Governistas mudam versão e dizem que Bolsonaro mandou apurar Covaxin

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Foto: Pedro França / Pedro França/Agência Senado

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), contestou nesta terça-feira na CPI da Covid a apresentação de uma notícia crime no Supremo Tribunal Federal em que três senadores apontam a ocorrência do crime de prevaricação pelo presidente Jair Bolsonaro. Em 20 de março, Bolsonaro recebeu denúncias de irregularidades na compra da vacina Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biotech, e, segundo a oposição, não teria tomado as providências necessárias para investigar. O líder do governo sustentou o contrário. Disse que o presidente conversou com o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello em 22 de março mandando apurar o caso, o que teria sido feito pelo então secretário-executivo da pasta, Elcio Franco.

A Secretaria Executiva comandada por Elcio era justamente o órgão responsável pelo processo de negociação das vacinas. Assim, a investigação ficou a cargo de quem cuidava da contratação sob suspeita. Mas, segundo Fernando Bezerra, Elcio era a pessoa mais adequada para fazer essa apuração.

— Compete destacar que o secretário-executivo foi responsável pela negociação, contratação e aquisição até 20 de março de 21 de todas as vacinas pelo Ministério da Saúde. Por isso, o agente público com maior expertise para apreciar eventual não conformidade contratual quanto às vacinas era o secretário-executivo. Após a devida conferência, foi verificado que não existiram irregularidades contratuais, conforme já previamente manifestado inclusive pela consultoria jurídica do Ministério da Saúde. Ressalte-se que é prerrogativa legal da administração pública realizar a averiguação prévia de seus atos, sem encaminhar para as instâncias investigativas — disse o líder do governo no Senado.

Na semana passada, Elcio fez um pronunciamento para rebater suspeitas sobre a compra da Covaxin, mas em nenhum momento mencionou ter recebido em março orientação para apurar possíveis irregularidades.

O servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, que prestou depoimento na CPI da Covid na semana passada, relatou que sofreu pressão pela liberação da importação da Covaxin. Diante disso, ele entrou em contato com seu irmão, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), que o levou a um encontro com Bolsonaro em 20 de março. Segundo os irmãos, Bolsonaro citou o nome do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), que foi ministro da Saúde entre 2016 e 2018, durante o governo do ex-presidente Michel Temer. Na época, a pasta pagou R$ 19,9 milhões antecipadamente à empresa Global, empresa sócia da Precisa, representante da Covaxin, mas não recebeu os remédios comprados.

— Diante do relatado pelo deputado federal Luis Miranda, o presidente da República entrou em contato com o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello em 22 de março de 21, segunda-feira, a fim de realizar uma apuração preliminar acerca dos fatos relatados. Ato contínuo, após a ordem do presidente da República, o ministro determinou que o então secretário-executivo Elcio Franco realizasse uma verificação prévia dos indícios de irregularidades, ilicitudes apontados — disse Fernando Bezerra Coelho na CPI.

A notícia crime no STF foi apresentada por três senadores: o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Fabiano Contarato (Rede-ES) e Jorge Kajuru (Podemos-GO). A relatora, ministra Rosa Weber, determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifeste sobre o caso. É praxe na Corte abrir investigações apenas com a anuência da PGR, embora haja algumas exceções.

Na semana passada, em pronunciamento para rebater suspeitas sobre a compra da Covaxin, Elcio em nenhum momento mencionou ter recebido orientação para apurá-las. Ele o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, negaram qualquer irregularidade e questionaram um dos documentos apresentados por Luis Ricardo Miranda, alegando haver indícios de adulteração. Nessa mesma ocasião, o ministro informou que o governo ia pedir para a Polícia Federal (PF) e para a Controladoria-Geral da União (CGU) investigarem o servidor do Ministério da Saúde que fez as denúncias.

Na CPI, Randolfe explicou que era uma iniciativa dos três senadores, e não da comissão. Por esse motivo, o presidente da CPI, Omar Aziz, destacou que não era um assunto para ser debatido. O relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-PE), rebateu a fala do líder do governo e foi além da acusação levada ao STF, segundo a qual ele teria prevaricado por não mandar investigar.

— É mais grave. Ele (Bolsonaro) não só teve conhecimento, como participou em todos os momentos — afirmou Renan.

— Ainda estamos investigando — interrompeu Fernando.

— No dia 8 de janeiro, o presidente da República, que é um contumaz veiculador de “fake news”, agora ele está com amnésia. Seria o caso desse contumaz e compulsivo veiculador de “fake news” recuperar um pouco sua memória. Eu até disse ontem: recomendaria a Otto Alencar (PSD-BA, senador integrante da CPI), que é nosso médico, passar um memoriol para ele. Porque no dia 8 de janeiro ele mandou uma carta para o primeiro-ministro da Índia — afirmou Renan.

— Para acelerar a compra as vacinas no âmbito da Covax Facility — interrompeu novamente o líder do governo, fazendo referência à iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) para distribuição de vacinas contra a Covid-19.

Renan continuou e lembrou que Ricardo Barros apresentou uma emenda na medida provisória editada pelo governo para facilitar a compra de vacinas. A emenda, que acabou aprovada, acrescentou a Central Drugs Standard Control Organization (CDSCO) — o equivalente à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) na Índia — no rol de órgãos habilitados a autorizar vacinas que podem ser importadas pelo Brasil. A Covaxin não tem registro na Anvisa, mas, como tem na Índia, a emenda poderia autorizar sua importação.

— Em 8 janeiro (Bolsonaro) mandou uma carta pedindo para comprar 20 milhões de vacinas, no mesmo momento em que tinha recusado 170 milhões de vacinas da Pfizer, do Butantan e da OMS. No dia 25 de fevereiro, o acordo foi fechado. No dia 10 de março, o presidente da República sancionou a medida provisória na qual o deputado Ricardo Barros incluiu a emenda autorizando a compra da Covaxin. O deputado Luis Miranda foi falar com ele dez dias depois, em 20 de março. Eu perguntei (a Luis Miranda, no depoimento na CPI); nesse dia o senhor tinha informação de que sabia? Respondeu: sabia detalhes pormenores do caso.

Os senadores governistas lembraram então que parlamentares críticos ao governo, entre eles o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), e o deputado Renildo Calheiros (PCdoB), irmão de Renan, também apresentaram emendas semelhantes à de Barros. O próprio Omar Aziz disse que ele fez isso, mas ponderou:

— A questão não é a emenda, a questão é outra.

O senador de oposição Humberto Costa (PT-PE) disse que deve ser mentira a versão dada pelo governo sobre as ações de Bolsonaro após receber as denúncias de irregularidade na compra da Covaxin. Também lembrou que Pazuello, embora tenha saído do governo em 23 de março, ficou vários dias antes disso como um “zumbi”, porque seu sucessor no cargo, o atual ministro Marcelo Queiroga, já tinha sido anunciado.

— O deputado (Luis Miranda) disse que o presidente da República teria dito a ele que ia acionar o diretor-geral da Polícia Federal. E o presidente não desmentiu essa colocação. E agora vem a com a desculpa completamente sem fundamento para criar uma versão da sua omissão — disse Humberto, acrescentando:

— Esse governo não gosta de registrar o que faz. Tudo é na base da comunicação oral. Isso tinha que ter um registo, o presidente mandando ao ministro um documento. É mais provável que seja mentira. O ministro Pazuello passou vários dias quase como um zumbi. Não era ministro, mas o novo não tinha assumido. E no dia 23 saiu definitivamente do ministério. Essa conversa de que o presidente da República mandou ele apurar é para tentar justificar a omissão do presidente em ter tomado uma iniciativa efetiva. Estão querendo limpar a trilha da omissão do governo federal.

O Globo 

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