Além de Pazuello, Ernesto na CPI também preocupa Bolsonaro

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Foto: Evaristo Sá

Senadores independentes e de oposição preparam a estratégia para forçar o ex-ministro Eduardo Pazuello a dar detalhes das negociações para compra de vacinas e para aquisição de remédios que compõem o chamado tratamento precoce.

Os parlamentares articulam formas de conseguir informações sobre o trabalho do general enquanto esteve à frente do Ministério da Saúde após a decisão do ministro Ricardo Lewandowski de obrigá-lo a falar a verdade sobre terceiros, inclusive em relação ao presidente Jair Bolsonaro, mas com a possibilidade de ficar em silêncio em casos que possam levar à própria incriminação.

Senadores aliados do presidente, por sua vez, temem que esta seja a semana de maior desgaste para o Palácio do Planalto na CPI da Covid —e não apenas por Pazuello.

O depoimento marcado para terça-feira (18) de Ernesto Araújo, ex-ministro das Relações Exteriores, também é considerado preocupante.

A avaliação de correligionários do chefe do Executivo é que os dois ex-ministros têm duas características em comum que botam em risco estratégia traçada para diminuir o desgaste do governo na comissão: falta de habilidade política e temperamento explosivo.

Ernesto era o responsável por manter relações com outros países para compra de insumos necessários no combate à Covid-19 e também com entidades como a OMS (Organização Mundial da Saúde).

O ex-ministro, porém, era da chamada ala ideológica do governo e, enquanto esteve no cargo, fez críticas, por exemplo, à China, uma das maiores fornecedoras do mundo de equipamentos de saúde.

Além disso, também agiu, conforme revelou a Folha, para garantir o fornecimento de cloroquina ao Brasil, remédio recomendado por Bolsonaro e seus aliados para cura do coronavírus, apesar de não ter comprovação científica.

Assim, senadores acreditam que Ernesto poderá fornecer informações importantes e preparar o terreno da CPI da Covid para o dia seguinte, quarta-feira (19), quando ocorrerá o depoimento de Pazuello.

O general do Exército foi alçado ao posto de ministro da Saúde após o chefe do Executivo se desentender com seus dois antecessores, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, que pregavam medidas de contenção da Covid como isolamento social, criticada por Bolsonaro, e se opunham ao tratamento precoce.

No cargo, Pazuello seguiu as ordens de Bolsonaro e ajudou, por exemplo, na distribuição da cloroquina para todo o país. Ele também se aproximou de outro personagem considerado importante por integrantes da CPI para desvendar todos os movimentos do governo que não evitaram a propagação da Covid-19, o empresário Carlos Wizard.

Ele era um dos conselheiros de Pazuello e chegou a ser anunciado como secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos da pasta, mas não assumiu o posto após causar polêmica por insinuar que governadores e prefeitos inflavam o número de mortos para receber mais dinheiro.

Senadores acreditam que Wizard é uma peça importante no tabuleiro e que é necessário apurar a sua influência em relação à disseminação do tratamento precoce e também sobre a ideia de atingir a imunidade de rebanho, em vez de apostar no isolamento e no uso de itens como máscara e álcool em gel.

O senador Humberto Costa (PT-PE) tem defendido a convocação do empresário para depor à CPI. Reuniões ao longo desta semana, porém, ainda devem definir se ele será mesmo convocado.

Em relação a Pazuello, o parlamentar afirma que a estratégia será não fazer questionamentos relacionados ao inquérito que o ex-ministro responde e que apura se ele foi negligente em relação à crise que levou ao colapso do sistema de saúde de Manaus no início de 2021.

“Vamos tentar fazer com que ele fale sobre outros atores com responsabilidade nessa tragédia que estamos vivendo, falar das ações que o Ministério da Saúde adotou no período dele que não estão sendo objeto de ações”, afirmou Costa, que é titular da comissão.

Ele também afirma que há uma expectativa grande em relação a Ernesto Araújo.

“É um depoimento importante, boa parte dos problemas que estamos vivendo hoje tem a ver com o conteúdo da política externa que um bom tempo foi pilotada por ele. As dificuldades com a OMS, com a China, a subserviência a Donald Trump [ex-presidente dos Estados Unidos]. Tudo isso tem que ser objeto de investigação”, diz.

Já Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirma que a ideia é fazer perguntas ao ex-ministro em relação às negociações internacionais para compra de vacinas, diferentemente de Pazuello, que deverá ser questionado sobre o combate à Covid-19 de maneira mais ampla.

Segundo ele, a ideia é tentar “apontar fatos relevantes sobre ações e omissões referentes ao combate à pandemia”.

Inicialmente, Pazuello deveria comparecer à comissão em 5 de maio. Porém, alegou que teve contato com infectados com o novo coronavírus e por isso não iria à sessão.

Diante disso, a presidência da CPI determinou o adiamento do depoimento do ex-ministro.

O general havia sido preparado para o depoimento por aliados de Bolsonaro, mas, de acordo com interlocutores, apresentou nervosismo nas sessões de media training, o que levou o Planalto a querer evitar o depoimento.

Ele começou a comandar o Ministério da Saúde interinamente em 16 de maio de 2020, após a saída de Nelson Teich. Quatro meses depois, foi efetivado no cargo, em 16 de setembro. Em março deste ano, foi demitido e substituído por Marcelo Queiroga.

Foi durante a gestão do general que o governo rejeitou 70 milhões de doses da vacina da Pfizer, conforme relatou o gerente-geral da empresa na América Latina, Carlos Murillo, em declarações à CPI na última semana.

Além disso, pelo menos 11 indícios reforçam que a cúpula do Ministério da Saúde tinha conhecimento prévio sobre a grave escassez de oxigênio nos hospitais da capital amazonense e foi omissa diante do problema.

Os indicativos estão em um relatório assinado pelo próprio ministro, em um documento da secretaria-executiva da pasta.

Em relação aos pontos que lhe dizem respeito diretamente, porém, Pazuello poderá se manter calado. O advogado Zozer Hardman, que está auxiliando o general em sua preparação para a CPI, porém, disse ao Painel que o ex-ministro tem intenção de responder a todas as questões dos senadores.

Ernesto, por sua vez, não acionou o STF e não terá, por ora, a opção de ficar calado.

Documentos e e-mails evidenciam que Araújo mobilizou o aparato diplomático brasileiro para agir junto a outros países e evitar o desabastecimento de cloroquina no Brasil, mesmo após a OMS ter interrompido testes clínicos com a droga e depois de associações médicas terem alertado para a ineficácia e o risco de efeitos colaterais.

Ele é apontado ainda como um dos responsáveis pelo fracasso na negociação entre os governos brasileiro e indiano para a compra de um lote de vacinas contra a Covid. Após pressão da cúpula do Congresso, que o acusava de omissão no combate à pandemia, Ernesto pediu demissão em março.

Folha de S. Paulo

 

 

 

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