
Bolsonaro e seguidores queriam Secom paralela
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Novos documentos do inquérito da Polícia Federal que investiga os responsáveis por atos antidemocráticos realizados no ano passado apontam que membros de um grupo bolsonarista discutiam com o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten a criação de um departamento de “comunicação estratégica e contrainformação” para assessorar o presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto.
Nesta quarta-feira (10), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, retirou o sigilo de mais uma parcela de documentos do inquérito. A investigação também aponta que verbas do governo federal podem ter abastecido sites bolsonaristas responsáveis por desinformação, com discurso de ódio e contra estabilidade democrática (leia mais abaixo).
Em um dos trechos dos documentos, policiais destacam que em 14 de abril de 2019 um homem identificado somente como Jorge escreveu para o então secretário de Comunicação:
“Fabio, aquela ideia de comunicação estratégica e contrainformação. Na minha opinião, você deve criar um departamento para isso. Você já até concordou com a ideia. Vamos implementá-la?”
O ex-secretário responde: “Assim que minimamente estruturada a Secom [Secretaria de Comunicação], vamos implementar”.
A PF também encontrou uma troca de mensagens entre o ex-deputado Roberto Jefferson, presidente nacional do PTB, e o empresário bolsonarista Otávio Fakhoury.
Nas mensagens, eles discutem uma proposta para dissolver o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O empresário sugere “uma saída plebiscitária”. De acordo com os documentos, a ideia foi discutida por advogados e empresários aliados do presidente Jair Bolsonaro.
Uma das alternativas debatidas era a edição de uma medida provisória para garantir ao Executivo exclusividade para submeter temas a um referendo popular.
Fakhoury reconhece dificuldades para a cassação dos ministros e fala na necessidade de apoio popular e das Forças Armadas.
Propor a dissolução do STF, mesmo que por plebiscito, é inconstitucional.
A investigação também indica que verbas do governo federal podem ter abastecido sites bolsonaristas responsáveis por desinformação, propagação de discurso de ódio e mensagens contra a estabilidade democrática.
A Polícia Federal afirma que é preciso aprofundar as investigações sobre o direcionamento de recursos da Secretaria de Comunicação Social do governo federal para financiar essas páginas.
O avanço das investigações, segundo a PF, permitiria avaliar se há conexão de autoridades com a atuação desses sites para atuar contra a democracia.
Os investigadores apuravam se o governo criou filtros ou bloqueios que evitassem que a propaganda do governo fosse veiculada e monetizasse canais que difundem ideias contrárias ao estado democrático de direito, permitindo com tal prática que ocorresse o repasse de recursos públicos.
A Polícia Federal queria saber se o repasse se deu por culpa ou por dolo, com a ação ou omissão deliberada de permitir a divulgação da publicidade do governo e a consequente monetização ao conteúdo propagado.
A PF chegou a apontar a suspeita de vínculo entre o blogueiro Allan dos Santos, um dos alvos do inquérito, e o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Weingarten, com os fatos investigados sobre direcionamento de recursos públicos e patrocínio das páginas bolsonaristas para a divulgação de ideias antidemocráticas.
Fabio Wajngarten afirmou que não houve verba direcionada para nenhum site ou blog. A TV Globo não conseguiu contato com Allan dos Santos.
A investigação foi aberta em abril do ano passado depois de ataques ao Supremo, ao Congresso e a favor da reedição do AI-5, o ato mais duro da ditadura militar. Em um dos protestos, o presidente Bolsonaro chegou a discursar em frente ao quartel-general do Exército, em Brasília. Mas ele não foi investigado.
Cinco meses depois de ter recebido o material, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu o arquivamento do inquérito para os investigados com foro privilegiado, sem que tivessem sido realizadas diligências pela procuradoria para aprofundar as investigações.
A PGR afirmou à TV Globo que, embora o inquérito tenha sido enviado em janeiro, só recebeu em fevereiro porque em janeiro tanto a PGR como o STF estão em recesso.
Investigadores ouvidos pela TV Globo classificaram o pedido de arquivamento como prematuro porque ainda existem fatos a serem apurados, que podem atingir autoridades com foro.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito no Supremo, já determinou que a PGR preste esclarecimentos.
Ele não estipulou prazo, mas disse à TV Globo que espera a resposta no máximo até o início da semana que vem.