Planalto fica aliviado com blindagem de Bolsonaro por Pazuello
Foto: Sergio Lima / AFP
Após dias de tensão devido a aproximação do depoimento do ex-ministro Eduardo Pazuello (Saúde), o Palácio do Planalto avaliou que o general teve um desempenho satisfatório em suas falas nesta quarta-feira (19) na CPI da Covid, ainda mais considerando que ele é o principal alvo da comissão.
O principal motivo de alívio de aliados do presidente Jair Bolsonaro foi o fato de Pazuello ter blindado o mandatário em diferentes momentos do interrogatório, que deverá continuar nesta quinta-feira (20).
Nesta quarta-feira, o general evitou atribuir ao presidente a responsabilidade pelas decisões no enfrentamento da pandemia do coronavírus, inclusive negando tentativa de interferência do chefe do Executivo para ampliar o uso da hidroxicloroquina —questão apontada à CPI pelos seus dois antecessores no cargo.
Aliados do presidente avaliaram que Pazuello não teve momentos de descontrole e destacaram que ele respondeu a todas as perguntas feitas pelo relator, Renan Calheiros (MDB-AL). Isso apesar de ele contar com um habeas corpus do STF (Supremo Tribunal Federal) que lhe permitia o direito ao silêncio em questionamentos que poderiam incriminá-lo.
O alívio do Planalto ficou bem refletido na avaliação do comando da CPI da Covid, que considerou o depoimento de Pazuello “dissimulado”. Senadores à frente da comissão opinam que a sessão pouco colaborou com a investigação a respeito das ações e omissões do governo no enfrentamento da pandemia.
“Acho que ficou muito a desejar. Acho que os fatos estão tendo várias versões; e versão para a gente não é bom. Nós queremos fatos concretos”, afirmou o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM).
Diante do quadro, Aziz diz que a realização de acareações é uma alternativa para dirimir as muitas dúvidas e narrativas contraditórias. Mas ele pontuou que várias audiências do tipo teriam que ser realizadas, uma vez que há diferenças nos relatos de Pazuello, de Carlos Murillo (gerente-geral da Pfizer) e do ex-chanceler Ernesto Araújo, entre outros.
Renan Calheiros afirmou que vai reunir todas as inconsistências e mentiras da primeira parte do depoimento de Pazuello para confrontá-lo na continuação da sessão nesta quinta-feira.
“A grande dificuldade é que ele elaborou uma estratégia para não responder exatamente, dissimular, delongar essas respostas, se omitir, mentir. Então foi uma opção que fez o ex-ministro e dessa forma está colaborando muito pouco com a investigação”, afirmou Renan.
O senador diz que Pazuello é a principal testemunha a ser ouvida pela CPI, por ter sido o ministro mais longevo durante a pandemia e por ter fechado os primeiros contratos de compra de vacinas. Também foi na gestão Pazuello que houve o colapso do sistema de saúde de Manaus. Renan avalia que Pazuello tratou a pandemia com “desdém” .
Além de confrontar o ex-ministro, o relator e o vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmam que devem contratar uma agência de checagem de fatos para contrapor quase que instantaneamente os depoentes durante as sessões.
“Vou sugerir ao presidente da comissão e ao vice-presidente a contratação de uma agência checadora da verdade para que a comissão parlamentar de inquérito, pela primeira vez, possa acompanhar online e checar essas mentiras que reiteradamente estão sendo ditas”, afirmou Renan. “Na verdade, seria melhor um pool de agências para que haja diversidade”, completou.
O assunto vai ser debatido na sessão desta quinta. No entanto Randolfe considera que não vai haver empecilho para implementar a iniciativa. Afirma que a decisão pode ser tomada administrativamente pela presidência da comissão.
“Acho que nem precisa ser feita contratação. Acredito que muitas agências concordariam fazer o trabalho em colaboração com a CPI”, disse Randolfe.
O senador amapaense também considera que o depoimento de Pazuello decepcionou, pois o ex-ministro não esclareceu as principais dúvidas.
“Eu acho que não [contribuiu], tem muita coisa a ser esclarecida. Não está clara a questão da Coronavac, as negociações com o Instituto Butantan. Houve uma clara contradição entre o que ele respondeu ao relator e o que falou em seguida. Existe uma contradição clara”, afirmou o senador.
Randolfe lembrou falas do próprio Bolsonaro que contradizem a versão dada por Pazuello na CPI. “Esse é um fato que ocorreu [fala do Bolsonaro de que não compraria a vacina Coronavac] e me parece que existe um contorcionismo enorme a essa altura para tentar distorcer esse fato”, completou.
Por outro lado, o vice-líder do governo, Marcos Rogério (DEM-RO), diz acreditar que o depoimento de Pazuello “sepulta” narrativas que estariam sendo construídas pelo grupo majoritário da CPI, formado por senadores de oposição e independentes.
“Desmontou a primeira farsa da oposição, de que o ministro viria à comissão e ficaria em silêncio”, afirmou a jornalistas.
Rogério também afirmou que é natural o fato de o presidente comandar as ações de enfrentamento da pandemia, uma vez que é o chefe do Executivo. “Quando questionado se houve interferência do presidente Jair Bolsonaro, nenhuma [pessoa] aponta que houve gestão indevida”, diz o aliado do Planalto.
Nesta quarta, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), decidiu suspender a sessão com o depoimento de Pazuello, que, durante intervalo, sofreu uma perda de consciência momentânea —síndrome vasovagal— e precisou ser atendido pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), que é médico.
Ao deixar a sessão, no entanto, Pazuello afirmou que não passou mal. Caminhando, o ex-ministro disse que estava bem e que a sessão foi adiada por causa do início da ordem do dia no plenário do Senado.
Aziz postou em suas redes sociais que suspendeu a sessão por causa da sessão plenária do Senado e que a CPI ainda tinha 23 inscritos.
Passada a etapa das declarações à CPI do atual e dos ex-ministros da Saúde, conselheiros de Bolsonaro passaram a discutir internamente a estratégia política das próximas semanas.
Eles planejam centrar fogo no relator, Renan Calheiros, e tentar contrapor Bolsonaro a um personagem ligado a escândalos de corrupção no passado.
A expectativa de aliados de Bolsonaro é caracterizar a CPI como uma ofensiva da velha política contra um presidente antissistema, ressuscitando assim um dos motes utilizados por Bolsonaro na campanha de 2018. O cálculo é que a estratégia pode —na visão de aliados— contrabalancear o desgaste da aliança de Bolsonaro com partidos do centrão.