Governo Bolsonaro coleciona crises com militares

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Miguel Schincariol

A pressão de Bolsonaro para que o Exército livrasse o general Eduardo Pazuello de punição por participar de ato político foi o mais recente capítulo de uma longa série de crises na área militar.

O mal-estar nas Forças Armadas teve início logo nos primeiros dias da gestão Bolsonaro, com atritos no campo da política externa. O auge da tensão se deu em março deste ano, quando os três comandantes das Forças Armadas deixaram seus cargos.

Inédito na história brasileira, esse episódio de certa forma reverberou na decisão de agora do comandante do Exército, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, de isentar Pazuello, ex-ministro da Saúde.

Confira algumas das principais crises no meio militar sob Bolsonaro.

 

PRIMEIROS ATRITOS
A condução da política externa iniciou o mal-estar nas Forças Aramadas. Na primeira semana de governo, em janeiro de 2019, Bolsonaro e o então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, defenderam a instalação de uma base americana no Brasil, algo que desagradava aos militares daqui.

Pouco depois, Araújo assinou um documento que tinha como uma de suas providências “suspender a cooperação militar com o regime de Nicolás Maduro”, sem ter consultado as Forças Armadas.

Os episódios levaram a ala militar a promover uma espécie de intervenção branca no Itamaraty, tutelando os movimentos de Araújo sobre temas considerados sensíveis

ALA IDEOLÓGICA
Ainda nos primeiros meses de mandato de Bolsonaro, militares entraram em choque com a chamada ala ideológica do governo, sobre a qual o escritor Olavo de Carvalho exerce grande influência.

Olavo fez críticas públicas aos militares integrantes do governo, como o vice-presidente Hamilton Mourão, e xingou o então ministro-chefe da Secretaria de Governo, o general Santos Cruz, ao rebater um comentário do militar sobre redes sociais.

Em resposta, Mourão disse que Olavo deveria “se limitar à função de astrólogo”, e o ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas disse que o escritor era um “Trótski de direita”.

​QG DO EXÉRCITO
De cima de uma caminhonete, Bolsonaro discursou em ato pró-intervenção militar diante do quartel-general do Exército, em Brasília, em abril de 2020. O presidente gritou palavras de ordem como “agora é o povo no poder” e “não queremos negociar nada”.

No dia seguinte, o então ministro da Defesa Fernando Azevedo publicou comunicado oficial no qual afirma que as Forças Armadas trabalham com o propósito de “manter a paz e a estabilidade do país”.

NOTA DO GENERAL HELENO
Em maio de 2020, o ministro-chefe do GSI, o general Augusto Heleno, disse que uma eventual apreensão do celular de Bolsonaro, em virtude de investigação sobre supostas interferências na PF, poderá ter “consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional”.

A manifestação sofreu críticas de líderes políticos e de representantes da sociedade civil, como a OAB.

O general Fernando Azevedo manifestou apoio a Heleno, mas negou qualquer possibilidade de golpe.

VOO DE HELICÓPTERO
Pouco depois, contudo, o general Azevedo acompanhou Bolsonaro em um sobrevoo para prestigiar uma manifestação em Brasília contra o Congresso e o STF, na qual se viam placas com pedidos de “intervenção militar”. A nave era um aparelho camuflado da Força Aérea, e não o usual helicóptero pintado de branco da Presidência. A presença de Azevedo incomodou a nomes da cúpula das Forças Aramadas.

QUEDA DOS COMANDANTES
Em março deste ano, em busca de maior apoio militar a seu governo, Bolsonaro demitiu Fernando Azevedo. O presidente estava insatisfeito com o afastamento crescente do serviço ativo das Forças Armadas em relação a seu governo.

Em nota de despedida, o general afirmou que, em seu período no governo, havia preservado “as Forças Armadas como instituições de Estado”.

Contrariados com a demissão, os três comandantes das Forças Armadas pediram renúncia conjunta, fato inédito na história brasileira que configurou a maior crise militar desde o fim da ditadura.

PERDÃO A PAZUELLO
Por pressão de Bolsonaro, o Exército livrou o general da ativa Eduardo Pazuello de qualquer punição por ter participado de um ato político ao lado do presidente. O processo contra o ex- ministro da Saúde foi arquivado sob o argumento de que o ato político no Rio, no último dia 23, não teve conotação partidária.

O decreto de 2002 que institui o regulamento disciplinar do Exército prevê como transgressão disciplinar a manifestação política por militar da ativa.

O Estatuto dos Militares, uma lei em vigor desde 1980, veda “quaisquer manifestações coletivas, tanto sobre atos de superiores quanto as de caráter reivindicatório ou político”.

Folha de S. Paulo