Dimas Covas: Bolsonaro dificultou negociação das vacinas

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Foto: Reprodução/CNN Brasil

O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, disse hoje à CPI da Covid que a entidade fez uma oferta de 100 milhões de doses da CoronaVac ao governo Jair Bolsonaro (sem partido) em outubro de 2020. Segundo ele, até então, não havia “resposta positiva” do Ministério da Saúde em relação às negociações para aquisição do imunizante desenvolvido em parceria com o laboratório chinês Sinovac.

Nesse mesmo período, Bolsonaro contestava publicamente a eficácia da CoronaVac e, em um contexto de disputa política com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que não compraria o imunizante. Durante a audiência de hoje na CPI, o relator, Renan Calheiros (MDB-AL), exibiu um vídeo de uma live do presidente na qual ele dá um recado ao tucano: ‘Arruma outro para pagar a sua vacina’.

De acordo com o depoimento de Covas, enquanto o chefe do Executivo federal manifestava publicamente sua resistência à CoronaVac, o Ministério da Saúde acabou por protelar as negociações com o Instituto Butantan (que pertence à estrutura do governo de SP) e recusou uma sugestão de apoio financeiro —os recursos seriam utilizados para reformar uma fábrica destinada a produção própria do imunizante.

“Em 7 de outubro, eu enviei novamente um ofício ao Ministério, historiando e ofertando 100 milhões de doses, sendo que, desses 100 milhões, 45 seriam produzidas no Butantan até dezembro de 2020, 15 milhões de doses no final de fevereiro e 40 milhões adicionais até maio deste ano”, afirmou Covas, que comparece à CPI na manhã de hoje na condição de testemunha.

A oferta de 100 milhões foi a segunda enviada ao governo federal pelo Instituto Butantan. Em julho de 2020, a entidade já havia se colocado à disposição para produzir 60 milhões de doses, com previsão de entrega no último trimestre do ano passado. Diante da ausência de um posicionamento por parte do ministério, Covas relatou que o instituto “reforçou o ofício” em 18 de agosto, com um pedido adicional: verba para financiamento dos estudos clínicos.

“Um estudo clínico dessa dimensão custa muito caro. Nós tínhamos uma previsão de gastar em torno de R$ 100 milhões nesse estudo clínico. Então, nós solicitamos um apoio do ministério no sentido de que permitisse a gente suportar esses gastos e solicitamos também um apoio para reformar uma fábrica, porque no nosso acordo nós iríamos, num primeiro momento, receber vacinas prontas; num segundo momento, matéria-prima e, num terceiro momento, produzir integralmente.”

“(…) Todas essas iniciativas não tiveram resposta positiva. Quer dizer, eles responderam, sim, que poderiam avaliar, que existia a necessidade de avaliar a situação epidemiológica do Brasil.”

O dirigente do Butantan afirmou que, à época, iniciou as tratativas em conversas com o então ministro Eduardo Pazuello. No entanto, “as conversações não prosseguiram porque houve uma manifestação do presidente da República dizendo que a vacina não seria, de fato, incorporada”.

Covas relatou que as conversas começaram a evoluir a partir de outubro, com uma “sinalização” por parte do Executivo federal de “existir uma medida provisória para atender esses pleitos”.

“Tudo, aparentemente, estava indo muito bem, tanto é que, no dia 20 de outubro, eu fui convidado pelo então ministro da Saúde, general Pazuello, para uma cerimônia no Ministério da Saúde onde a vacina seria anunciada como sendo uma vacina do Brasil”, rememorou.

“Até, na sua fala, [Pazuello] disse: ‘Esta será a vacina do Brasil: a vacina do Butantan, a vacina do Brasil’. E [o ex-ministro] anunciou, naquele momento, publicamente, com a presença de governadores, de parlamentares, que iria ser feita uma incorporação de 46 milhões de doses.”

O episódio narrado pelo dirigente do Butantan diz respeito ao recuo do Ministério da Saúde em relação ao processo de aquisição da CoronaVac. Na ocasião, o ex-ministro Eduardo Pazuello foi desautorizado publicamente por Bolsonaro, que ordenou que a pasta cancelasse a compra depois que as partes já haviam costurado o acordo.

“A partir desse ponto, é notório que houve uma inflexão, e eu digo isso porque, no final da reunião, no dia 20, com a presença de vários governadores, vários parlamentares, nós saímos de lá muito satisfeitos com a evolução dessas tratativas e achávamos que, de fato, iríamos ter resolvido parte desse problema.”

O estado de SP é governado pelo tucano João Doria, rival do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e provável adversário nas eleições do ano que vem. Desde o início da pandemia no Brasil, entre fevereiro e março do ano passado, Bolsonaro e Doria travam duelos públicos com declarações e ataques de parte a parte.

O Butantan é o responsável pela produção do imunizante desenvolvido pela farmacêutica chinesa Sinovac no Brasil. Os testes da vacina no país começaram em julho de 2020.

O imunizante foi aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em janeiro de 2021 e hoje responde por mais de 70% de todas as doses que foram aplicadas até o momento no Brasil.

Uol