Clubes de motociclismo rejeitam apoio a Bolsonaro
Foto: Agência O Globo/Domingos Peixoto
As “motociatas” de apoio ao presidente Jair Bolsonaro têm incomodado um grupo de motociclistas que não se identifica com as ideias bolsonaristas e vê na aproximação de parte do movimento uma contradição com seus próprios ideais.
— A essência do motociclismo não é essa. Ele surge no pós Segunda Guerra, como um movimento transgressor, que bate de frente com os padrões da sociedade, de não se enquadrar naquele status quo — afirma Gleibson Bom Rui, de 33 anos, morador de Macaé (RJ).
Ele é parte de um dos moto grupos do país que se identificam como “progressistas”, o Metalreds. Bom Rui e outros motociclistas admitem, no entanto, que a maioria do movimento, hoje, é próxima do presidente.
Após chegar de vez ao Brasil, por volta da década de 1960, os motoclubes foram formados principalmente por integrantes de classe média e classe alta, antes de se popularizar. Existia, até há pouco tempo, um certo “preconceito de cilindradadas” que afastava integrantes sem tanto poder aquisitivo para adquirir as motos mais potentes.
— A maioria dos motociclistas, principalmente os tradicionais, são ex-militares, militares aposentados, pessoas do Judiciário. Dentro do motociclismo tradicionalmente existe também a questão da hierarquia militar. Os clubes mais novos tentam quebrar isso, a questão de diretor de disciplina — afirma Itamar Carvalho, o Tom, fundador do Jotun de Ferro, motogrupo que se classifica como “progressista”, de Teresópolis (RJ).
Enquanto apoiadores de Bolsonaro divulgaram e celebraram o sucesso das “motociatas”, oposicionistas lembraram que o ditador fascista italiano Benito Mussolini também fazia passeios de moto para celebrar seu poder na Itália dos anos 1930.
Integrante de um motoclube que também se posiciona como “progressista”, o Odiadu’s, José Valter Alves, de 53 anos, acompanhou as “motociatas” de longe, em Perdões (MG). Ele considera natural a divisão política dentro dos motoclubes, mas se incomoda quando grupos tradicionais que se classificam como apartidários são vistos em atos de apoio ao presidente.
—O motociclismo, embora várias pessoas tentem desvirtuar ou mudar o foco, não é partidário. Todo movimento que fazemos, seja educacional, social, tudo é um movimento político, claro. Mas ele não é partidário. O motociclismo prega a paz, prega a união, prega a irmandade. Nós ficamos desconfortáveis de sermos confundidos com um movimento de apoio ao presidente, ainda mais num contexto sanitário crítico — afirmou.
Para Tom, do Jotun de Ferro, não houve apenas o temor de ver sua paixão, o motociclismo, ser associada a uma posição política, mas também a decepção com alguns dos ídolos que cultivou desde a infância, quando se apaixonou por motos.
— Era a galera que me inspirava, eram meus heróis. Eu fui daquelas crianças que quando via uma moto custom (personalizada), falava ‘Eu quero chegar lá’. Eu via os motoclubes e pensava que tinha que estar nisso. Mas não tem como não polarizar com o que a gente está passando, quando você vê o negacionismo, o anti-vax (movimento antivacina), o conspiracionismo. Antigamente era lindo ir em evento de motoclube, confraternizar com a galera. Hoje, se eu puder, só colo com os meus.
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