
Blogueiro bolsonarista podia entrar e sair do Planalto quando quisesse
Foto: Planalto/divulgação
Investigado pela Polícia Federal (PF) por organizar atos antidemocráticos, o blogueiro Allan dos Santos ganhou trânsito livre dentro do Palácio do Planalto e em ministérios após se tornar um dos principais líderes de uma tropa digital bolsonarista que promove ataques e espalha notícias falsas nas redes sociais.
Ao longo da investigação, a PF encontrou provas e conversas de WhatsApp que revelam como o blogueiro dava as cartas no governo Bolsonaro, tentando influenciar em nomeações de cargos públicos, incentivando uma intervenção militar, que é inconstitucional, e discutindo a liberação de verbas para “mídia aliada” com Fábio Wajngarten, então chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom).
A influência de Allan dos Santos no governo Bolsonaro ia muito além das suas publicações e mensagens de celular. De acordo com provas colhidas pela PF, o blogueiro tinha contato direto com integrantes do Planto e promovia em sua residência em Brasília encontros com parlamentares e apoiadores do presidente para discutir temas políticos. Entre os convidados, estavam o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente.
Antes de conquistar passe livre no poder, Allan dos Santos foi seminarista e se aproximou das ideias conservadoras quando morou nos Estados Unidos. Entre 2013 e 2014, trabalhou para o site norte-americano Church Militant, página católica acusada de distribuir notícias falsas. Naquele período, ele entrou em contato com Olavo de Carvalho, filósofo que é considerado o guru da ala ideológica do governo e de dois filhos do presidente, Carlos e Eduardo Bolsonaro.
De volta ao Brasil, Allan dos Santos participou dos protestos pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff e, após o início do governo Bolsonaro, passou a ter contatos frequentes com integrantes do Palácio do Planalto. De olho nas portas que essas relações poderiam abrir em Brasília, o blogueiro se mudou para a capital federal e passou a residir em uma casa alugada no Lago Sul, área nobre da capital, onde ganhou uma estrutura maior e mais profissional para gravar vídeos com ataques àqueles que o presidente considerava como adversários.
O blogueiro chegou a ter liberdade para circular até mesmo em áreas não permitidas à imprensa. Em diversos desses diálogos, Allan dizia estar no Palácio do Planalto com integrantes do governo. Também intermediava contatos no governo com outros bolsonaristas. Em uma conversa, um amigo lhe escreveu para pedir um “contato na Secom”. Em resposta, Allan dos Santos encaminhou o telefone de um funcionário que trabalhava com Wajngarten.
À medida que expandia a sua influência, os negócios envolvendo o seu site cresciam na mesma proporção. As finanças do Terça Livre chamaram a atenção da Polícia Federal. Os investigadores tentaram descobrir o total dos pagamentos recebidos pelo blogueiro por meio dos acessos às suas páginas, mas tiveram dificuldades porque Allan dos Santos escolheu receber os pagamentos por meio de uma empresa constituída no Canadá. A PF enviou um pedido de informações ao governo estrangeiro, mas não teve resposta até a conclusão do relatório da investigação.
Reportagens publicadas pelo GLOBO com base em planilhas obtidas pela Lei do Acesso à Informação revelaram que o site do blogueiro recebeu a veiculação de anúncios de diversas estatais como 3.490 anúncios da Petrobras e 6.757 do BNDES. Os valores pagos pelo espaço publicitário, porém, não foram divulgados.
Na mira da PF, Allan dos Santos se mudou para os Estados Unidos, onde continua desferindo ataques e espalhando notícias falsas nas redes sociais. Procurados, os advogados de Allan dos Santos não atenderam às chamadas e mensagens de texto da reportagem. O blogueiro também não retornou às tentativas de contato.