Planalto mantinha site que divulgava fake news sobre a pandemia

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Foto: Reprodução

Entre as contas inautênticas acessadas em órgãos públicos e em endereços ligados ao presidente Jair Bolsonaro, segundo a Polícia Federal, o perfil “Bolsonaronews”, mantido por Tércio Arnaud Tomaz, atualmente assessor do presidente e apontado como integrante do chamado “gabinete do ódio”, fez publicações com mensagens desinformativas sobre a Covid-19. A conta também era usada para disparar ataques a rivais e ex-aliados de Bolsonaro.

Como mostrou reportagem do “Estado de S. Paulo”, o perfil foi utilizado no Palácio do Planalto, entre o fim de 2018 e 2019, assim como o perfil pessoal no Facebook de Tércio Arnaud Thomaz, e na casa da família Bolsonaro na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, em 2018. A informação consta em um relatório sobre as investigações do inquérito dos atos antidemocráticos, que identificou 1.045 acessos de contas inautênticas bolsonaristas removidas em junho do ano passado pelo Facebook em números de IPS (identificação atribuída a cada computador ou celular conectado à internet) em órgãos públicos.

O conteúdo da conta “Bolsonaronews” consta no relatório produzido pela Atlantic Council, que embasou a análise da Polícia Federal. As postagens foram fornecidas pelo Facebook por meio de uma parceria. Antes de sair do ar, a conta anônima somava 492 mil seguidores e mais de 11 mil publicações no Instagram. O “Bolsonaronews” disparou desinformação sobre a Covid-19, por exemplo, ao difundir a hidroxicloroquina como tratamento eficaz contra a doença e minimizar a gravidade da pandemia, em tom semelhante ao adotado pelo presidente ao longo da crise sanitária.

Em uma das publicações, de junho de 2020, o perfil ressaltou que Bolsonaro já falava do uso de hidroxicloroquina contra a Covid-19 desde março. “Se tivessem ouvido ele, muitas mortes teriam sido evitadas”, ressaltou a postagem, embora pesquisas apontem que o remédio não tem eficácia contra o vírus. Outra postagem afirmava que Bolsonaro antecipou que “as pessoas vão descobrir que foram enganadas sobre a Covid-19”.

A conta também era usada para atacar opositores do presidente com memes. Entre os alvos, estão o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os ex-ministros Sergio Moro e Henrique Mandetta, o ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ex-governador do Rio Wilson Witzel. A tática de ataques a ex-aliados tem sido apontada como uma característica do chamado “gabinete do ódio”, uma das frentes de investigação sobre os atos anti-democráticos, que miraram instituições como o Supremo Tribunal Federal (STF). Muitas das publicações ocorreram em horário comercial, o que indica que Tércio utilizava as contas durante seu trabalho como assessor do presidente.

Em uma das publicações, de 2018, uma foto do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) aparece armado. A legenda diz “esperando o Boulos chegar para invadir a casa do papai”, em referência ao então candidato à Presidência Guilherme Boulos (PSOL-SP). Outra postagem, também de 2018, durante as eleições, faz comparações entre o plano de governo de Fernando Haddad (PT-SP) e do líder fascista Benito Mussolini. Moro também é ridicularizado em um meme compartilhado pelo perfil, que o compara ao humorista Sérgio Mallandro. A imagem foi postada em maio do ano passado, após o ex-juiz deixar o governo.

Os registros de números de IP fornecidos à PF pelas operadoras de telefonia e internet também mostram que a página foi acessada na Câmara de Vereadores do Rio, entre 2017 e 2018, período da campanha presidencial e no qual Tércio estava nomeado no gabinete de Carlos Bolsonaro, bem como na Câmara dos Deputados, ao longo de 2017. Tércio também criou e comandou a extinta página no Facebook “Bolsonaro Opressor”.

O levatamento da PF também lista acessos feitos em órgãos públicos a páginas comandadas por assessores do senador Flávio Bolsonaro e do deputado federal Eduardo Bolsonaro. Entre elas estão a “SnapNaro”, administrada por Fernando Nascimento Pessoa, assessor de Flávio, e acessada no Senado em 2019, e a página “Bolsofeios”, administrada por Carlos Eduardo Guimarães, assessor de Eduardo Bolsonaro, e acessada na Câmara dos Deputados em 2017.

O relatório parcial da Polícia Federal sobre o inquérito dos atos antidemocráticos propõe o aprofundamento em duas linhas de investigação, uma delas sobre o repasse de recursos do governo federal para grupos envolvidos com atos antidemocráticos, e outra a respeito da formação de uma milícia digital com perfis falsos para apoio ao governo. A Procuradoria-Geral da República (PGR), em manifestação enviada ao STF na sexta-feira passada, pediu o arquivamento do caso após apontar que a PF desviou o foco da investigação e não encontrou provas do envolvimento de parlamentares. Agora, o caso depende de uma decisão do ministro Alexandre de Moraes.

O Globo