especial do governo paulista e chefe do Escritório de Representação do Estado de São Paulo em Brasília.
Enquanto Bolsonaro tem o apoio de pastores, o ex-presidente Lula (PT) aposta num caminho diferente: falar diretamente com os fiéis e com os pastores de igrejas independentes, que não são ligadas a nenhuma grande congregação. O partido planeja um encontro nacional de evangélicos da legenda — o terceiro do tipo na história do PT — para o segundo semestre deste ano.
Até então fora da disputa de 2022, Lula recuperou seus direitos políticos, no começo de março, com decisão liminar (provisória) do ministro Edson Fachin (STF), confirmada, ontem, pelo plenário da Corte por 8 votos a 3. A Corte reconheceu a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, então comandada pelo ex-juiz Sergio Moro, para julgar casos relacionados ao petista. Logo após a decisão de Fachin, num primeiro discurso no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Lula fez uma provocação aos grandes pastores. “O papel das igrejas é ajudar a orientar as pessoas, não é vender grão de feijão ou fazer culto cheio de gente sem máscara”, disse.
Era uma referência ao pastor Valdemiro Santiago (da Igreja Mundial do Poder de Deus), que é investigado pelo Ministério Público Federal por supostamente vender feijões com poderes “mágicos” contra a Covid-19 — a igreja nega e diz que a semente de feijão é só uma “figura de linguagem” para representar o “propósito com Deus”.
“Lula não tem absolutamente nada contra nenhuma organização, grande ou pequena. O que ele fala é o seguinte: fora do púlpito da igreja, nós, como militantes, temos o direito de conversar com pessoas de todas as religiões (…). Nunca procuramos o apoio dos líderes. ‘Você é pastor, eu quero o seu apoio’. Não é assim. Nós vamos para o processo de convencimento, de militância. Cada um fala com os seus iguais”, diz a deputada federal e ex-governadora do Rio de Janeiro Benedita da Silva — fiel da igreja presbiteriana, ela é uma das principais líderes evangélicas do PT.
Benedita da Silva diz ainda que as igrejas evangélicas — especialmente as neopentecostais — possuem muitos fiéis de menor renda, que foram especialmente beneficiados por políticas sociais da era petista. É este tipo de argumento que os petistas evangélicos pretendem levar para as conversas sobre 2022.
Ariovaldo Ramos é presbítero da Comunidade Cristã Reformada em São Paulo e Coordenador da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito. Segundo ele, o eleitorado evangélico não segue automaticamente o que desejam os pastores das grandes igrejas. “É um equívoco pensar que os líderes das denominações controlam o voto dos evangélicos. São coisas diferentes. O povo evangélico tem o seu próprio arbítrio e o utiliza, e nem sempre segue as lideranças”, diz ele. Embora não seja filiado a nenhum partido, Ramos é considerado um líder de esquerda dentro do mundo evangélico.
Nos últimos anos, argumenta Ariovaldo, o mundo evangélico sofreu uma mudança: igrejas independentes, que não são ligadas a nenhuma grande denominação, passaram a abranger a maioria dos fiéis. “A igreja é uma unidade, que não pertence a nenhum grupo, não está submissa a nenhuma corrente. Cada unidade decide a sua própria teologia. Acho que (o deputado) Sóstenes (Cavalcante) está pensando ainda com essa categoria da liderança denominacional como decisiva para o voto evangélico. Já não é mais. A maioria está nas igrejas independentes.”
Em 2010, os evangélicos representavam 22% da população do País, segundo a última edição do Censo, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em janeiro de 2020, uma pesquisa do Instituto Datafolha estimou em 31% o percentual de evangélicos no Brasil. Segundo Malafaia e Sóstenes, algo como 80% dos fiéis votaram em Bolsonaro em 2018.
Além do alinhamento com as pautas evangélicas, o governo Bolsonaro tem protestantes em postos-chave: desde junho passado o Ministério da Educação é comandado pelo pastor presbiteriano Milton Ribeiro. Damares Alves, pastora da Igreja Batista, é a titular do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos desde o começo da gestão, em 2019.
A reportagem do Estadão procurou outros pré-candidatos à Presidência da República em 2022, como Ciro Gomes (PDT), mas não houve resposta.
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